segunda-feira, 27 de julho de 2020

Já acabou?


Voltamos à casa da partida. Planeamento, trabalho invisível, inclusive, a existência de planos de acção, tudo se esboroou por entre os dedos como areia fina da praia da Claridade (quanto não está muito vento). Tudo perdido por obra de um inexplicável acaso, de uma perseguição inabalável (sempre inimigos internos, entenda-se), de problemas oftalmológicos graves (que não permitem ver o trabalho invisível), de oscilações do mercado absolutamente imprevisíveis, da falta de palavra do Jesé que terá afirmado ser o mesmo que há uns anos jogava futebol no Madrid. Em suma, do Covid -19. O que rima funestamente com a nossa ausência de títulos-19 (campeonatos, leia-se).

Ora, vamos a factos para que se possam esgrimir argumentos e alimentar polémicas desnecessárias:

Logo a despropósito, o Sporting fica fora do pódio, pela primeira vez, desde aquela magnifica época, igualmente dotada de um planeamento genial de Godinho Lopes: estávamos então em 2012 e ficamos num razoável sétimo lugar, fora das competições europeias. Mas sem Covid, dirão alguns, sempre atentos, amigos do embaraço.

Derrotas em todos os clássicos (não, meus amigos, com o Belenenses já não conta), uma, duas, três, quatro derrotas (sem contar com a supertaça, já lá vamos). Coisa nada vulgar, ora investiguem lá, por favor, para ver quantas vezes aconteceu.

Dezassete derrotas numa época é obra. É recorde. Dos nossos. Cerca de 52% de vitórias, é obra. Está à vista. Ali pertinho do meio-meio, dos cinquenta por cento, pertinho de equipas como o Fama e o Rio-Ave, elas também parte do carrocel do Mendes.

(JÁ AGORA, QUANTOS TREINADORES COM O PERFIL DESEJADO FIZERAM PARTE DO PROJECTO?)

Eliminados da taça pelo poderoso Alverca (equipa do terceiro escalão), fizemos jus ao lema: aconteceu taça. Olhe que não, olhe que não. Não é assim tão vulgar uma equipa candidata ao título (a sério?), ser eliminada da taça por uma equipa do terceiro escalão. Ora, pesquisem lá, por favor. 

Acrescentando os cinco que levamos no corpo na final da supertaça contra o segundo classificado da liga (resultado volumoso, mas seguindo uma tradição recente de bombos da festa), o restante foi globalmente positivo. Não acham?

Adiantar o IVA ao Braga

A crónica de um jogo é sempre uma narrativa. Não deixa de ser uma reconstrução que tem como objetivo legitimar o resultado final, que encerra os factos, todos os factos. As coisas não são como são. Obedecem sempre a uma lógica que as determina e lhes dá sentido. A sorte ou o azar têm detalhe técnico [nem que seja o da famosa eficácia], não são sorte ou azar, ponto. A crónica só precisa assim do resultado final e de plausibilidade. 

Perdemos por dois a um contra o Benfica e ficámos em quarto lugar no campeonato. Estes são os resultados e, por isso, os factos, todos os factos. Como se sabe, o Sporting ferrou o cão ao Braga. Mas há ferrar o cão e ferrar o cão. Há formas de ferrar o cão que são contra os Direitos Humanos. O pagamento do IVA ou do Imposto sobre o Valor Acrescentado ao Estado é da responsabilidade do vendedor, a partir do momento que se dá o movimento económica mas não, necessariamente, o financeiro, isto é, a partir da faturação. Como se verifica, o resultado de ontem serviu para adiantar o IVA ao Braga. 

Dantes, estes assuntos eram tratados por departamentos especializados dos clubes ou por empresas de contabilidade. Como se costuma dizer, hoje o futebol é uma indústria e estes movimentos passaram a ser intermediados por profissionais muito qualificados que trabalham em empresas de gestão de carreiras. Os movimentos são sobretudo em espécie: hoje um resultado, amanhã a transferência de uma jovem promessa, depois um encontro de contas. 

