domingo, 19 de novembro de 2023

Tropeçar em si próprio

 

Por razões pessoais e profissionais e de manifesto desinteresse pelo mundo da bola e seus arredores, o que talvez inclua grande parte do país, não foi possível apresentar a minha versão dos factos que rodearam o último dérbi. Em primeiro lugar já não me recordo da última vez que o Sporting ganhou um jogo na luz para o campeonato, nem sequer tenho lembrança próxima de qualquer vitória em clássicos recentes (Porto ou Benfica). São factos, discutíveis para alguns, mas factos.

Posto isto, que não interessa para nada, é preciso notar que o jogo foi sorrateiramente inclinado para o Benfica pela arbitragem (o que até nem ia dando em nada). Na primeira parte não me recordo de qualquer falta assinalada ao Benfica, já o Sporting não leu a sebenta do costume e um desorientado Inácio deixou-se ir à confiança. Basta atentar no dualidade de critérios demonstrada no amarelo ao Edwards, deixando os entretidos malabaristas Rafa e Di Maria, entre outros, mostrar todos os seus dotes artísticos com a conivência dos juízes.

Posto isto, que já se sabia que possivelmente iria acontecer, é preciso notar que o Sporting entrou no jogo em jeito de pisa ovos, demorando a perceber que este Benfica é só fumaça, acabando a primeira parte com um grande golo (e jogada) de um jogador que o ano passado, por exemplo, não faria falta nenhuma, segundo informações próximas. Na segunda parte concretizou-se a tentativa de inclinação do campo e, talvez por isso, o nosso adversário praticamente não conseguiu criar qualquer perigo, tal era o declive que certamente os estonteava.

A entrada de Paulinho, surpreendente para alguns, não apanhou de surpresa aqui o escriba, já embalado com um bom tinto e embaciado pelo fumo de alguns cigarros, porque o ano passado Paulinho já assumia lá na frente um papel de defesa avançado, competindo com o Coates para o óscar de melhor central de lança. Só é chato para o Bragança, que assim ficou a perceber que, para o treinador, talvez o lugar dele seja no meio, mas do banco de suplentes.  

A mensagem do treinador foi eficaz, ficando o adversário confuso com a sua fumaça, o declive acentuado do campo e a nova dinâmica leonina, cujas pedras se amontoavam num caos de aparente lucidez futebolística. Esse amontoado caos de aparente lucidez futebolística resultou num acumulado de jogadores do Sporting dentro da pequena área (outros marcando com os olhos) o que possibilitou a possibilidade (deixem passar) de um jogador do Benfica rematar à baliza com todas as condições possíveis e imaginárias para fazer um golo num treino entre familiares próximos. O que se passou a seguir foi mais uma faúlha para juntar às pilhas do pacemaker que, como todos sabemos, é meio caminho andado para qualquer sportinguista.

Dos dirigentes do Sporting, paladino incluído, nem uma palavra sobre a inclinação do campo, não fossem para o ano deixar de ter direito a camarote presidencial e, quem sabe, a um voucher com tudo incluído. Nem nos miaus deste ano se miou sobre o assunto, apenas um bramido para o império mumificado das antas, e uma palavrinha de relance para o trinador (esta palavra existe) dos milhafres, como se agora um presidente tivesse de se dirigir a um funcionário de outro clube. São factos, embora sem grande interesse, de facto.

 

 

segunda-feira, 14 de agosto de 2023

Blá-blá-blá minha machadinha

 

Ninguém sabe como a janela com terraço (enorme) e marquise do mercado vai fechar, já com o comboio em andamento. Felizmente o Benfica já é campeão antecipado e assim fica tudo muito mais fácil, sabemos com o que contar e podemos até vender metade da equipa por simples devaneio.

Estando o campeonato entregue aproveitei para estar com o rebento e comer em família umas sardinhas no pouso habitual da Figueira, mais precisamente em Buarcos. De qualquer forma parece que já não havia bilhetes (mas já lá vamos). Ninguém explicou em inglês ao Viktor Gyökeres que o campeonato era um pró-forma e vai daí o rapaz (grande jogador) levou a coisa a sério e marcou dois golos antes dos vinte minutos de jogo. O resto da rapaziada deve ter ficado em choque, incluindo o adversário, pouco habituado a um Sporting crente na possibilidade (remota) de marcar golos na baliza adversária. Andamos mais de um ano a dizer que não precisávamos de um avançado e agora, ainda por cima com o Benfica já campeão, aparece um rapaz a exemplificar o teorema de Pitágoras da bola. Não podia ser, pois não?

O que vale é que o Trincão continua inconsequente, insistindo na mesma finta do recreio da infância em Braga, e o Pote lá foi falhando o melhor que pôde, para a coisa não destoar muito, sabendo nós que o rapaz é muito ciumento (lembram-se do Sarabia?) e tão expressivo corporalmente que se nota a milhas. Não foi preciso muito mais, a malta acreditou que o jogo estava ganho, o Benfica campeão, e até o Amorim deu um jeito espalhafatando o jogo com as suas substituições, tudo para criar a ilusão de que estávamos perante adversários do mesmo escalão (sabem qual é o orçamento o Vizela?). O resto foi o blá-blá-blá do costume, desorientação orientada na defesa (aquele primeiro golo do Vizela é um déjà-vu de um déjà-vu), e orientação desorientada no ataque. Valeu o Paulinho a fazer de Coates, com um golo a central de lança. Tudo acabou bem, as sardinhas estavam boas, o tinto papava figos, nem deu para enervar muito com o título já entregue.

Uma palavra mais para o anúncio do estádio esgotado (com exceção da parte visitante), anúncio esse que deve ter afastado alguns adeptos/sócios verdadeiramente interessados em ver o jogo, para depois mais uma vez, constatarmos que grande parte dos gamebox não põe lá os pés. Estão de férias todo o ano. Um amigo que lá esteve também me relatou o silêncio ensurdecedor do estádio em certos momentos, nada a ver com o rugido que já por lá ecoo, blá-blá,blá…

domingo, 23 de julho de 2023

Com tranquilidade

 

Segundo a CMTV estamos perante um Super Benfica, possivelmente um Benfica galáctico, talvez mesmo intergaláctico. Interrogam-se os mais avisados comentadores sobre a pertinência de termos o desperdício de tempo gasto em mais um campeonato, quando tudo indica que este estará mais que entregue. O ano passado estava decidido em Dezembro (e depois teve que de ser disputado até Maio, um pormenor esquecido), este ano tudo leva a crer que estará no papo no final de Julho, quando muito Agosto, mas sempre antes de o campeonato começar.

Assim está perfeito, o Sporting poderá começar a preparar a temporada ainda com mais tempo do que este ano e o anterior. Poderá prepará-la com mais de um ano de antecedência, aproveitando esse longo defeso para acertar agulhas e alinhavar novas táticas, sem ter de se preocupar com uma janela de mercado que de tão longa mais parece uma marquise dos anos oitenta, já que terá várias janelas e alguns postigos de mercado ao longo desse ano e talvez o Jeremiah St. Juste tenha tempo de resolver a sua lesão, voltar a lesionar-se e ninguém dar conta.

O Sporting precisa de tempo. Precisou de mais de um ano, após a saída abrupta e nunca realmente explicada (entre tantas outras) do Slimani, para perceber a necessidade de um avançado, um ponta de lança, ou mesmo alguém que faça a vez do Coates nos últimos minutos dos jogos. Tudo leva o seu tempo, estudar os possíveis alvos, ficar em quarto lugar, vender os restantes jogadores do meio campo, para finalmente investir sem qualquer possibilidade de erro, assim se deseja.

A suposta aposta na formação e na contratação de jovens jogadores começa a dar frutos, como se poderá constar na lista de dispensas ou emprestados: Tanlongo, Fatawu, Marsá, Sotiris, entre outros, tudo malta com um largo potencial à sua frente, segundo os responsáveis leoninos. Já para não falar de Vinagre, mais um elemento do carrossel Mendes, que andará à roda até fazer sangue como o genial Tiago Llori.

Temos tempo, assim o afirma a onda vermelha mediática, este ano está entregue, a não ser que surja um ou outro contratempo, mas isso apenas se o campeonato desnecessariamente começar.

Parece que continuamos a ter áreas especiais para adeptos em Alvalade. Para mim Alvalade sempre foi especial no seu todo. Muito especial. À justiça o que é da justiça, de resto o que interessa é encher a casa (fora de casa cá nos arranjamos), mesmo que seja apenas para jogos a feijões, tendo em conta o campeonato estar decidido, segundo informações fidedignas da CMTV e do jornal A Bola, entre outros.   

domingo, 4 de junho de 2023

Quem não trabuca, não manduca

 

Não podemos deixar de nos sentir satisfeitos com a época que agora findou: um 4ºlugar no campeonato, atrás de um clube com metade do nosso orçamento; afastados precocemente da taça de Portugal por uma equipa com um potencial futebolístico incomum, chamada de Varzim Sport Club, restando-nos o tradicional quase no que toca à taça da liga, e um outro quase que chegávamos às meias-finais da taça UEFA, acoplado à tradicional sigla: injustiça. Foi um ano em cheio, sem dúvida, relativamente ao futebol profissional, reforçado com um grande desempenho da equipa B (as modalidades ainda estão em curso).

