terça-feira, 29 de setembro de 2020

Ácido desoxirribonucleico

 Não gostei. Quero dizer, gostei à maneira do Rui. Ainda assim, na corda bamba entre o Leonardo Jardim e o Paulo Bento, espero sinceramente que o Rúben Amorim tenha o ADN (é assim que se diz agora não é?) do Leonardo. O que em Leonardo é (e era no Sporting) rasgo e visão centrípeta, onde gravita todo o resto, no Paulo Bento era (e deve continuar a ser) a conexão do medo com o recurso ao divino, passando pelos golos do levezinho. Embora o divino pouco ou nada possa com as arbitragens e assim se foi um campeonato perdido num golo com a mão. Posto isto, temos (ainda) alguns sonhos.

Um deles é que o Sr. Varandas vá à sua vida. Sem ressentimentos. Temo que o ADN Varandas seja mais Soares Franco e, por osmose, Paulo bento e, por osmose bem portuguesa, aquela coisa do mal o menos. As manobras de marketing/propaganda vertidas em catadupa nas últimas duas semanas, com homenagens ad hoc a figuraras do Sporting, imortalizadas como nomes de campos e por aí fora, deixaram-nos enternecidos, principalmente aquela do Futre, um tipo que saiu do Sporting alegando problemas psicológicos, algo de que ainda parece padecer. As manobras tinham o objectivo mais ou menos oculto de todas as manobras, isto é, conduzir os olhares, desviando-os do ponto principal: a assembleia geral do dia 26 de Setembro. O recurso a Tabata no último dia revelou-se infrutífero. Os resultados estão à vista. O ADN do Sporting também.

domingo, 27 de setembro de 2020

Gostei

Esta época, vi pela primeira vez um jogo do Sporting como deve ser visto, com atenção. Gostei do que vi, mas gostar é mais não gostar do que gostar. Não sei se me consigo fazer explicar. Como qualquer sportinguista, há um dos cinco violinos em mim que espera sempre nota artística. Esse violino é o contrário do grilo falante. É o que nos engana, o que nos faz acreditar no Bobby Robson ou no Mirko Jozić. O verdadeiro grito falante, aquele que nos diz o que nem sempre queremos ouvir e nos dá bons conselhos, é o Paulo Bento ou, nos seus melhores dias, o Leonardo Jardim. Diz-nos coisas simples: não sofrer golos dê por onde der; treinar, treinar muito as bolas paradas e apostar em centrais altos; na dúvida, a saída de bola deve ser fazê-la sair seja para onde for, incluindo do campo ou do estádio. Estes conselhos foram seguidos à risca através de princípios de jogo cumpridos ao milímetro 

Primeiro princípio de jogo cumprido: anular o adversário seja como for até o levar à desesperança, à desistência, à rendição pura e simples. O Paços de Ferreira não teve uma oportunidade de golo para amostra e nem sequer acertou na nossa baliza. A meio da segunda parte os únicos que ainda acreditavam no Paço de Ferreira eram os comentadores da SportTV [até tu, Tonel?]. 

Segundo princípio de jogo cumprido: os jogos no futebol português não se ganham como na “playstation”. Viu-se trabalho tático nas bolas paradas, como agora se costuma dizer. Um dos cantos acabou em “penalty” e no primeiro golo; outro concluiu-se com o segundo, após jogada entre os nossos dois centrais calmeirões, Coates e Feddal, que não desistiram enquanto não conseguiram o “touchdown” [gosto da cara deste rapaz Feddal, faz-me lembrar a do Naybet, sempre com um ar de quem joga de alfange nos calções] 

Terceiro princípio de jogo cumprido: o que importa é ganhar e, ganhando, o resultado de pouco ou nada serve. Se estás a ganhar, então não precisas de marcar mais nenhum golo e se, porventura, o marcares, não precisas de marcar outro e assim sucessivamente. Todas as táticas são válidas depois de estares a ganhar. Atrasa a bola, passa-a para o lado, garante que não a perdes ou se a perdes, perde-a longe da tua baliza. 

Quarto princípio de jogo cumprido: acabar o jogo com seis amarelos em doze faltas [um amarelo por cada duas faltas] contra dois amarelos em dezoito faltas [um amarelo por cada nove faltas] sem tentar um mata-leão no árbitro. Como o cão é o melhor amigo do homem, assim o árbitro é o melhor amigo da equipa adversária. Os conceitos de calcadela, empurrão, pontapé ou entrada variam com as cores das camisolas e é preciso aguentar com cara alegre. 