Tinha visto vários jogos na Benfica TV, mas nunca tinha ouvido, os narradores e os comentadores. Imagino que as transmissões da Pyongyang TV sejam do mesmo género. Ouvir referência ao Jorge Jesus durante a transmissão constituiu o momento "Big Brother is watching you". O Benfica, enquanto clube, e os benfiquistas, enquanto adeptos, estão transformados no benfiquismo, um fanatismo, uma ideologia com bigodes. 

Em condições normais, acabada a época, seria necessário pensar o futuro. Nos tempos que correm, lê-se a "Visão Estratégica" de António Costa Silva. Parafraseando, o objetivo é transformar o Sporting numa potência média de “soft power”, ligando a diplomacia na Liga e na FPF, as missões de solidariedade com o Tondela, o Setúbal ou o Aves, a tecnologia do vídeo-árbitro e a necessidade de combater o antijogo, para abrir caminho à criação de plataformas colaborativas no âmbito da UEFA e da FIFA. No passado, pensaríamos que a contratação de um defesa central para emparelhar com o Coates, de um defesa direito parecido com um defesa direito e de um avançado que marcasse golos resolveria o nosso problema. Eram outros tempos, tempos de amadores.

quarta-feira, 22 de julho de 2020

Será que Jesus já regressou?

Ontem de manhã, enquanto tomava café, assisti a uma reportagem da CMTV a partir Aeroporto de Lisboa, da Portela ou Humberto Delgado, conforme os gostos e feitos. Uma repórter [é assim que se diz, não é?] informava-nos que Jesus estava de regresso, havendo dúvida se se encontrava ainda sobre o Oceano Atlântico ou se, entretanto, tinha atingido a costa do continente africano. 

“Será que Jesus já regressou?”; esta dúvida assolou-me de quando em vez o pensamento durante o resto do dia. 

O Sporting jogava contra o Setúbal. Vi entrar em campo os nossos jogadores acompanhados de onze separadores de autoestrada, em betão. Iniciado o jogo, ou a bola ou os nossos jogadores iam embatendo nos referidos separadores. Nem a bola nem os jogadores os ultrapassavam, embora tombassem sempre que a bola neles embatia ou os jogadores neles tropeçavam. Cada vez que tombavam, entrava a assistência rodoviária da Brisa para os voltar a pôr de pé. Ao intervalo, a equipa do Sporting dispunha de mais de 70% de tempo de posse de bola, concluindo-se, assim, que sempre que a bola saía do campo o tempo de (não) jogo contava para os separadores. 

“Será que Jesus já regressou?”; voltava-me ao pensamento enquanto esperava pela segunda parte. 

Os separadores de autoestrada voltaram e permanceram muito arrumadinhos a cumprir a sua função de separar. E assim se continuou o resto do tempo: de um lado, a baliza, do outro, a bola e os jogadores do Sporting. A bola continuou a embater nos separadores e os jogadores também. Os separadores continuaram a tombar, continuando a entrar também a assistência rodoviária da Brisa para os pôr de pé. Um ou outro separador foi ficando lascado de tanto tombo, sendo necessário substituí-lo, chegando a entrar um separador muito forte [na área da resistência dos materiais também se pode utilizar a expressão "gordo"?], um superseparador ou um separador em betão pré-esforçado, em linguagem técnica. No final, a equipa do Sporting dispôs de mais de 70% de posse de bola, contando como tempo de (não) jogo dos separadores as saídas de bola do campo. O jogo concluiu-se empatado, demonstrando-se a superior qualidade de construção dos separadores, apesar dos problemas de dimensionamento, com um centro de gravidade demasiado distante do chão, gerando problemas permanentes de estabilidade estática.  

Será que Jesus já regressou?

domingo, 19 de julho de 2020

Play it again Sam (II)


Sobre o trabalho invisível, já agora: 

Compras à patrão: Ilori (não para de nos esbofetear), Eduardo Henrique, Borja, V. Rosier e Doumbia (O Neto veio capitanear à borla);

Empréstimos bem enjorcados: Jesé, Bolasie e Fernando (risos);

Em banho-maria a ver se pega (até quando?): Phellype, Vietto (por um fio não se encontra nas compras à patrão), Camacho, Sporar (apesar de tudo) e Plata merecem a nossa paciência.