Nada disto teria seria possível sem um planeamento atempado, ajustado às necessidades do plantel, antecipando saídas e colmatando eventuais défices do ano anterior, permitindo assim um equilíbrio sóbrio entre a vertente futebolística e a financeira. Este ano que passou foi um exemplo a ser seguido como case study de uma boa gestão de um plantel profissional com aspirações legítimas.

Isso mesmo se refletiu na ocupação do estádio, sempre com grandes enchentes, sem clareiras manifestas, nem áreas terra de ninguém, possibilitando um ambiente de grande festa e de constante pressão no adversário. A união dos sportinguistas foi freneticamente defendida pelos órgão diretivos, com ações de (re)aproximação ente (supostas) facões antagónicas, promovendo e elevando o nome do clube como o grande bastião da diferença no futebol português.

Por tudo isso (e mais alguma coisa), a decisão dos administradores da SAD de se autoaumentarem (mesmo quando se venderam jogadores para equilibrar as contas), juízes em causa própria, agindo em nome do clube e sem darem cavaco aos sócios, só pode ser considerada justíssima e devidamente enquadrada no espirito de diferença que é a imagem do clube (e, pelos vistos, da SAD). Cada um tem aquilo que merece, ou como dizia o Maradona: a los que no creían, que la chupen.

 ....

Nota sem importância: diz-me um amigo meu que a grande diferença entre Mourinho e Conceição são os títulos europeus (o que não é pouco). De resto, a mesma escola de fanfarronice, mau perder, grande educação, défice de atenção, e uma tendência infantil para aquilo que ficou conhecido como mind games que não passam, afinal, de arruaças mentais. Subscrevo.

segunda-feira, 22 de maio de 2023

Alvalade vai dar à luz II

 

Mais uma vez Alvalade não chegou sequer aos 40 000 espectadores (em toda a liga não atingiu esse número), mesmo vendendo bilhetes aos adeptos adversários por portas travessas à 10 A, adeptos esses que comemoraram a cortesia com fumos e pirotecnia das suas cores, colorindo assim a festa. Ou terão sido malandros sportinguistas que se fazendo passar por benfiquistas compraram bilhetes a outros sportinguistas para festejar condignamente? Aposto que a direção do Sporting ainda não se lembrou dessa possibilidade. Fica aqui a deixa, com uma boa risada.

Confesso que percebo cada vez menos de futebol e seus arredores. Apenas sou um espectador assíduo desde puto de jogos da bola, em vários formatos, incluindo ao vivo. Agora o jogo é atravessado por especialistas de trazer a bola por casa, experts numa arte cientificamente comprovada, ou numa ciência comprovada artisticamente por artistas televisivos.

Entramos no jogo manuseando o campeão anunciado desde o ano passado. Aquilo parecia um passador com tons avermelhados de vergonha. Será o Santa Clara? - Interroguei-me. Marcamos dois e poderiam ser mais alguns, não é Pote? Na segunda parte entramos, por opção própria, em formato Covilhã (sem desprimor), até eu percebi a mensagem de recuo e abram alas ao campeão. Saiu o Edwards para comprovar que não queríamos alguém que levasse a bola por ali fora criando desequilíbrios, saiu o Trincão supostamente cansado, parece que apenas contra o Arsenal estes jogadores tinham pernas. Terá sido do jogo a meio da semana contra os Coldplay para a liga conferência das bandas musicais? Como não percebo nada de futebol, mas alguma coisa de música e festas, parece-me que quisemos muito participar na festa.  Até o Paulinho falhou mais um, mas toda a gente sabe que ele é muito melhor à baliza.

Uma confraria de equívocos poderia resumir a segunda parte do Sporting no jogo de ontem, mas não tenho tanta certeza assim. Estou apenas aborrecido por não perceber nada de futebol, todavia, uma pergunta me assalta o cérebro: será que o grande equívoco não terá sido a nossa primeira parte? Se calhar não estava nas previsões que corresse assim tão bem. 

quinta-feira, 18 de maio de 2023

Alvalade vai dar à luz

 

Parece que se andam por aí a vender bilhetes a benfiquistas para o jogo. Vendidos por gente da casa. Não é de admirar, parte dos detentores de gamebox não chega a por os pés em Alvalade. Fica a sugestão de alugar ao adversário parte daquela bancada sempre vazia atrás de uma das balizas. Temos de ser uns para os outros. Festa é festa. 

domingo, 14 de maio de 2023

Dantes o futuro era melhor


Estava para escrever que na primeira parte a equipa do Sporting não entrou em campo, mas na realidade entrou e espalhou a sua beleza cheia de tique(s)-taka sem balizas. Era como se estivéssemos num eterno meiinho, não fosse a equipa adversária ter metido na cabeça que existia uma baliza, pelo menos uma baliza junto à defesa do Sporting, e ter metido a bola dentro dessa mesma baliza (o Coates ficou muito desiludido com a postura belicosa da equipa adversária). Quando se joga dessa forma (e o Sporting jogou este ano muitas vezes assim) tem de se avisar a equipa opositora do tipo de jogo que se vai jogar. Existem vídeos disponíveis na Internet sobre como se joga futebol com balizas.

Por falar em outra coisa, para além do jogo, conseguimos ouvir os assobios à equipa da casa, curiosamente vindos de locais normalmente ocupados por “gente de bem”. A coisa não ganhou contornos sonoros dramáticos porque em Alvalade (mais uma vez) estiveram pouco mais de 27 000 espectadores (só por curiosidade na semana passada um Vitória-Vizela teve mais de 20 000 espectadores). Aposto que este ano um novo record de vendas de game-box será publicitado com mais um grande planeamento de época.

A irritação da primeira parte já me tinha levado ao terceiro copo de um tinto encorpado que tinha servido de lastro às pataniscas de bacalhau, um tipo sabe bem que o Sportinguismo é meio caminho andado para um pacemaker…

Na segunda parte, para além das alterações (obviamente necessárias) na equipa, os jogadores foram submetidos a um tratamento revolucionário que os convenceu da existência de, pelo menos, uma baliza, a mesma em que tinham sofrido o golo na primeira parte. Não foi, de todo, fácil este procedimento realizado em tão pouco tempo e com recursos limitados (ter-se-á que vender mais um jogador para melhorar este aspecto). Em sequência, os jogadores do Sporting ganharam uma nova consciência do jogo, começando a tentar jogar futebol, algo que normalmente dá resultados, mesmo quando a concretização das jogadas fica dependente do acaso, porque normalmente quando se remata à baliza as probabilidades de marcar crescem exponencialmente. Foi assim que aconteceu o primeiro (auto)golo.

O segundo golo corresponde à fase central de lança que já aqui tínhamos aludido, uma fase que no Sporting tem feito escola, embora sem grandes seguidores pelo mundo fora, tirando alguns finais de jogos embalados em desespero. Após este golo o árbitro ainda tentou o bailinho da Madeira, conseguiu a proeza de enviar o Adán para a bancada no dérbi, e mais não fez porque tanto um acobardado bandeirinha como o VAR lá tiveram que retificar o óbvio desvario. Até porque toda a gente sabia que naquele lado do campo não havia baliza.



domingo, 23 de abril de 2023

Central de lança

Nunca fui apreciador de vitórias morais, ainda menos de derrotas imorais. O futebol, para mal de alguns dos nossos pecados, tem balizas. No meu bairro, quando era puto, não raro, fazíamos olhos moucos às balizas, deixando de fora até as pedras que as desenhavam, ficando a bola para nosso eterno deleite.

No final do jogo em Turim não faltaram panegíricos (elogios exacerbados) ao Sporting Europeu de Amorim. Finalmente o Sporting batia-se de igual com grandes colossos do futebol (sequência do Arsenal). Vindos do espaço, pensaríamos que o Sporting teria ganho o jogo, não apenas (supostamente) uma equipa. Sou dos que reconhece o dedo de Amorim no Sporting europeu. Forçosamente teremos, igualmente, de reconhecer o dedo de Amorim no Sporting nacional, ou para consumo interno. O jogo com o Arouca foi mais uma posta suculenta a juntar a um ano verdadeiramente embaraçoso (o orçamento do Braguinha não chega a metade do Sporting), tão bem planeado que em Janeiro já estávamos em serviços mínimos.

O jogo desta semana com a Juventus veio dar continuidade ao Sporting europeu, versus, está muito difícil marcar golos, embora os Italianos o façam sem saber ler e muito menos escrever. Está muito difícil marcar golos, ou, que porra, não se consegue introduzir a bola na baliza do adversário, a não ser com penáltis ou um coelho saído do Pote, não é uma questão nova. Aliás, para provar a sua antiguidade clássica, lá terminamos o jogo com o velho Coates a arfar na grande área adversária. O homem começa a não ter idade para tamanha discrepância posicional. Se calhar não precisamos de um ponta de lança, mas de um novo (ou mais novo) central de Lança.

