Jogávamos contra o Santa Clara que tinha enfiado quatro batatas ao Benfica de Bruno Lage, essa equipa enorme, tão grande quanto as maiores e, seguramente, demasiado grande para o futebol português, segundo Rui Santos. Uma equipa destas, com um ataque que passara como cão por vinha vindimada por galácticos como um Almeida, um Dias, um Ferro, um Grimaldo ou um Weigl, deixaria a ver navios pobres coitados como um Ristovski, um Quaresma, um Coates, um Acuña ou um Mendes. Respondemos a este desafio com uns violentos sessenta e sete por cento de posse de bola que nos valeram uns não menos violentos sessenta e sete por cento de cartões amarelos [o primeiro desses amarelos devia ter sido vermelho tal a violência do pisão na bola do Doumbia, mas ainda bem que o árbitro não interpretou assim porque não viu a bola queixar-se].
Nos jogos contra o Tondela e o Moreirense ficámos a conhecer a regra que permite agarrar o Coates sempre que ele pretende cabecear. Neste, ficámos a conhecer a regra que não permite que ele não se deixe agarrar. Temos assim os cantos e outras bolas paradas do ataque do Sporting transformadas no jogo da apanhada do Coates sem que o Coates possa fugir. Não compreendo o interesse de assim se jogar à apanhada se aquele que se pretende apanhar tem de ser sempre apanhado dê por onde der. Também não foi marcado mais um “penalty” a nosso favor, por falta sobre o Plata. No último jogo, contra o Moreirense, ficámos a conhecer a regra que permite dar dois “penalties” de avanço ao nosso adversário e, por isso, mais legítimo se torna só dar um, como foi o caso deste último jogo.
Os árbitros têm-nos disponibilizado uma paleta (de combinações) de decisões que nos permite refletir sobre a perspetiva ontológica do sportinguismo. Preferimos ser roubados em dois “penalties” ou num “penalty” e num golo mal anulado? Preferimos ser roubados pelo árbitro e pelo vídeo-árbitro em conjunto ou por um só deles? A resposta a estas questões definir-nos-á sobre o ser do Sporting de todos e de cada um. Estas arbitragens têm-nos interpelado a uma reflexão sobre o nosso sentido coletivo mais profundo que, de outra forma, não se realizaria, perdida na espuma dos dias.
O jogo, aquela coisa que envolve a bola e os jogadores, foi um aborrecimento de todo o tamanho. Salvou-se o espetacular golo do Jovane Cabral, depois de excelente movimento e melhor centro largo do Wendell ao segundo poste, e a entrada do Diogo Salomão para a equipa do Santa Clara na segunda parte. Por momentos, pensei que estava a ver a RTP Memória e vieram-me à cabeça nomes que constituem o nosso “Hall of Fame” dos anos oitenta e noventa, como Uchoa, Bukovac, Kikas, Hamilton, Bela Katzirz, Jason, Roger Wilde, Kaloga, Diallo, Fernando Cruz, Saucedo, Duílio, Forbes, McDonald, Peter Houtman, Rodolfo Rodriguez, Eskilsson, Ali Hassan, Miguel, Carlton Banze, Maside, Portela, Valtinho, Edel, Bozinowski, Guentchev, Tó-Zé, Barny, Carlos Jorge, Lemajic, Costinha, Luís Vasco, Afonso Martins, Mauro Soares, Ouattara, Skuhravy, Gil Baiano, Balajic, César Ramirez, Missé-Missé, Nenê, Didier Lang, Renato, Leão, Giménez, Ivo Damas, Kmet ou Krpan. Será que algum destes tinha lugar na nossa atual equipa? Talvez haja razões para a esperança.
Palavra puxa palavra e uma ideia arrasta outra. “The Last Dance”, recente série da Netflix sobre carreira de Michael Jordan e dos Chicago Bulls nos anos noventa, deu-nos a conhecer Tex Winter, treinador-assistente de Phil Jackson, e o seu triângulo ofensivo. Entre 1989 e 2010, esta tática permitiu vencer onze títulos da NBA, seis pelos Chigaco Bulls e cinco pelos Los Angeles Lakers. Fascinam-me estas táticas que apelam a figuras geométricas, como, no futebol, o 4x4x2 losango do Paulo Bento ou, mais recentemente, o 5x2x3 pentágono do Rúben Amorim. O losango e o pentágono podem ser descompostos em múltiplos triângulos.
O Paulo Bento fez milagres, dispondo da nossa formação, de um Caneira aqui e ali e de um ou outro estropiado de guerra, como o Romagnoli ou o Derley. Dispunha também do nosso Michael Jordan ou Kobe Bryant: Liedson, o insustentável levezinho. O Sporting era uma equipa chata, muito chata para qualquer adversário. Era difícil derrotá-la e vencia de goleada por um a zero, jogo após jogo. Em pleno Apito Dourado, o Paulo Bento manteve-nos a esperança durante quatro épocas. O Rúben Amorim parece pretender o mesmo: uma equipa que muito raramente se encontra descomepensada a defender e difícil de derrotar. Falta o insustentável levezinho. Por agora temos o Jovane Cabral. Repetindo: talvez haja razões para a esperança, mas será que chega?
Meu caro,
ResponderEliminarChega para lutar pelo terceiro lugar. Eventualmente, um segundo de engano. Dentro das quatro linhas joga-se pouco...em vários sentido.
Um abraço
Caro Gabriel,
EliminarEstou de acordo. Nós competimos exactamente para ficar em terceiro lugar. Antes de começar o campeonato este é o lugar que nos está destinado. A classificação final depende da relação de forças e de poder e dos casos em investigação. Quando uns são mais investigados, a relação de forças altera-se e ganham os outros; quando os outros são investigados, a relação de forças altera-se outra vez e ganham os primeiros. Entre os árbitros e o sistema judicial é que a coisa se resolve.
Abraço
Meu caro,
ResponderEliminaro futebol português é composto por 3 (duas e meia, vá) equipas que estão lá em cima e as restantes que, como meros figurantes que lutam para não descer, colocam autocarros em frente à baliza.
E os árbitros, que se querem manter na primeira divisão, que é onde ganham mais dinheiro e mais refeições no museu da cerveja, e que para tal, apitam a favor da equipa que lhes dê menos chatices. Obviamente essa equipa nunca é o Sporting.
Posto isto, quem decide a equipa campeã, são os árbitros, de acordo com a que esteja na mó de cima no momento, juridicamente e a nível de poder nos bastidores. Obviamente essa equipa nunca é o Sporting.
Na realidade são eles que desatam os nós górdios que são as equipas figurantes da liga. Normalmente, expulsando adversários do Benfica, e em tempos do FC Porto do apito dourado, a distribuir amarelos para mostrarem respeito no seu papel como figurantes, ou a sacar o seu penalty à Jonas Piscinas.
Este ano, carregado de processos judiciais, parece que o poder nos bastidores do orelhas abrandou e temos o Porto campeão, para dar menos chatices.
Nós? Terceiro lugar, que é o que vamos ter enquanto os croquettes satisfeitos com o estado de coisas que lhes garante tachos pessoais se mantiverem no poleiro.
Meu caro,
EliminarSou capaz de concordar consigo menos com as qualificações aos outros sportinguistas. Não há uns e os outros. Os verdadeiros sportinguistas e os outros. Há sportinguistas e o sportinguismo é interclassista.
SL