Potenciais reforços:

Antonio Adán: Quem? Deixa lá ver… um suplente profissional? Deve ser engano. Ou saldo.

Feddal: apesar do bom trabalho de alguns (recém criados) organismos de propaganda afectos à direcção (e da elogiosa opinião de Naybet que a estende a Taarabt – e ficamos conversados), na projecção da sua imagem como defesa central com um pé esquerdo único (esperemos que não seja literal), acreditamos que o seu potencial de Paulinho Santos da zaga se encaixaria melhor numa equipa em que sejam proibidas as expulsões, jogando, por exemplo, ao lado do Rúben Dias, ou como o novo cantinflas do Dragão. São mais as vezes que Feddal está lesionado ou de fora por castigo que as que joga.

Porro: se chega por empréstimo sem opção de compra é uma barriga de aluguer sem qualquer risco (bem pensado?): se jogar não fica e se não jogar não fica. Para um clube que quer ser campeão não está mal. O melhor é fumar outras coisas.

Parece que estão mais dois ou três reforços na panela de pressão das vendas e do mercado. Vamos andar na corda invisível até que rebente. É pena os putos…e o Sporting, já agora. 


sábado, 18 de julho de 2020

Play it again Sam


Catastroficamente, o ano não tem sido nada mau. Não fosse o covide tínhamos o 4º lugar garantido. Assim andamos na recta da meta a lutar pelo 3º lugar às costas dos putos. Um enfado. O planeamento foi quase perfeito, as contratações cirúrgicas, tão cirúrgicas que nunca as vimos. Dezasseis derrotas, quatro (ou cinco?) treinadores, não é nada de preocupante comparado com o trabalho desenvolvido de forma invisível, cujos resultados, de uma visibilidade inexistente, são frutos colhidos apenas ao olho nu do pensamento. O sonho mantém-se inabalável: a nova época já está em curso nesta recta final da pré-época, em verdade o seu planeamento virá da época anterior, fazendo parte de uma estratégia mais vasta pata ludibriar os nossos adversários ao mesmo tempo que se ludibria a si mesma. Ao alcance apenas de alguns eleitos. Temos fé, mas menos sócios.

Jesus vem a caminho da luz. Vieira viu a dita. Finalmente tudo faz sentido.

quinta-feira, 16 de julho de 2020

O que é que é isto?!

Ontem, estive no Porto. Parecia Braga. Temperaturas elevadas, muito acima dos trinta graus. Regresso a casa por volta das 19.00h e ainda estavam trinta e quatro graus. À noite, vejo o jogo contra o Porto numa esplanada, continuando a temperatura acima dos trinta graus. O estádio estava sem público, despido, e uns tantos miúdos e outros tantos graúdos jogavam à bola. O esforço não era muito, sempre que envolvia a bola. Mas havia coreografia, muita coreografia, destacando-se Luis Díaz, jogador colombiano do Porto. O árbitro avaliava com nota artística elevada uma e outra das suas interpretações. Esperava que também fizesse o truque de magia habitual de serrar ao meio uma mulher metida num caixão, mantendo-se as perninhas a dar a dar. 

Esperava-se também que, ao intervalo, se negociasse o zero e zero e não voltasse nenhuma das equipas ou só voltasse o árbitro e o Seiva Trupe. Estranhamente, regressaram todos. O jogo continuava sem grande vontade. De repente, o Porto marcou um golo. Não compreendi. Na minha cabeça formava-se uma interrogação, uma perplexidade: “O que é que pretende o Porto assim a marcar golos?”. O Sporting estava a meter miúdos para os treinar e corriam o risco de num qualquer bambúrrio ainda levarem um golo de um ganapo da idade do meu sobrinho. E o Porto marcou outro golo. Na minha cabeça as interrogações adensavam-se: “Qual é o interesse disto, de andar a marcar golos? O que é que o Porto pretende com isto?”. 