 

Nota: finalmente ultrapassamos os 45 000 espectadores num jogo em casa, embora a direção do clube tivesse anunciado com pompa lotação esgotada dias antes. A média para o campeonato é mais um embaraço desta época, pouco mais de 25 000, ou seja, pouco mais de 50% de taxa de ocupação, pese o anúncio (mais uma vez com pompa) no início da época de record na venda de game box. Talvez esteja na altura de pararmos com divisionismos e da direção “tentar” apagar os fogos injetando gasolina 98. É só uma ideia.

sábado, 4 de fevereiro de 2023

E agora algo completamente diferente

 

Manuel Mota no Rio-Ave x Sporting: o optimista não sabe o que o espera (Millor Fernandes);

Rui Costa desdobra-se em aparecimentos: o conceito de plágio criativo;

Pinto da Costa não sabe quem é Fran Navarro: Al Capone não sabia em que rua ficava o Canadá;

Chegou um jogador Vegan para o Sporting: pelo menos não vem para encher chouriços;


domingo, 29 de janeiro de 2023

Taça Pinheiro Baptista

 

A defesa da tradição não se faz apenas através da vivência do folclore ou da conservação das instituições, inúmeros eventos permitem-nos experienciar ao vivo e a cores a manutenção do costume nas comunidades. Ontem tivemos a possibilidade de observar isso mesmo num jogo tradicional de futebol (e já tínhamos saudades), fazendo parte do elenco a equipa do Futebol Clube do Porto, a equipa de arbitragem dirigida pelo sr. Pinheiro, e uma terceira (por acaso o Sporting) equipa que estava lá para encher chouriços. O Sr. Pinheiro Baptista fez o que lhe competia na defesa da tradição, já por ele várias vezes, inclusive, cumprida. O Sr. Pinheiro Baptista, assim como o modus vivendi do Porto faz parte da riqueza intrínseca da tradição, aliás, expressa no dia anterior pelo porta-estandarte Pepe. Por momentos parecíamos estar confortavelmente instalados nos anos 90 do século passado.

O Sporting tentou jogar futebol com as limitações que lhe são conhecidas, e ainda assim poderia perfeitamente ter estragado ou adiado, pelo menos, o desenrolar da tradição, não fosse Adán ter transformada a sua baliza numa capoeira e a baliza adversária ser mais uma vez uma espécie de domínio inalcançável, tantas são as oportunidades esbanjadas, algo que também começa a ser parte inegável da tradição. A tradição continua sobrevivendo, igualmente, na enorme massa adepta verde e branca, verdadeiro suporte da grandeza do Sporting (vejam os jogos nos Norte do país).

Esta posta, como um jogo tradicional de futebol (sem Pinheiro Baptista), tem duas partes. Vamos à segunda:

Como diria Maricá, citado por Millor Fernandes: só com a ação se escapa da inércia. Presumo que o contrário também seja verdadeiro. O Sporting estava agindo, diziam-nos, logo em Abril de 2022, preparando atempadamente a época seguinte (com a mesma equipa técnica das duas épocas e meia anteriores). Logo chegou um vaso de porcelana chamado Jeremiah St. Juste, antes fosse de vidro, teria sido igualmente frágil, mas mais barato. A época continuou sendo preparada no enorme terreno de pousio que é o defeso no futebol nacional. A malta chega a esquecer-se que existe uma coisa chamada bola, como se estivéssemos nas gigantescas férias de verão dos idos 80 do século passado, em que a malta se esquecia que alguma vez tivesse frequentado um estabelecimento de ensino. Ainda bem que estava tudo pensado ao detalhe.

Cedo se percebeu que o Sporting tinha uma equipa vulgar que simulava caçar com gato, julgando-se cão: escrevinhámos sobre esse pormenor de simulacro que aos poucos tomou de assalto os balneários e algumas cabeças dotadas de livre arbítrio. Só não conseguíamos convencer os adversários, apenas os sportinguistas. Amorim lá foi explicando em várias das suas roupagens: economista das tardes da Júlia, administrador não executivo e até treinador. Não apreciei, apenas, as suas recentes declarações sobre a “distância” para os nossos rivais. Se se estava referindo a ovos para a omeleta deveria tirar da equação o Braga. De resto, apelar ao bom senso referindo a questão dos orçamentos talvez resulte em contexto europeu, não no lodaçal da bola cá do burgo. Perdemos vários jogos com equipas cujo orçamento não dá para mandar cantar um central de porcelana do Sporting.

(Nota extravagante ao meio da posta: já repararam que a média de espectadores do Sporting no campeonato não chega a trinta mil? E isso após o anunciado record de vendas de gamebox, uma box, poucos games assistidos).

Com tanto planeamento e boa gestão de recursos chagamos ao jogo da época (ainda por cima tradicional) com pouco espaço para os feijões. No final o presidente descobriu a pólvora outra vez e explicou que somos resistentes. Pois somos. E, o senhor, será que é?

 

domingo, 23 de outubro de 2022

Há qualquer coisa certa que não está errada

 

Tinha começado as hostilidades com uns camarões, lerpando de seguida um bife de atum acompanhado de arroz branco e uma cebolada. Um tinto do douro ainda por ali andava quando o jogo começou e se desenrolou no âmbito do rotinado: há qualquer coisa errada que não está certa. Amorim (mais uma vez) encenava o seu modelo ao ponto de confundir os adversários (tratar-se-ia do modelo ou do seu simulacro?) e os próprios jogadores que, fazendo jus à encenação, desperdiçaram inúmeras oportunidades de golo, aliás, como tinha acontecido na primeira parte do jogo com o Chaves, por exemplo. O Casa Pia mesmo participando do simulacro foi duas vezes à baliza adversária: um golo e uma bola no ferro foi o resultado. Ficou ainda uma expulsão em banho maria, sem VAR que lhe valesse.

Na segunda parte a intensidade dramática (afinal o Sporting perdia em casa – mais concretamente em meia-casa), tinha tudo para resvalar para o abismo ou para a mais inusitada glória. Por essa altura ainda andava ali por perto uma garrafa de tinto do Douro e alguns cigarros mal apagados quando Trincão enviou uma bola ao poste, já com Chico Lamba em campo. Por momentos pensei que o simulacro levasse a melhor, mas depois com a entrada de Paulinho tudo se precipitou. Com Paulinho na frente acontece um paradoxo espantoso: a sua presença parece um equívoco no modelo (ou na sua simulação/encenação), mas ao mesmo tempo funciona com uma (hipotética?) referência lá na frente. Isto confere ao jogo ou, se quisermos, confere ao modelo, outra imprevisibilidade, principalmente para quem defende, tornando a equipa do Sporting com menos um artista em campo (Trincão) muito mais incisiva e inquietante para o adversário, tanto que em poucos minutos o resultado ficou feito, com a contribuição decisiva do tal equívoco e do sempre imprevisível e aguerrido Nuno Santos (entre outros!). Se calhar há aqui qualquer coisa certa que não está errada... mas posso estar enganado. 

 

domingo, 16 de outubro de 2022

Há qualquer coisa errada que não está certa (II)

Não sou dado a pressentimentos, o esturro chega-me sempre na sua fase calcinada. Quando Matheus Nunes rumou ao sonho Wolverhampton Wanderers, um sonho que o próprio sonhou de véspera, já que tempos atrás se sonhava noutro olimpo, condescendi com a teoria da época previamente planeada, ainda o Jeremiah St. Juste não se lesionava cada vez que se levantava da cama para o pequeno-almoço.

Entretanto, Amorim, na sua versão economista das tardes da Júlia, encaminhava-nos para um ambiente de incoerências sem qualquer responsável, a não ser talvez um ente divino que manobra a vida do nosso clube com sapiência transcendental. Nestes casos acredito sempre na ilusão que me faz vestir a camisola preparando-me para a cerimónia.

O Sporting não se reforçou, sejamos honestos, nem que seja por um segundo. Saiu o Sarabia para entreter as idas à mercearia do Kylian Mbappé ou para colmatar as ausências de Neymar quando este está em campanha pelo Bolsonaro. Saiu o Palhinha que também veio a reboque do Braga (e nunca ninguém se queixou disso, caro Amorim); saiu o Tabata diretamente da feira da ladra em bom saldo, e o marroquino Feddal que ainda alguns devem recordar com saudade. O Jovane anda em convalescença espiritual em permanente aquecimento e o Slimani rumou ao paraíso das redes sociais, em bom francês.

As entradas foram permutas, rascunhadas para o modelo, percebi logo isso, já as conhecia do tempo da universidade - não esquecendo o Edwards que já cá estava, embora falando português por uma palhinha. Ninguém achou necessário incluir mais avançados, nem pinheiros, nem arbustos daqueles corredores que se costumam ver nos filmes de cowboys, capazes de fazer a vez do Paulinho quando este estiver ocupado entre linhas no banco de suplentes. E estava tudo planeado, cogitando-se mais um Pote de ouro no final do arco-íris.