Precisamos de nos ver livres do Neto. É bom rapaz, amigo do seu amigo, deve fazer bom balneário; na época passada, disse umas coisas acertadas em nossa defesa enquanto a direção estava em parte incerta, mas não dá, não combina com a nossa linha de “safeties” ou “defensive backs”. Diz-se que queremos contratar o Lyanco, do Torino, um rapaz de quase um metro e noventa e cara de poucos amigos. Com este e com um avançado do campeonato italiano em idade de reforma, um Fabio Quagliarella ou um Goran Pandev, e tínhamos equipa para cumprir estes princípios jogo atrás de jogo. Posso estar enganado, mas estamos de regresso aos bons e velhos tempos do Paulo Bento. Não vai ser fácil ganhar mas será ainda mais difícil ganhar-nos. O Sérgio Conceição leva dois títulos em três campeonatos assim [sim, eu sei, não sou ingénuo, os nossos árbitros não são os mesmos que arbitram os jogos do Porto]. 

sexta-feira, 25 de setembro de 2020

Máscaras ou comprimidos?

De quantas pré-épocas mais precisa o Sporting para começar a jogar a sério? Tantas quantas as vidas de um gato? Não chega de jogos-treinos? Era necessário jogar com este PAOK de “kilt” também? Não cheguei a esclarecer estas dúvidas porque recebi umas das habituais mensagens de “WhatsApp”: “Hoje temos de ver o jogo com máscara ou basta-nos pôr um comprimido de baixo da língua depois dos setenta minutos?” Esta dúvida mais ontológica absorveu-me o tempo todo. A consciência do ser ou não ser deixa-nos sempre com dores de cabeça.

O Tiago Tomás marcou no início do jogo e o jogo acabou. Sim, houve bola para cá a para lá, houve jogadores a correr para a frente e para trás, mas jogo não foi com certeza. Ou estamos a ficar cínicos ou outra coisa qualquer e valia a pena os treinadores e os jogadores verem o seu próprio jogo para nos informarem se há razões para ficarmos preocupados. Não, não estou apreensivo, estou preparado para tudo. Preciso é que me digam se devo ver o próximo jogo de máscara ou se basta pôr um comprimido de baixo da língua depois dos setenta minutos. 

sexta-feira, 18 de setembro de 2020

Apalpar melões

Na terça-feira jantava com amigos. Saio do trabalho ao fim da tarde e ouço o final do relato da primeira parte do Benfica contra o PAOK, enquanto me desloco até casa. Quem ouvisse pensava que o Benfica estava a jogar contra o Cascalheira de Baixo para a taça do presunto local. “O Jorge Jesus melhorou o jogo posicional”. “O Jorge Jesus é hoje melhor treinador do que era (se tal ainda é possível, digo eu)”. “O Jorge Jesus regressou para afirmar a dimensão europeia do Benfica”. Estava zero a zero ao intervalo mas a segunda parte serviria para cumprir o destino que estava escrito à partida. 

Esperando pelo jantar, beberico um Martini com os amigos e pelo canto do olho vejo num ecrã de televisão festejos de uns jogadores com camisolas às listas pretas e brancas. Recebo uma primeira mensagem de WhatsApp: “Depois do Novo Banco, só nos faltava o buraco na defesa do Benfica também”. Um pouco mais tarde recebo outra: “Vai ser preciso financiar o Cebolinha, o Pedrinho, o Darwin, o Vertonghen e o Waldschmidt pelo Mecanismo de Recuperação e Resiliência da União Europeia”. 

Regresso a casa tarde e a más horas. Não tenho sono. Não resisto à tentação de rever os comentários desportivos. É como ir ao supermercado escolher melões. Fico-me pela SIC Notícias. Ouço a conferência de imprensa final do Jorge Jesus. Queixava-se (e bem) das regras da Liga dos Campões. O objetivo era passar a fase de grupos (que seria “peanuts”) e, de eliminatória em eliminatória, chegar à final. Não fazia qualquer sentido começar da frente para trás, disputar uma competição de pernas para o ar, começando por jogar a final. A equipa ainda não estava preparada para tanto. Faltava um avançado. Imaginei que fosse o Cavani. Aparentemente não. O Benfica acabara de gastar cerca de 50 milhões de euros com o avançado do PAOK, um tal de Zivkovic (bom pé esquerdo o deste rapaz!). 