Acabado o jogo, os jogadores do Porto desataram a festejar como se não houvesse amanhã. Não, não se compreendia. Marcam-se peladas e treinos para isto? Se fosse comigo, não jogávamos mais com eles. Depois começo a ver imagens de pessoas e pessoas nos Aliados e ao pé do estádio, na zona de Campanhã. Havia uma festa e ninguém nos disse nada? Pensando na pandemia e na necessidade de distanciamento social, finalmente compreendi: estava prevista uma manifestação pró-Bolsonaro, para contestar o Senado, o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Será que não se pode fazer um “impeachment” e acabar com isto?

segunda-feira, 13 de julho de 2020

Paulo Bento e Rúben Amorim e a geometria de Tex Winter e Phil Jackson

Jogávamos contra o Santa Clara que tinha enfiado quatro batatas ao Benfica de Bruno Lage, essa equipa enorme, tão grande quanto as maiores e, seguramente, demasiado grande para o futebol português, segundo Rui Santos. Uma equipa destas, com um ataque que passara como cão por vinha vindimada por galácticos como um Almeida, um Dias, um Ferro, um Grimaldo ou um Weigl, deixaria a ver navios pobres coitados como um Ristovski, um Quaresma, um Coates, um Acuña ou um Mendes. Respondemos a este desafio com uns violentos sessenta e sete por cento de posse de bola que nos valeram uns não menos violentos sessenta e sete por cento de cartões amarelos [o primeiro desses amarelos devia ter sido vermelho tal a violência do pisão na bola do Doumbia, mas ainda bem que o árbitro não interpretou assim porque não viu a bola queixar-se]. 

Nos jogos contra o Tondela e o Moreirense ficámos a conhecer a regra que permite agarrar o Coates sempre que ele pretende cabecear. Neste, ficámos a conhecer a regra que não permite que ele não se deixe agarrar. Temos assim os cantos e outras bolas paradas do ataque do Sporting transformadas no jogo da apanhada do Coates sem que o Coates possa fugir. Não compreendo o interesse de assim se jogar à apanhada se aquele que se pretende apanhar tem de ser sempre apanhado dê por onde der. Também não foi marcado mais um “penalty” a nosso favor, por falta sobre o Plata. No último jogo, contra o Moreirense, ficámos a conhecer a regra que permite dar dois “penalties” de avanço ao nosso adversário e, por isso, mais legítimo se torna só dar um, como foi o caso deste último jogo. 

Os árbitros têm-nos disponibilizado uma paleta (de combinações) de decisões que nos permite refletir sobre a perspetiva ontológica do sportinguismo. Preferimos ser roubados em dois “penalties” ou num “penalty” e num golo mal anulado? Preferimos ser roubados pelo árbitro e pelo vídeo-árbitro em conjunto ou por um só deles? A resposta a estas questões definir-nos-á sobre o ser do Sporting de todos e de cada um. Estas arbitragens têm-nos interpelado a uma reflexão sobre o nosso sentido coletivo mais profundo que, de outra forma, não se realizaria, perdida na espuma dos dias. 

O jogo, aquela coisa que envolve a bola e os jogadores, foi um aborrecimento de todo o tamanho. Salvou-se o espetacular golo do Jovane Cabral, depois de excelente movimento e melhor centro largo do Wendell ao segundo poste, e a entrada do Diogo Salomão para a equipa do Santa Clara na segunda parte. Por momentos, pensei que estava a ver a RTP Memória e vieram-me à cabeça nomes que constituem o nosso “Hall of Fame” dos anos oitenta e noventa, como Uchoa, Bukovac, Kikas, Hamilton, Bela Katzirz, Jason, Roger Wilde, Kaloga, Diallo, Fernando Cruz, Saucedo, Duílio, Forbes, McDonald, Peter Houtman, Rodolfo Rodriguez, Eskilsson, Ali Hassan, Miguel, Carlton Banze, Maside, Portela, Valtinho, Edel, Bozinowski, Guentchev, Tó-Zé, Barny, Carlos Jorge, Lemajic, Costinha, Luís Vasco, Afonso Martins, Mauro Soares, Ouattara, Skuhravy, Gil Baiano, Balajic, César Ramirez, Missé-Missé, Nenê, Didier Lang, Renato, Leão, Giménez, Ivo Damas, Kmet ou Krpan. Será que algum destes tinha lugar na nossa atual equipa? Talvez haja razões para a esperança. 