Já muito foi escrito e talvez até falado, nas tascas, sobre a desmontagem da equipa do Sporting, mas sempre numa perspetiva extrínseca, isto é, do adversário, sem pensar na possibilidade da sua subversão a partir do interior e consequente decomposição em peças, mais ou menos coladas com a saliva de cada momento. Assiste-se muito a isso na vida de todos os dias. Pensei nisso enquanto via um documentário sobre o Gaudí e a sagrada família de Barcelona, ainda hoje por terminar.

O modelo (actual) é um simulacro do modelo, e como todos os simulacros, creio que o disse Baudrillard, não se trata de um seu sucedâneo, ou apenas de uma representação do original, mas da criação de uma ilusão, no limite da simplificação da simulação: fingir ter o que não se tem. Por isso todos acreditam que Amorim insiste, quando este encena, e, nesse sentido, assume-se como um criador de imagens que ultrapassam a esfera do futebol. Acredito que o simulacro até certo ponto precede o original.

Um bom exemplo disso são os primeiros dois jogos da liga dos campeões. Dizem-nos que resultaram porque o Sporting jogou contra equipas que tentaram assumir os jogos, libertando espaços, podendo assim surpreender com transições e trocas entre os jogadores, quando o que aconteceu foi funcionamento do simulacro em condições ótimas, permitindo finais assombrosos: por onde andará o rei Arthur Gomes após o admirável golo contra o Tottenham? Presumo que esteja a ser preparado para o modelo.

Qualquer alteração significativa ao simulacro, ou melhor, qualquer interferência na simulação, seja a forma como o adversário se dispõe, não tentando desmontar o modelo, mas simplesmente desrespeitando-o, como o fez a Santa Clara recentemente, torna o jogo do Sporting um pastiche (um pastiche do simulacro) arrastado, sobrevivendo de alguns rasgos individuais. Nos jogos contra o Marselha a derrocada do Sporting não foi mais que a ingerência do fator humano no jogo, muito comum em futebol ou noutras actividades cuja presença humana seja notória. Não foram (apenas) os erros individuais que possibilitaram o descalabro, mas o descalabro que pairava como uma sombra terrível, aguardando apenas que o acolhessem.

Não será por acaso que após estas recentes ingerências etéreas no modelo (Amorim não se afasta nem um milímetro do seu… simulacro), o jornal Record tenha publicado que o Sporting procura pelo menos três jogadores para o mercado de Inverno; ou que tenha vindo a público o resultado financeiro absolutamente histórico, com lucro de 13,6 milhões nas contas da SAD, apresentado recentemente. Os números aparecem sempre nestas ocasiões, embora por aqui pairem algumas nuvens sobre o Clube, nomeadamente sobre o futuro das modalidades.

Nota: deixo aqui a minha perplexidade relativamente às assistências em Alvalade, após o anúncio com grande pompa do record de vendas de Gamebox. Em quatro jogos para o campeonato, dois não chegaram aos 30.000 espectadores e outros dois por pouco ultrapassaram essa barreira. Grande parte dos detentores de gamebox pura e simplesmente não vão ao estádio, ou estão sempre de férias, em lugar incerto. Outra perplexidade, para além dos silêncios cada vez mais prolongados nos jogos em casa, é aquela bancada vazia atrás de uma das balizas. Resolvam-se.

domingo, 21 de agosto de 2022

Há qualquer coisa errada que não está certa

 

Uns falam muito e conseguem não dizer nada – estão neste patamar alguns políticos da nossa praça; outros nada falam mas conseguem passar algumas coisas. Estão neste limiar os dirigentes do Sporting que nos últimos tempos se escondem atrás das conferências de imprensa do treinador. Amorim que ainda há pouco tempo era acusado de não ter qualificações para treinador de futebol, disserta agora sobre dinheiro e capital, gestão e empreendedorismo como se de um catedrático do IST se tratasse, ou de um avisado comentador económico nas tardes da Júlia.

Tudo isso poderia se afigurar estranho não tivesse eu andado a banhos e a whiskies velhos, peixinhos grelhados e tintos a condizer. E, nesse sentido, um pouco distraído. De volta, comecei a intrigar-me com alguns comentários de Amorim, principalmente na sua versão economista nas tardes da Júlia, não conseguindo discernir se o homem está realmente dentro de todo o processo ou se navega ao sabor dos velhos bitaites internos.  

Não sendo um fanático dos factos - ou mesmo da realidade - embora apreciador do realismo mágico, consigo serenamente olhar o homem na sua circunstância: vários titulares foram à vida (mais o Tabata) às pinguinhas (e o mercado ainda não acabou), outros entraram, mas já o ano passado a equipa parecia mais que espremida. Entrou o dinheiro da liga dos calmeirões, acrescido das vendas de jogadores, supostamente parte da reestruturação da dívida ficou concluída com reconversão das VMOC, a equipa vinha sendo preparada com antecedência, segundo os responsáveis, isto é, Amorim. Se o treinador afirma que a incoerência não é dele, será do comentador de economia das tardes da Júlia? Temo que voltemos ao tempo da visão estratégica e dos funâmbulos das contas.

Chegamos ao Dragão com passagem em Braga: três vezes na frente do marcador, três vezes nos deixamos empatar, algo nada normal durante o consulado Amorim, treinador. Mesmo descontando os erros individuais, intrínsecos a todo o ser humano, percebemos que a equipa como um todo defendeu de forma mais desorganizada. O jogo treino com o Rio-Ave serviu para a despedida de Matteus Nunes. A discussão arrebatada sobre se Amorim já sabia ou não sabia da saída de Matteus, se o timing terá sido o melhor (meu deus – a janela de mercado dura uma eternidade), são lateralidades pouco importantes numa semana com um clássico que nos poderia deixar a cinco pontos do Porto.

Amorim continuou o seu trabalho como um avisado comentador económico nas tardes da Júlia, o que lhe deve deixar pouco tempo para treinar a equipa, não sabemos. E não sabemos se existirá mais alguém no clube(?), já não digo um presidente, mas um vogal, um assistente administrativo que possa ir às tarde da Júlia, se não for para esclarecer ao menos para deixar o Amorim treinador treinar a dor como diria o Abel Xavier.

Felizmente o Hidemasa Morita ainda pesca pouco de português e não deve assistir às tardes da Júlia (agora o programa chama-se apenas Júlia, mas como passa de tarde..), e assim não sabendo da existência do comentador avisado de economia Amorim começou o jogo no Dragão com vontade de resolver aquilo com um remate tão colocado que acertou no poste. A primeira vez que o Porto foi à baliza do Sporting quase que o Taremi sacava um penalti, mas a bola sobrou para um isolado Evanilson e o árbitro já não teve de picar o ponto. A história da segunda parte mostra-nos um Sporting um pouco desorientado, até o Adán andava aos papéis, o Porro com a cabeça nas mãos acenando a um Sarabia fantasmático. 

No final não fiquei para os comentários. Novidades, já sabemos, é nas tardes da Júlia.

 

terça-feira, 17 de maio de 2022

Para o ano há mais

 

O ano acabou bem com o Rui Monteiro a ter de ir ao VAR por suposta entrada a pés juntos ao Covid. Ou vice-versa. As imagens não eram conclusivas. Felizmente a Covid estava em fora de jogo por alguns centímetros. A grande penalidade não foi assinalada para espanto de alguns, mais incautos.

O ano acabou bem para o Braga, conformado. Um quarto lugar apenas faz sentido se o Benfica for o terceiro. Caso tivesse o Sporting ficado em terceiro havia lugar para o VAR e alguns comunicados.

O ano acabou bem com o jornal A Bola e outros órgãos oficiosos a fazerem a apologia do Seixal e da formação benfiquista, inventar para quê, com tantos pontos de distância a ferida obrigava a uma pequena sutura, parecendo estarmos perante o Sporting Lisboa e Benfica. A mudança de paradigma na luz, que decerto surpreenderia Thomas S. Kuhn, é muito conforme as luzes que vão aparecendo nos sonhos ou em algumas visões noturnas, isto se ninguém ligar o quadro elétrico ou o sistema de irrigação.

O ano acabou bem para o Porto, sagrando-se campeão de futebol, embora atravessado pelo pseudo tabu do agora anjinho Conceição, e após uma ultrajante perseguição de que terá sido alvo este clube reconhecido pelo seu fair play desportivo e alimentar, onde a fruta se revela um elemento preponderante para o seu sistema digestivo.

O ano apenas acabou mal para o Sporting. Assim parece. Amorim foi o único a dizer que foi um ano negativo, pese embora a ocorrência de um pequeno milagre (sem componente religiosa) mais uma vez realizado. O Sporting fez o mesmo número de pontos do ano anterior e isto com grande parte do ano a jogar com o Paulinho como grande recuperador de jogo e o Pote com a cabeça no final do arco-íris. E com dois títulos a tiracolo. Finalmente, o segundo lugar parece-nos o primeiro dos últimos. E com alguns milhões a compor o ramalhete. Talvez para o ano o Vinagre se transforme em vinho do bom. Entre outros. Para o ano há mais.

segunda-feira, 16 de maio de 2022

Zaragatoas e ideias comichosas

Há poucas coisas que me mexem com as ideias. A zaragatoa é uma delas. Intromete-se nas narinas, avança, insistente, inconveniente, até fazer cócegas no hipotálamo e se instalar uma comichão de tal magnitude que nos veem as lágrimas aos olhos, de riso ou de choro, conforme as ideias importunadas. Assim se mudam as ideias (em sentido literal). A conclusão do teste, positivo ou negativo, é a simples confirmação da maior ou menor volubilidade das ideias. Sim, nem sempre somos de ideias feitas, também mudamos de ideias.