Os melões estavam maduros. O Joaquim Rita estava um belíssimo Casca de Carvalho, com o picante no ponto, malhando no Jorge Jesus. O David Borges estava mais Melão de Almeirim, mais doce, falando de injustiças. Deito-me e adormeço, não sem antes ler mais um pouco de “Uma História de Espanha”, de Artur Pérez-Reverte. Às páginas tantas, o autor interroga-se por que razão Filipe II não transferiu a capital para Lisboa, mantendo-se entrincheirado no centro da península, no seu mosteiro-residência do Escorial. Não sei se seria a sorte dos espanhóis, mas seria a dos nossos comentadores seguramente. As narrativas seriam as mesmas, mas sempre teriam um Real Madrid ou um Barcelona para as legitimar.

Milagres da casa não fazem santos

 

1)               1) Mais uma moedinha, mais uma voltinha:

Lembram-se certamente de Thierry Correia? Terá sido, no meu modesto entendimento, a transferência mais sensacional do consulado Varandas, vendido por mais de 12 milhões de euros ao Valência (tinha de ser), após meia dúzia de minutos (e alguns segundos) grandiosos a virar frangos ao serviço do Sporting.

João (Ronaldo) Félix, vendido em ajuste directo (quanto?) ao Atlético de Madrid, com contrapartidas ainda insondáveis (a vinda do mágico RDT ainda nos assalta em sonhos), apenas visíveis ao microscópio eletrónico de transmissão (MET), obra de visionários japoneses.

Fábia Silva, vendido enquanto penteava o seu famoso risco ao meio, cumprindo assim um sonho de menino (temos informação fidedigna nesse sentido) de jogar nos Wolves, uma equipa albergue de guerreiros lusitanos com tendências trânsfugas. As comissões (declaradas) afiguram-se um verdadeiro tratado de gestão internacional de activos (e passivos, já agora).

São inúmeras as deslocações de capital em forma de jogadores, quero dizer, de activos, grande parte delas praticamente desconhecidas e com vista apenas para o banco e a bancada. E assim continua.

2)               2) Menos uma moedinha, menos uma voltinha:

Mudam-se os tempos, mantêm-se as vontades. As receitas diminuem a olhos vistos: bilheteira, publicidade, merchandising, patrocinadores, as televisões a puxarem a brasa à sua sardinha, o futebol sem o glamour do público. Tudo isto põe a nu as fragilidades crónicas do nosso (e não só) futebol e da sua tão propalada indústria, que mais se assemelha a um fogo-fátuo. A metamorfose dos clubes em entrepostos (em curso) de jogadores e a sua submissão ao poder dos intermediários e dos “investidores” será cada vez mais o quotidiano de um jogo cuja bola a nossa memória já não alcança.

3)               3) Menina não paga, mas também não anda:

O Sporting continua o seu trajecto rumo à modernidade e à irrelevância. O silêncio (extremamente ruidoso) que paira em Alvalade não augura nada de bom. Começar a época com um jogo adiado (alguém percebe quais são as regras disto tudo?), numa temporada com vista para a liga dos calmeirões, necessita apenas de mais uma cereja em cima do bolo: vender o único ponta-de-lança no último minuto do último dia de mercado.

Parece que a Assembleia Geral seguirá o modelo das Assembleias Gerais Eleitorais, ou seja, terá lugar apenas a votação, sem que haja lugar a discussão prévia. O silêncio extremamente ruidoso poderá um dia desaguar (como diria Bohumil Hrabal), numa solidão demasiado ruidosa, ou ruinosa. Tentar remeter-nos ao silêncio é um erro. Fatal?

 

 

quarta-feira, 9 de setembro de 2020

Mais é mais e não menos

Anda-se a jogar um género de campeonato de jogos-treino de seleções. Nesse campeonato do Mundo e da Europa, em particular, após o jogo contra a Croácia, afirmava-se que a seleção nacional era mais do que o Cristiano Ronaldo. Contra a Suécia, ontem, tive a oportunidade de o confirmar. Vi o Cristiano Ronaldo e vi mais uns tantos: mais dez pelas minhas contas. Sim, é verdade, a seleção nacional é mais do que o Cristiano Ronaldo enquanto o Cristiano Ronaldo estiver na seleção nacional. 