Palavra puxa palavra e uma ideia arrasta outra. “The Last Dance”, recente série da Netflix sobre carreira de Michael Jordan e dos Chicago Bulls nos anos noventa, deu-nos a conhecer Tex Winter, treinador-assistente de Phil Jackson, e o seu triângulo ofensivo. Entre 1989 e 2010, esta tática permitiu vencer onze títulos da NBA, seis pelos Chigaco Bulls e cinco pelos Los Angeles Lakers. Fascinam-me estas táticas que apelam a figuras geométricas, como, no futebol, o 4x4x2 losango do Paulo Bento ou, mais recentemente, o 5x2x3 pentágono do Rúben Amorim. O losango e o pentágono podem ser descompostos em múltiplos triângulos. 

O Paulo Bento fez milagres, dispondo da nossa formação, de um Caneira aqui e ali e de um ou outro estropiado de guerra, como o Romagnoli ou o Derley. Dispunha também do nosso Michael Jordan ou Kobe Bryant: Liedson, o insustentável levezinho. O Sporting era uma equipa chata, muito chata para qualquer adversário. Era difícil derrotá-la e vencia de goleada por um a zero, jogo após jogo. Em pleno Apito Dourado, o Paulo Bento manteve-nos a esperança durante quatro épocas. O Rúben Amorim parece pretender o mesmo: uma equipa que muito raramente se encontra descomepensada a defender e difícil de derrotar. Falta o insustentável levezinho. Por agora temos o Jovane Cabral. Repetindo: talvez haja razões para a esperança, mas será que chega?

sexta-feira, 10 de julho de 2020

Acerca da pré-época do Sporting

Por via das limitações a viagens impostas pela pandemia de COVID-19, temos observado uma pré-época atípica. Ainda assim, não sei se por mérito do treinador, da gestão do futebol ou se por pura sorte, parece-me ser a mais bem planeada pré-época dos últimos anos.

Ao invés de viajar milhares de quilómetros até uma Suíça qualquer para jogar com uns nabos da 3a divisão local e receber banhos de multidão, optámos por uma versão mais barata, em que continuamos a jogar com (sobretudo) nabos, mas a pouca distância de casa e em estádios com muitas cadeiras vazias. Ao jogarmos com equipas treinadas por Pepas, Petits e afins, podemos afinar a nossa estratégia para lidar com a realidade do campeonato Português, ou seja, muita paulada, anti-jogo com fartura e autocarros de jogadores nos 30 metros em frente à sua baliza.

Sinto que esta abordagem vem permitir aos jovens estar mais preparados para o que aí vem, e perceber quais os mais velhos com os quais não vale a pena contar. Também se nota trabalho nas bolas paradas, que devem decidir uns 95% dos jogos aqui no campeonato cá do burgo.

Qual cereja no topo do bolo ainda se vai testando a resposta da equipa aos "contratempos" com as arbitragens. Quase parece a sério. Não fosse um espectador mais atento notar as 5 substituições por jogo e poderia pensar que as arbitragens eram de jogos mesmo a contar para o campeonato.

Até ao momento as coisas têm corrido bem. Depois de um empate em Guimarães, que acaba por ter a desculpa de ter sido no primeiro jogo da pré-época, foi sempre a ganhar, tendo apenas cedido um empate contra o Tiago Martins. Pelo caminho tem dado para ver muitos jogadores jovens, restando apenas saber qual deles vai ser o primeiro a ignorar as juras de amor que agora vai fazendo para trocar o Sporting por um clube qualquer do campeonato Grego ou que jogue para o meio da tabela de Espanha, França ou Inglaterra. Também se vai percebendo que existem uns quantos jogadores do Sporting que nem lugar no Belenenses de Lisboa tinham (quanto mais na SAD de Oeiras) .