Nos últimos dias mudei de ideias. Circunstâncias da vida, obrigaram-me a fazer o teste da Covid-19. Até vi estrelas, tal foi o número de ideias (feitas) sobressaltadas. Tinha a ideia do Pepe a enfiar um pero no Coates no jogo Sporting x Porto da primeira volta, em Alvalade, sem “penalty”, nem expulsão. Tinha a ideia da expulsão do Coates após falta do Taremi seguida do seu habitual mortal encarpado no jogo da segunda volta, no Dragão. Tinha a ideia que o Sporting podia ter mais quatro pontos e o Porto menos dois. Tinha a ideia que podiam (e deviam) ter acabado com os mesmos pontos, com o Sporting campeão. 

Tinha, mas já não tenho. Tratava-se de ideias erradas, muito erradas. A zaragatoa fez-me ver estrelas ou a (sua) luz, pelo menos. A zaragatoa e as inúmeras explicações dos últimos dias. O Porto bateu o recorde de pontuação do campeonato, é a melhor equipa portuguesa de todos os tempos. O Sporting fez tantos pontos quantos os da época passada, quando foi campeão, e foi a segunda melhor equipa atrás da melhor equipa portuguesa de todos os tempos. Os portistas estão orgulhosos e nós também.

[A zaragatoa mexeu-me com as ideias, é um facto, mas não, não conseguiu mudá-las, o teste deu negativo.]

sábado, 23 de abril de 2022

Dissecar o cadáver

 

Entre a Páscoa e a Pascoela, o Sporting decidiu mortificar-nos com um relance delicioso das nossas memórias. Como a memória é curta convém notar que a Páscoa este ano foi em Abril. Já não se trata do Natal, nem do dia de reis, nem sequer do dia dos namorados, ou perto do dia do pai. Não, o Sporting em meados de Abril ainda discute (ou discutia) o título e estava nas meias-finais da taça. Esse pormenor mostra-nos que o nosso sofrimento tem tido o prolongamento que merece.  

Dois factores contribuem decisivamente para alguma da penumbra que ensombra a clarividência dos Sportinguistas: os resultados recentes e, sobretudo, a perda do seu tempo assistindo aos vários programas da bola que por aí pululam. Nestes, assistimos a verdadeiras aulas de anatomia versadas em dissecação de cadáveres. Ontem, por desleixo, enquanto esperava o filme dos Monty Python “Em Busca do Cálice Sagrado” e bebericava um último copo de um tinto encorpado do Dão, dei por mim a fazer zapping pelos milhares de canais que se dedicam ao nobre ofício da informação futeboleira.

Invariavelmente o assunto era o mesmo: ora o mau momento do Sporting, ora o caso… a novela Slimani. As teorias eram tantas e tão diversificadas que dei por mim deleitado, pensando que aquilo não eram teorias da conspiração mas sim teorias da inspiração. As participações eram fervorosas, analíticas, conhecedoras, todavia, incrivelmente vazias. O objetivo era claro: mostrar que a turbulência teria voltado ao Sporting. Devemos sempre pensar a quem isto serve.

Entretanto, e paralelemente, tenta-se salientar o (suposto) magnífico momento do Benfica, com os resultados que todos conhecemos. Do Porto, apenas maravilhas, com o seu presidente a tentar meter a foice em seara alheia. Como a memória é curta e desprovida de escrúpulos, já ninguém recorda aquele enternecedor jogo entre a B SAD (ou será be sad?) e o Benfica, ou esse longínquo FC Porto-Portimonense com que fomos (recentemente) brindados. Com a saída das máscaras, será que voltaremos ao velho normal? `


quarta-feira, 30 de março de 2022

Tenrinhos!

A Macedónia do Norte entrou a pensar ganhar a jogar para o empate. Ora, se há seleção cuja especialidade seja ganhar empatando é a portuguesa. Só com o Fernando Santos é que os tenrinhos da Macedónia acabavam por perder com dois golos de contra-ataque. Ainda há quem o queira substituir, que prefira ter razão a ganhar [sabe Deus como, mas ganhar, não interessa]. 

terça-feira, 22 de março de 2022

Forte personalidade (do ano)

Ontem, num jornal desportivo perto de si, analisava-se assim a arbitragem do árbitro Dias no jogo do Porto contra o Boavista: “Arbitragem globalmente competente em jogo intenso e com vários lances de difícil avaliação. A sua forte personalidade acabou por prejudicá-lo ao não aceitar boa indicação do VAR [de cartão vermelho para o Mbemba]”.

Embora com atraso, a nossa modernidade (tardia) implica nova linguagem e novas formas de codificação, e a bola não é, não pode ser exceção. Não, não se trata de ideologia de género [seja isso o que for] como agora se diz. Ninguém tem culpa, nem o pai, nem a mãe. Trata-se, tão-só, do filho de uma grandessíssima forte personalidade e quem sai aos seus não degenera, diz o ditado popular. 

domingo, 20 de março de 2022

O assunto é um futebol sério

 

Falar sobre futebol passou a ser um assunto. O futebol não deveria ser um assunto, apenas um jogo. Mas em Portugal (que eu me lembre) sempre foi um caso de vida ou de morte. Recordo-me bem de alguns “enterros” da equipa anteriormente campeã, com direito a desfile e tudo. Se tivermos em consideração os inúmeros casos que nas últimas décadas salpicaram o futebol porquês, percebemos que o futebol se tonou parte do cancioneiro ao mesmo tempo que do tribunal. Ser um assunto, portanto, não é de hoje. O que é de hoje é o filme que envolve o assunto. O filme e a logística. Por exemplo, ontem nem me passou pela cabeça deslocar-me a Guimarães para assistir ao jogo. Para isso precisamos de ter em dia o livrete das operações especiais undercover, com especialidade em caracterização e fuga. Não é fácil entrar naquele estádio (e noutros) sem um conjunto de habilidades e caracterização apropriada. Requer passagens anteriores por Guimarães e conhecimento da língua local. Também não é fácil sair do estádio, principalmente se estivermos na bancada dos adeptos leoninos (qualquer outra é totalmente desaconselhável, mesmo a experientes espiões). Durante o jogo a coisa também não se afigura simples, teremos sempre de ter em conta os adeptos adversários e os nossos. Fora das quatro linhas joga-se um jogo cuja linguagem é pertença de apenas uns (poucos) eleitos.

Ontem foi mais um dia de jogo, perdão, de assunto. As equipas entraram em campo e começaram a tentar jogar futebol, embora com as paragens normais nos vários apeadeiros do costume. Enquanto teve pernas para a intensidade de um jogo de futebol profissional, ainda que jogado às pinguinhas, o Vitória pareceu dividir o jogo, principalmente na primeira parte, fruto de algum desacerto (é assim que se diz?) leonino, criando assim a ilusão que estávamos perante um jogo de futebol. Na segunda parte, com a naturalidade habitual, o Sporting falhou e marcou. De repente o futebol voltou a ser um assunto qualquer que não interessa ao caso e começamos a assistir à lenga-lenga habitual de protestos dentro e fora de campo. Paragens, dentro e fora do campo. E uma carga policial, desta feita apenas fora de campo, mas dentro do estádio. A partir daí o assunto ficou cada vez menos dividido e o Sporting marcou e falhou, não necessariamente por esta ordem, demostrando algum virtuosismo no assunto em causa. O futebol é um assunto sério, ou o assunto é um futebol sério? Eis a questão.

quinta-feira, 10 de março de 2022

Valha-nos Rúben Amorim e suas promessas!

Continuo a pensar o que sempre pensei sobre a Liga dos Campeões, mas começo a apreciar estes jogos a meio da semana. Não têm a emoção de um jogo contra um Varzim para a Taça de Portugal ou contra um Arouca para o campeonato, mas nem só de emoções vive um homem [ou mulher por muito que digam que são mais emotivas]. Os jogos da Liga dos Campeões são o mais parecido que se consegue arranjar de um jogo a sério. É um treino a sério e sério, um exercício com fogo real [embora não deixe de ser um treino para os mais atentos e avisados]. Depois de um jogo destes, um treinador pode ver-se despedido ou um jogador reabilitado. Também há o dinheiro [e não é pouco], uma espécie de Plano de Recuperação e Resiliência [PRR] do futebol português, mas é conversa repetida, conversa gasta. 