[No primeiro golo, o António Tadeia concluiu que o remate do Cristiano Ronaldo não tinha sido nem especialmente bem colocado nem especialmente forte. Foi evidente o seu desfastio na marcação desse golo e do seguinte. Imagino-o a falar consigo próprio: “Vou só por a bola lá dentro e mais nada: nem com especial precisão, nem com especial força. Quando até o Félix marca um golo, isto passou a ser para qualquer um e não dá pica nenhuma!”]. 

domingo, 6 de setembro de 2020

Jogar à defeso com toda a confiança


Enquanto o novo Cavani nos faz esquecer Cavani, sem que para isso necessite de dar um chuto na bola, a sua palavra basta, assegurando que vem para fazer história; Ricardo Quaresma viaja entre o Bessa e o Castelo, com passagem pelo Algarve numa peladinha de praia. A nós, que ninguém nos ouve, parece-nos (sem grande margem para erro) que o cigano poderia contribuir com uns vinte minutos finais em alguns jogos de paredão alto, mais não fosse para chatear o Ventura.

O Porto, com fair play (financeiro?), lá vai comprando alguns jogadores enquanto aguarda umas benesses do santo Mendes. As coisas com o Valência não corriam, mas o carrocel é dinâmico: a venda de Fábio Silva ao Wolverhampton por 40 milhões de euros (diz que sim) é uma prova da irmandade do fair play financeiro da UEFA, cuja religiosidade se alicerça no santo Mendes, entre outros beatos. Ámen.

Acuña continua a dar cartas nos treinos à porta fechada. O seu recolhimento é-nos demonstrado nas redes sociais (e em algumas mais subterrâneas), demonstrando que a estratégia é absolutamente inovadora: não tarda é integrado como o Palhinha, ficando os últimos dias da época de transferências guardados para nosso divertimento e futuras mutilações.  

Amorim continua a treinar o Sporting apesar de questões de IVA, juros e outras minudências. Há quem diga que está tudo acordado desde o início. Outros afirmam, com alguma propriedade, que anda tudo a dormir desde sempre.  

sexta-feira, 4 de setembro de 2020

Jogar à defeso com transições rápidas


A frase de um amigo com uma atitude excepcional perante a vida: queres ver que ainda vamos ter de vender o Sporar e o Jovane no último dia de mercado. O desabafo que soa a interrogação metafísica transporta-nos para o limbo de uma realidade recente. Percebemos a sua inquietude, talvez enraizada no vislumbre de mais uma golpada estratégica com o refundir de Palhinha e Acuña a treinarem à parte, para melhor serem empacotados no paquete de sonhos de milhões. Palhinha já terá sido (mais ou menos) incorporado, enquanto Acuña aguarda a incorporação forçada, uma ilusão que encerra a estratégia no domínio das equações abstratas, algo que a arte contemporânea bem conhece.

Não veio Cavani, veio o novo Cavani. Engenhoso. Os milhões do novo Cavani, o facto de este também ser uruguaio e avançado (como aqui avançamos em primeira mão), um trabalho esforçadíssimo da estrutura benfiquista e da imprensa de sucedâneos de papel, demonstra a versatilidade engenhosa destes visionários do futebol a caminho da liga dos calmeirões. Está provado. 

O Pote é que foi caro. Embora eles não saibam que se encontra lá no fim do arco-íris, repleto de tesouros. Será que um dia também terá o seu momento zen de treinar à parte, entre vinhas e pomares de fruta? Não sabemos.

quarta-feira, 2 de setembro de 2020

O sonhador e o realista

 Depois de várias semanas de pré-pré época e de umas mini-férias, a pré-época 'oficial' do Sporting decorre a bom ritmo, já com um par de jogos à porta aberta para nos permitir imaginar o que aí vem. 

Assim, já é possível comparar a imaginação do Sportinguista optimista e a do Sportinguista pessimista.

O Sportinguista optimista olha para o plantel e imagina Max, Nuno Mendes, Wendel, Pedro Gonçalves ou Jovane a fazer uma grande época, bem apoiados por Eduardo Quaresma, Bragança ou até Tiago Tomás. Quer acreditar que Porro e Feddal não são novas versões do Bolasie, Rosier, Jesé ou Eduardo e que talvez acabem por não conseguir vender o Acunã ou o Palhinha. É um sonhador.

O Sportinguista pessimista vê uma equipa com demasiados jogadores jovens, com vários jogadores que já mostraram o que não valem, orientados por um treinador inexperiente e sem qualificações para o cargo, liderados por uma direção composta por jovens aprendizes que a única vez que prepararam uma época desportiva conseguiram o pior desempenho de sempre da história do clube. Será um realista ?