Posto mais de um mês disto, estamos prontos. Vamos fechar em beleza fazendo uma festa de campeonato a um qualquer clube do Norte, e a festa de despedida do treinador de um clube de um bairro de Lisboa (ou a festa de boas vindas do treinador que não teve a devida festa de despedida - ou melhor teve uma despedida em tribunal). Faz sentido. Tanto se fala de pacificar o futebol Português, nada como alinhar nas festas dos rivais, desde que mantendo o distanciamento, claro está. E sempre com máscara, não vá alguém pensar que o Carnaval do nosso futebol é a sério.

terça-feira, 7 de julho de 2020

Quim Barreiros e terceira república

Preparo-me para ver jogar o Sporting contra o Moreirense. Em Braga, às nove e um quarto da noite, estão mais de trinta graus. Procuro saber a temperatura em Moreira de Cónegos, aqui ao lado. Estão também mais de trinta graus [e não, nesta altura do dia ou da noite, não há sombra que valha aos jogadores!]. Não sei quem marca estes jogos para estas horas de segunda-feira e não para o horário tradicional de domingo ao princípio da tarde, pela fresquinha. Não deve ser ninguém que tenha lido “Portugal, o Mediterrâneo e o Atlântico”, de Orlando Ribeiro. Se é para continuar a jogar futebol durante este mês e no próximo, então os jogos deveriam ser todos marcados para a Apúlia, Ofir, Moledo, Vila Praia de Âncora ou Mindelo, aproveitando a influência atlântica e a não menos famosa nortada, desde que cada jogador esteja protegido pelo seu tapa-vento. 

Entretanto vi o jogo. 

A rapaziada estava há muito confinada e por isso [ou por outra razão qualquer, não interessa, nunca interessa] acabaria por desconfinar e iniciar-se-ia a ramboia do costume. No domingo, na habitual conferência de imprensa, o Amorim afirmou o seguinte: “Um dia perderemos, mas esse dia ainda não é na próxima semana”. Se repetida, semana após semana, esta afirmação encerra um paradoxo. Mas para se tratar de um paradoxo implica considerar desconhecido o futuro. Se assim não for, o que o Amorim nos afirmou é que simplesmente conhece os resultados antes dos jogos se realizarem [e sabia que hoje não perderíamos, mas que também não ganharíamos ou, de outra forma, está nesta altura a cortar os pulsos]. 

Mesmo na pré-época, os jogos do Sporting são verdadeiramente picarescos [ver a claque do Moreirense apinhada num género de varanda de um prédio que sobreleva o estádio foi um desses momentos picarescos]. Desde o treinador aos jogadores adversários, aos bandeirinhas, ao árbitro, ao vídeo-árbitro e aos comentadores da televisão, participam em exclusivo personagens patuscas, burlescas. Fossem realizados durante o salazarismo e o António Ferro tinha-se borrifado no Galo de Barcelos e nos ranchos folclóricos e transformado o Sporting e os seus jogos em símbolos da identidade nacional [do antigo regime, pensaria ele].

quinta-feira, 2 de julho de 2020

Tática do pentágono

“Espero que o Prefeito da Congregação das Causas dos Santos, Cardeal Ângelo Becciu, e o Papa Francisco estejam atento ao jogo de hoje porque o irmão Amorim se prepara para fazer mais um milagre!”. Esta mensagem de um amigo despertou a minha curiosidade. Mas um sportinguista que se preze sabe que o jogo, qualquer jogo, vai correr mal e preocupa-se mais com os suplentes (que terão de entrar, dê por onde der) do que com os titulares. Procuro saber da lista dos suplentes e descubro que, para o ataque, temos o Joelson Fernandes e o Tiago Tomás. Espanta-me não tanto os jogadores mas o facto de ainda estarem acordados aquela hora (fiquei o jogo todo à espera de ver uma das mães entrar pelo campo a mandá-lo para cama, levando-o por uma orelha para casa). 