Mas deixemo-nos de teorias e vamos aos factos, ao jogo propriamente dito contra o Manchester City, começando por sublinhar a argúcia tático-estratégica do Rúben Amorim. Ainda antes de começar, a eliminatória já estava perdida. Como estava perdida e estava [como se viu] tratámos de enfardar cinco de uma vez em casa. O facto de o termos feito em bom tempo e resolvido o que havia para resolver, permitiu-nos negociar um acordo de cessar-fogo e, assim, dividir o espólio com o adversário. Na primeira parte começámos por cumprir o acordo até que nos entusiasmámos e levámos a bola duas vezes seguidas para o ataque. O adversário ficou aborrecido [e com razão] e o vingativo Sterling foi muito desagradável com uma pessoa mais velha, com idade para ser avô dele, merecedora de mais, muito mais respeito. Valeu-nos [e valeu-lhe] o Adán que levantou o braço, segurou a bola e deu-lhe uma reprimenda das antigas. 

A segunda parte iniciou-se com uma brincadeira combinada entre as duas equipas. O adversário fingia que marcava, nós fingíamo-nos surpreendidos com os ressaltos e os passes e desmarcações, o Adán fingia que levava um frango e no final o árbitro anulava por fora de jogo. Ficava tudo na mesma mas sempre se podia dizer que a culpa [como sempre] era do árbitro [que só participa no jogo na exata medida que alguém tem de ficar com a culpa]. Às páginas tantas, o guarda-redes do Manchester City foi substituído por um senhor saído diretamente da repartição de finanças ou dos serviços municipalizados locais e foi esse senhor que demonstrou, se dúvidas ainda existissem, que o Paulinho falha sem olhar a credo, raça ou género, um verdadeiro paladino do princípio da não discriminação. Tudo acabou numa primeira bacalhauzada entre o Rúben Amorim e o Guardiola seguida de nova bacalhauzada entre o Paulinho [o único, o autêntico] e o Guardiola. 

Vou ter saudades destes jogos a meio da semana. O Rúben Amorim promete-nos que vamos regressar, para o ano. Valha-nos isso! 

quinta-feira, 3 de março de 2022

Real e sua representação ou futebol na Broadway

Para cada um de nós, a realidade, o real não existe, existindo, sim, a sua representação. O olhar pressupõe um entendimento sobre o que se vê e nem todos vêm o mesmo pois dispõem de entendimentos diferentes. Esta sobreposição entre o que se vê e o seu entendimento encontra-se bem expresso no Poema das Coisas Belas, de António Gedeão. Aqui vão uns versos:

"Se acaso as coisas não são coisas em si mesmas, Mas só são coisas quando coisas percebidas, Por que direi das coisas que são belas? E belas para quê?"

"Se acaso as coisas forem coisas em si mesmas, Sem precisarem de ser coisas percebidas, Para quem serão belas essas coisas? E belas, para quê?"

Ontem, o Evanilson tropeçou no Pedro Porro e caiu, aproveitando ainda para lhe enfiar uma bofetada nas fuças. O Paulinho tropeçou no Bruno Costa e caiu também. Os tropeções e as quedas são iguais, diferenciando-se uma situação da outra pelas fuças amassadas. A representação do Evanilson e a representação do Paulinho constituem uma dupla representação, a representação de dois artistas que remetem para a representação do real, sendo essa representação diferente para mim e para o árbitro Dias. Há dias, a representação do Taremi também foi diferente para mim e para o árbitro Pinheiro. Há mais dias ainda, a representação do Pepe e a queixada amassada do Coates também foram diferentes para mim e para o árbitro Almeida. 

Três jogos, dois empates e uma derrota. É mau? Podia ser melhor? Podia ser pior? Não sei nem me interessa. Representação é arte, teatro, não é desporto. Se fosse desporto, futebol, interessava, sendo arte performativa, tanto faz que seja drama ou tragicomédia, revista ou ópera, desde que seja boa e se desenrole nos sítios certos, na Broadway ou no Parque Mayer, tanto faz também.     

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Coletes e apitos: mais do(s) mesmo(s)

O jogo de ontem contra o Estoril constituiu uma lição para o Rúben Amorim, outra para o Pepe Guardiola e outra ainda para nós, sportinguistas, dados a elucubrações técnico-táticas sobre o futebol. O Rúben Amorim ficou a saber que não tem mal nenhum defender com os onze atrás da linha do meio-campo, com cinco na defesa, quatro no meio campo e um no ataque [mas a defender e a correr atrás dos adversários como se não houvesse amanhã], sempre que o inimigo é superior em número e armamento. O Pepe Guardiola ficou a saber que, depois de se estar a ganhar por três a zero, fazem-se substituições aos magotes e deixa-se o jogo andar, conforme estabelecido na Convenção de Genebra. Nós, bem, nós definitivamente ficámos a saber que, no final, ganha a melhor equipa, a que tem os melhores jogadores, e pouco interessa se joga este ou aquele ou se se joga com mais ou menos autocarro, com este ou aquele sistema tático [a melhor é a mais cara e a mais cara é a melhor porque uma coisa é a outra e vice-versa, de acordo com teoria da eficiência dos mercados]. 

O campeonato continua mais do mesmo. Continuam os coletes nos jogos do Porto. Mudam-se as cores mas não se muda a moda [dos coletes]. O futebol transformou-se em “paintball” sem armas de brincar mas com bofetadas, pontapés e jogadores aos pinotes e essa é a razão para os coletes, as cores dos coletes [no azul, não confundir coletes com capacetes]. Também continuam as notícias sobre empresas de informáticas e as suas relações comerciais com clubes de futebol [é a isto que se chama digitalização ou transformação digital]. A este propósito, tem sido inestimável o jornalismo de investigação do Porto Canal, havendo quem afirme que um dia destes também irá descobrir o Apito Dourado [ou descobrir que não é possível descobri-lo porque nunca existiu], o verdadeiro Santo Graal do jornalismo desportivo.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Há coisas que não se pedem a ninguém

Não se envia uma equipa na sexta-feira para a fronteira entre a Ucrânia e a Rússia para a mandar regressar a casa passado um par de dias para jogar à apanhada com umas borboletas de Manchester. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa: o teatro de operações e as tropas de camuflado da Organização do Tratado do Atlântico Norte não se confundem com o recreio e os meninos de bibe e chapéu de palhinha do Jardim Escola João de Deus. 

Vão-se os anéis, ficam os dedos ou, por outras palavras, vão-se os resultados e as eliminatórias, fica o pilim, o graveto, o carcanhol. Se bem percebi as notícias dos últimos dias, os clubes portugueses de futebol precisam de cada vez mais dinheiro para contratar empresas de informática. Quando se trata de cibersegurança, não se brinca, não se olha a meios. Fica a dica para as empresas de telecomunicações e de media e os laboratórios de análises clínicas.

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Não há nada melhor que uma boa tradição

 

Vou começar pelo fim: já tinha saudades de um espetáculo como aquele a que ontem assistimos no final do jogo entre o Porto e o Sporting. Um espetáculo verdadeiramente envolvente, com a participação de vários elementos erradamente (para alguns) considerados estranhos a um jogo de futebol.  Li algures que parecia termos voltado aos saudosos anos oitenta e noventa, como se a tradição não se tivesse mantido incólume todos estes anos naquela arena. Sucede que o Sporting nos últimos tempos tinha deixado de contar na lida daquela brava raça autóctone, e por isso mesmo a tradição ter-se-á suavizado, num sentido paternalista, condescendente, adaptado à realidade.

Na arena em causa e, desde tempos imemoriais, não se distingue a direção do clube dos grupos mais ou menos desorganizados de adeptos, ou de outros elementos inerentes à tradição. Toda a gente pode participar, seja de que maneira for. Essa tradição já terá alargado as suas fronteiras a clubes como o Canelas, cujo nome nos transporta para o âmago da sua imagem de marca.

Posto isto, voltemos ao início, onde forçosamente teria de haver um jogo de futebol. O árbitro, parte integrante da tradição, terá entrado em campo com algumas limitações, principalmente em determinado local dado a evacuações, onde não lhe caberia um feijão. Não é fácil arbitrar nessas condições. O orifício constrangido torna praticamente impossível qualquer discernimento que ponha em causa o cicerone responsável pela chave capaz de voltar a reabrir o dito cujo. Não é fácil respirar com aquilo apertado, ficando a visão toldada, incapaz de qualquer acção contrária ao pré estabelecido.

Não sendo o Sporting devidamente informado destas condições respeitantes à tradição (nem os seus adeptos, que ingenuamente compareceram em grande número), o jogo inicialmente até parecia semelhante a um jogo de futebol. Até o Porto, sem o Paulinho Santos e o Jorge Costa em campo, aparentava querer jogar à bola, embora a presença de Vítor Baía nas imediações indicasse o contrário. Neste impasse, com o árbitro ainda a respirar por uma palhinha de plástico, o Sporting marcou dois golos, o segundo verdadeiramente sublime, o que me forçou a dar uma volta inteira ao sofá em plena e desvairada corrida. O jogo de futebol, na sua aparência de jogo de futebol, terá continuado, já não me lembro bem, mas terá continuado, até deixar de continuar a ser um jogo e ser apenas algo que era parte de uma tradição.

Felizmente, a tradição trouxe-nos à terra. Não há nada mais belo que uma tradição.

Por mim era já património imaterial da animalidade. Obrigado.

 

 

segunda-feira, 24 de janeiro de 2022

Superstições

Não me considero uma pessoa supersticiosa mas a verdade é que a melhor explicação que encontro para o visível abaixamento de forma do Sporting é a falta de diálogo sobre o tema aqui na 'Insustentável leveza de Liedson'. Assim sendo, resolvi escrever este pequeno texto para que não fiquemos a ver a importantíssima Taça da Liga por um canudo, só por ausência de textos neste blog.

E existe muito para escrever. Podia começar por falar da insustentabilidade que é andar a jogar à bola sem uma defesa quase imbatível. Ou da insustentável falta de leveza da tripla "PSP", que parece continuar a falhar golos como se ainda vivêssemos no tempo em que os adversários já se davam por contentes se o Adán fizesse mais que uma defesa no jogo inteiro (quanto mais marcar 2 ou 3 golos!). Ou será que a insustentabilidade é mais global e não podemos esperar que um plantel curto não chegue para tanto durante tanto tempo ?

Não sabemos. Aliás, não sabemos se o Rúben Amorim não terá razão quando diz que até jogamos melhor que o ano passado, mas as coisas parecem não acontecer...

Mas algumas coisas sabemos. Sabemos que a equipa não tem a crença que vai aparecer um golo aos 90+ minutos a salvar o dia. Não queremos saber, mas sabemos, que os árbitros se vão habituando ao VAR e afinal um murro do Pepe não vale tanto como um choque entre o Matheus Reis e o Galeno (ou que os pitons do Bragança são afinal muito mais violentos que os do Otamendi ou do Mbemba). Nem tanto queremos saber se o Nuno Santos é o único futebolista em Portugal que provoca o público.

Enfim, diria que passaram apenas umas semanas desde o dia 17 de novembro, quando por aqui se refletia sobre a impressionante performance da nossa seleção, e quase nada mudou. O Sporting perdeu, como vai continuar a perder (e a ganhar e a empatar), mais por demérito próprio que outra coisa qualquer. Mas o futebol Português, esse continua a não desiludir (vá, talvez a seleção desiluda um pouco). Assim sendo, resta-nos a superstição para acreditar que vai ficar tudo bem!

quarta-feira, 17 de novembro de 2021

Despedir ou não despedir o Fernando Santos é a questão?

A derrota contra a Sérvia originou indignação das antigas. A culpa era toda do treinador e está na altura do Fernando Santos com as suas mezinhas ir pregar para outra freguesia. Os jogadores são magníficos e está-se mesmo a ver que qualquer uma daquelas pessoas que na televisão fala de bloco alto e baixo, de transições, ofensivas e defensivas, de momentos de jogo os colocava a jogar articulados e afinados, um género de “London Symphony Orchestra” do pontapé na bola. A ideia simples e ingénua que os nossos jogadores são bons e com bons jogadores se fazem boas equipas que jogam bem e assim ganham não corresponde aos factos, é um facto. 

Portugal joga mal, como sempre jogou, com o Fernando Santos, o Paulo Bento ou o Carlos Queiroz. O que distingue a seleção de ontem relativamente à de hoje não é a qualidade de jogo mas a convicção: uma coisa é jogar mal, outra bem diferente é jogar convictamente mal. Temos dois jogadores que fazem a diferença relativamente a todos os outros das restantes seleções: o Pepe e o Ronaldo. Não estou a afirmar que o Ruben Dias, o João Cancelo, o Bruno Fernandes, o Diogo Jota ou o Bernardo Silva sejam maus jogadores, muito pelo contrário. O que afirmo é que são como os chapéus do Vasco Santana, há muitos como eles. Os jogadores da Sérvia são excelentes e as diferenças relativamente aos portugueses de pormenor. 

O que fez da Seleção Nacional uma equipa temível não foi o bom ou o mau jogo. O jogo foi sempre mau. Nos tempos áureos do Fernando Santos, a Seleção Nacional chegou a ser a equipa mais cínica do Mundo: dificilmente sofria um golo e sabia que marcava pelo menos um. Esta crença que se autorrealizava uma vez atrás da outra assentava nos dois protagonistas que falei. A solução não está em despedir o Fernando Santos para se arranjar outro que coloque a equipa a jogar melhor. A solução está em despedir o Fernando Santos para se arranjar outro que nos coloque a jogar tão mal como de costume mas que o faça convictamente. O problema do Fernando Santos não é a qualidade do jogo mas a incapacidade de transmitir essa convicção.

domingo, 31 de outubro de 2021

A culpa disto tudo é de Rúben Amorim

 

Esta foi uma semana interessante: o Presidente da República em directo de um multibanco; o ex-presidente do Benfica em passeata de Ferrari no Gerês, a banhos nas termas; o chumbo do orçamento, meio caminho andado para eleições antecipadas; os combustíveis pela hora da morte; tudo culminando num sábado com os três grandes a jogarem em sequência, com os resultados que se conhecem.

Em abono da verdade a culpa disto tudo é de Rúben Amorim. Existe um a.R. e um d.R. Um antes de Rúben e um depois de Rúben. Antes de Rúben vivíamos na mística do falhar, falhar cada vez melhor, falhar sempre. Depois de Rúben, se não for um grande jogo, que ganhe o Sporting, e onde vai um vão todos. Todos? Todos, menos o Paulinho, dirão alguns, menos atentos.

De facto, o Paulinho parece tomado pela velha máxima do Sporting, falhar, falhar cada vez melhor, falhar (quase) sempre! Mas, na realidade, o Paulinho é um agente infiltrado, treinado não para matador, mas para dissimulador, forçando o adversário a cometer erros e a abrir espaços. Semear a incerteza é semear o pânico.

Como diz o Vítor Manuel, ninguém ganha sozinho, e assim sendo, o Paulinho não falha sozinho, falha para a equipa, em suma, falha para um bem maior. Ainda ontem, num canal televisivo com nome de jornal desportivo, Vítor Manuel destacava a importância de Paulinho no preenchimento de espaços, nas transições (tudo menos a marcação de golos) e nas bolas paradas, de que o golo de Coates é um exemplo, pois a bola é cabeceada ao primeiro poste por Paulinho, não em direcção à baliza, mas para um espaço onde supostamente aparecerá alguém que não falhe. Esse alguém, ultimamente é Coates, ele próprio um dissimulador, por excelência.

Quando não falha o Paulinho, falha o Matheus Nunes a fazer de Paulinho. Um destes dias falhará inesperadamente Coates, em prol de outro movimento que permitirá um golo de pontapé de moinho a Adán. Entretanto, o que era inesperado (golos de Coates na sequência de um canto) tornam-se uma repetição facilmente desmontada, mais uma vez, por todos os adversários. Ontem isso aconteceu mais uma vez. Antes do jogo, já o Pepa mostrava o lance do golo a uns incrédulos jogadores do Vitória. Qualquer semelhança com a realidade é da responsabilidade de Rúben Amorim.

quarta-feira, 27 de outubro de 2021

Prefiro os Flintstones

Depois de ter escrito o que escrevi sobre o jogo do Besiktas, estava dispensado de escrever o que quer que fosse sobre o jogo do Moreirense. Estabelecida a lei-geral é só esperar que se aplique em cada caso em concreto. O problema está em estabelecer essa lei-geral e duas observações não chegam. Há dimensões epistemológicas nas táticas do Rúben Amorim que remetem para potenciais contradições, como, por exemplo, a criação do universo a partir de um único momento fundador, o Big Bang, e o conceito axiológico do antes, fundador de qualquer movimento filosófico que se preze. Por outras palavras, o Rúben Amorim é um discípulo da Escola de Frankfurt, um Habermas do pontapé para a frente [e sem fé em Deus].

Todos viram e só preciso de me repetir em parte. Coates, o nosso ponta-de-lança, continuou escondido a central, enquanto aquele que parece o nosso ponta-de-lança, Paulinho, continuou a parecer e, assim, a fazer de contas que é [e fá-lo tão completamente e convictamente que às vezes até ele acredita que o é]. No momento certo [num canto, por outras palavras] lá apareceu o Coates para o golo da ordem e a vitória do costume. Antes e depois, o Paulinho foi falhando, umas vezes desmarcando-se bem e dominando mal, outras desmarcando-se e dominando bem e rematando mal. Houve falhanços para todos os gostos e, assim, se pode dizer que ele não sabe o que é falhar [quem sabe falhar costuma falhar consistentemente, sempre da mesma maneira]. 

Ontem, para a Taça da Liga, tudo mudou [e quando digo tudo, digo mesmo tudo-tudo]. Escondido, recuado ou avançado, não importa, não só deixámos de ter ponta-de-lança como deixámos de ter alguém que fizesse de ponta-de-lança também. Baralhámos completamente o Famalicão mas não menos baralhados ficaram os nossos jogadores [que os adversários não saibam quem é o nosso ponta-de-lança é uma coisa, outra coisa é os nossos jogadores não saberem também]. Valeu-nos o Ugarte. Está cá há pouco tempo e, por isso, ainda está completamente baralhado, independentemente de jogarem [ou não] o Coates e o Paulinho. 