Há tantas táticas quantas as cabeças. Há as lineares, as que apelam a figuras geométricas e as que as combinam. A que mais me fascinou sempre foi o 4x4x2 losango do Paulo Bento (o losango constituía referência para o posicionamento dos quatro jogadores do meio-campo), por ter o precedente histórico de Aljubarrota e de D. Nuno Álvares Pereira, Santo Condestável. O Amorim é radicalmente inovador e opta pelo 5x2x3 pentágono, constituindo a figura geométrica referência para o posicionamento dos três centrais e dos dois médios. Atente-se que um losango pode ser um quadrado, bastando que os quatros ângulos sejam retos, enquanto um pentágono nunca o pode ser. Um quadrado é um polígono, um losango é um polígono e um pentágono é um polígono e, como se demonstrou, nem todos os polígonos são iguais e uns são mais iguais do que outros. 

Esta aposta pentagonal inédita dispõe de uma grande virtude: deixa o Coates no vértice mais recuado e mais próximo do guarda-redes com um enorme raio de ação e sem sobreposição com o raio de ação do Eduardo Quaresma e do Borja. Este círculo transforma-se assim num buraco negro onde os adversários vão sendo sugados e desparecendo conforme dele se aproximam. No passado, com o Mathieu, havia respeito e compreensão mútua. O Coates cortava umas bolas, abafava uns adversários mas sentia-se obrigado a deixar fugir uma ou outra peça de caça para o seu companheiro do lado. Agora, não tem dúvidas, é tudo dele até onde a vista alcança. Por isso ou porque a equipa reage bem à perda de bola e pressiona de imediato o adversário, mesmo que tenha de recorrer à falta nos locais do campo onde devem ser efetuadas, a verdade é que existe mais consistência na defesa. 

A defesa está melhor e recomenda-se (mais um boa exibição do Max que começa a comparar com vantagem com o Rui Patrício para o mesmo estrato etário), mas o ataque é o que sobra, o que resta, não constituindo uma função autónoma. O primeiro golo é o resultado de se ter recuperado a bola e tão-só, tendo a bola se encarregado de fazer o resto. A bola procurou fugir o mais que pôde mas acabou sem sorte nenhuma. Fugiu ao Ristovski, fugiu da biqueira das botas do Plata, fugiu das canelas de um defesa do Gil Vicente, voltou a fugir do Plata, fugiu de outro defesa do Gil Vicente até ser apanhada em cheio pelo pontapé do Wendell. Esta falta de autonomização do ataque é que explica o atraso de calcanhar do Plata quando se encontrava completamente isolado, autolimitando-se em função do jogo (defensivo) de equipa. 

Na segunda parte, tudo parecia diferente. O Wendell isolou-se, procurou dominar a bola com todo o cuidado e encaminhar-se para o guarda-redes sem que restassem dúvidas sobre as suas intenções: atirar-lhe a bola à ventas com quantas forças tivesse. O guarda-redes ainda se tentou desviar, mas não teve tempo e não conseguiu. Logo a seguir, o defesa direito do Gil Vicente desmarcou o Plata para este dominar a bola e a encostar para o segundo golo (tentem imaginar que em vez do Plata era o Jesé). Foi uma prenda de anos, uma prenda dos 114 anos do Sporting. Fiquei à espera que, no final do jogo, os jogadores adversários fizessem uma rodinha e nos cantassem os parabéns também. A partir daquele momento, o único motivo de interesse era ver jogar o Tiago Tomás e o Joelson Fernandes. No entanto, 0 Doumbia ainda tentou estragar tudo, demonstrando cabeça de iniciado, mas era tarde de mais. 

Desde o desconfinamento futebolístico, registámos mais três pontos do que o Porto, mais oito do que o Benfica e mais nove do que o Braga. O Vítor Oliveira diz que não chega, é pouco. O Vítor Oliveira ganhou o estatuto de senador dos pobres, dos sobe-e-desce. Subiu de divisão uma série de clubes ao longo de várias épocas e tem o seu mérito. Contrariamente ao que se diz, no início da sua carreira teve as suas oportunidades. Andou pelo Braga e pelo Guimarães, de onde saiu pichado de alcatrão e penas. Percebe-se o ressentimento: podia ter sido um Peseiro, um Rui Vitória ou um Lage em mais barato. Não havia necessidade, sinceramente!