O jogo ameaçava ser chato, chato mesmo e aí, aí sim, percebemos a razão para existirem árbitros sobretudo quando não existem vídeo-árbitros. Um jogo que podia acabar em goleada, acabou sofrido com uma vitória tangencial: tanto se jogava com o pé como com a mão, os fora-de-jogo (não) eram assinalados como se houvesse vídeo-árbitro para corrigir a (não) decisão, os amarelos apareciam e desapareciam sem ninguém perceber se estavam escondidos na manga ou havia outro truque qualquer. Foi um regresso ao passado, um passado pelo qual muitos suspiram. Passado por passado prefiro os Flintstones. 

quarta-feira, 20 de outubro de 2021

Ponta-de-lança que é e não parece e outro que parece mas não é

Sem o envolvimento emocional de um jogo contra Os Belenenses, para a Taça de Portugal, ou o Vizela, para o campeonato, o jogo de ontem para a Liga dos Campeões [Champions League, para os entendidos] presta-se a reflexão aprofundada, a abordagens mais analíticas. O Rúben Amorim tinha deixado uma ou outra pista, nomeadamente quando afirmava que a colocação de um qualquer lateral a central, como o Esgaio, conferia dinâmica diferente à equipa e ao seu jogo coletivo. Devia ter suspeitado, a relação entre categorização dos jogadores e a sua função e localização no terreno de jogo pode ser mediata, indireta. 

Contra o Besiktas, tornou-se evidente este tipo de relação e suas consequências no desenho tático da equipa. O Sporting não joga com três centrais, é um facto. Joga com dois centrais e um ponta-de-lança. Porque é que esta autêntica revolução na forma como se organiza uma equipa não se tornou visível há muito, muito mais tempo? Porque o ponta-de-lança também joga bem a central, tão bem que até parece um central. Não imaginamos o Cristiano Ronaldo a jogar no lugar do Pepe e a fazer de Cristiano Ronaldo na mesma, marcando e voltando a marcar. Nem todos os jogadores dispõem da completude de um Coates, nem todos podem ser predestinados. 

Para que esta tática apanhe de surpresa o adversário, há requisitos a cumprir. O aparente ponta-de-lança pode não ser um ponta-de-lança mas tem de parecer ou, de outra forma, um Guardiola ou um Klopp percebem o engodo e dirão para os seus botões: “com que então, o Rúben [sim, eles tratam-no com esta familiaridade] a disfarçar o ponta-de-lança de central?!” O Paulinho cumpre às mil maravilhas esse papel. Nós conhecemos um Missé-Missé, um Peter Houtman ou um Purović só pela cor ou pelo aroma, bastando para tal rodar ligeiramente o cálice enquanto com as mãos à sua volta o vamos procurando aquecer. Não somos como outros, que só sabem destrinçar um branco de um tinto, sabemos também o ano de colheita ou o sabor da Touriga Nacional, da Tinta Roriz ou de outras castas internacionais, como o Chardonnay, o Cabernet Sauvignon ou o Merlot. 

O Paulinho não é ponta-de-lança mas podia ser, como ontem teve a oportunidade de demonstrar [quem marca o golo que marcou, como quem bebe uma mini e come um prato de tremoços, podia ser]. Não, não é um nabo de um ponta-de-lança ou um nabo de um ponta-de-lança com azar, como ouvi dizer. É um jogador que faz de ponta-de-lança sem o ser porque se o fosse estava a jogar a central, como o Coates e ninguém saberia o que fazer ao Coates. Recuar tanto o ponta-de-lança levanta questões práticas quando se trata de marcar golos. Quanto mais longe se está da baliza mais tempo se demora a lá chegar. Nos primeiros momentos, quando as forças abundam, os adversários não permitem que o nosso ponta-de-lança se adiante. Pouco a pouco, vamos chegando mais e mais à frente, até aparecerem os cantos e cada um deles se transformar num “touchdown”. 

[Vamos acabar com a crónica que se faz tarde. Ganhámos quatro a um ao Besiktas e embolsámos 2,8 milhões de euros. Era preferível receber o dinheiro sem jogar, para nós e para o Besiktas. É todos os anos o mesmo: estabelece-se quem vai aos oitavos, aos quartos, às meias e à final e obrigam-se todos os outros a jogar as pré-eliminatórias e a fase de grupos como se não soubessem de nada]

quarta-feira, 6 de outubro de 2021

Futebol de várzea e gordos à baliza

Voltámos a jogar contra o Arouca, anos e anos após o nosso Presidente da altura ter sido acusado de cuspir no seu Presidente, quando apenas expeliu uma baforada que nem de fumo foi mas de vapor de água, dando origem a uma das discussões públicas mais profícuas sobre um tema que nos interessa a todos, independentemente da clubite ou sequer da longitude ou da latitude, o da transição climática ou da descarbonização. Embora sem despertar o mesmo interesse do ponto de vista da nossa organização social e da nossa vida em sociedade, também houve uma época em que o Lito Vidigal, treinador do Arouca, entrou em campo para empurrar um central do Sporting, gerando um chinfrim e um salsifré danados. Sem as baforadas de fumo ou de vapor de água ou as entradas dos seus treinadores em campo para arrear nos jogadores adversários, o Arouca é o Arouca e os jogos contra o Arouca são os jogos contra o Arouca [não confundir os jogos contra o Arouca com os jogos contra o Portimonense e, muito menos, destes com os jogos contra o Barcelona do Koeman]. 

Sem estes acontecimentos e os correspondentes penduricalhos narrativos, não se pede a ninguém para escrever uma crónica de um jogo como este, um jogo a que os brasileiros costumam designar de futebol de várzea [o equivalente à nossa Liga dos Último, programa televisivo de boa-memória]. O Rúben Amorim procurou explicar-nos o sentido, a razão para assistir ao que se assistimos, sem dar parte de fracos e admitir que a equipa não aguentava um gato pelo rabo. Não, os centrais estavam de boa saúde, ele é que teve a ideia [genial] de jogar com dois laterais no lugar de dois centrais para alterar a dinâmica da equipa, para que os laterais feitos centrais corressem atrás dos felinos atacantes do Arouca [viu-se essa capacidade do Esgaio no golo do Arouca]. Acabámos por jogar com um central e quatro laterais, dois à direita e dois à esquerda. É bizarro? Não, com esta simetria longitudinal, não. Seria de jogássemos com quatro de um lado e nenhum do outro ou três de um lado e um do outro.

Enquanto o Vinagre continuar no psiquiatra, há necessidade de meter o Nuno Santos a lateral esquerdo [ou muito me engano ou já não sai de lá] e de rearranjar o meio-campo e o ataque. O Matheus Nunes foi para o ataque, para o lugar que costuma ocupar o Nuno Santos, e entrou o Daniel Bragança para o meio campo, para o lugar do Matheus Nunes. Com quatro esquerdinos a atacar – Nuno Santos, Bragança, Sarabia e Paulinho –, parecíamos a equipa de futsal do Nuno Dias. Cerca dos quinze minutos, estes esquerdinos fizeram das suas [das deles, salvo seja] e o Matheus Nunes fez o primeiro golo. Esperava-se o segundo para acabar com o jogo [há quem diga que só depois do terceiro é que se pode descansar] mas o Sarabia é um pouco como o Paulinho: está sempre a um bocadinho pequenininho de marcar golo, sendo certo que a responsabilidade de um extremo não é a mesma da de um avançado-centro ou ponta-de-lança. 

Na segunda parte, nem entrámos mal no jogo, mas um canto a nosso favor originou uma correria como se não houvesse amanhã de um avançado do Arouca, concluída com um centro para o cabeceamento de um avançado e grande defesa do Ádan, mas, azar dos azares, a bola sobra para outro jogador do Arouca que remata à meia-volta e faz o empate [nunca tive problemas em ir a um dentista brasileiro ou a um médico espanhol no centro de saúde, mas estava longe de imaginar que a escassez de avançados levasse o Arouca a contratar um palestiniano]. As coisas estavam a ficar feias, muito feias, mas no futebol de várzea é sempre o gordo que vai à baliza e vai à baliza não por ser guarda-redes mas por ser gordo e jogar ainda pior noutra posição onde se tenha de mexer mais. Percebendo isso, os nossos esquerdinos fizeram as reviengas do costume e o Nuno Santos enfiou um remate de fora da área fazendo com que a bola tabelasse no gordo, perdão, no guarda-redes e acabasse dentro da baliza.

O Arouca queria mas não podia e nós nem queríamos nem podíamos. O Rúben Amorim ainda tentou refrescar o ataque mas o Jovane Cabral, o Tiago Tomás e o Tábata não fizeram uma jogada de jeito para amostra, tendo que entrar o Ugarte para segurar o meio-campo e evitar males maiores [como disse, não tenho problemas de nacionalidades, estranho um palestiniano, para logo entranhar um uruguaio]. Ganhámos e somámos mais três pontos, naquela lógica do jogo a jogo. O Paulo Sérgio não foi de modas e acertou com um pinheiro no Jesus [não confundir com o Pinheiro, que esse arbitrou o nosso jogo] e estamos em segundo lugar a um ponto do primeiro.