terça-feira, 28 de abril de 2020

Onde está o Wally?

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A pergunta é pertinente: existe alguém nos tribunais sem ligações ao Benfica? Existe: quem se senta no banco dos réus. É a história da juíza-adjunta cliente do tal advogado, o juiz benfiquista e a sua avó desalmada, são os casos (de quem ninguém faz caso) dos vouchers, emails, Lex e e-toupeira, já para não falar da propaganda benfiquista nas televisões e jornais. Recentemente até o The New York Times publicou uma reportagem sobre o clube da luz referindo-se-lhe como um estado dentro do estado: ou o próprio estado (das coisas) soberano. Por falar em propaganda, hoje no jornal A Bola, Fernando Guerra, na sua rubrica Vamos Conversar, publica um verdadeiro panegírico à direcção do Benfica e à sua gestão, deliciosamente intitulado: só o Benfica resiste. Nem uma palavra, uma alusão, um roçar de pensamento, sobre quaisquer dos casos acima referidos, ou sobre a (honrosa) reportagem do New York Times. Deixo outra pergunta para finalizar: e se invés dos juízes (árbitros) de futebol estrangeiros arranjássemos juízes de outros países para os nossos tribunais? Estava a brincar, deixem o Wally em paz... 

quinta-feira, 23 de abril de 2020

A incrível e triste história do juiz benfiquista (e da sua avó desalmada)

Pode um juiz benfiquista julgar um caso que envolva o Benfica? É uma pergunta simples que remete para uma resposta também simples não sem que antes nos vejamos em palpos de aranha para a encontrar. 

Um juiz é titular de um dos três órgão se soberania numa democracia plena: o poder judicial. Contrariamente aos outros dois – poder legislativo e poder executivo – estes titulares não são eleitos pelo povo, não se encontram submetidos ao escrutínio popular. Poder, muito poder, e escrutínio exclusivamente pelos pares. O poder (e a sua legitimidade) anda a par da responsabilidade e quanto maior o poder, maior a responsabilidade. 

A nossa identidade é plural ou, melhor dizendo, dispomos de múltiplas identidades. Somos homens ou mulheres, casados ou solteiros, portugueses ou naturais de outro país, do norte ou do sul, do este ou do oeste, da cidade ou do campo, de um clube ou de outro. Somos tudo isto e somos o que fazemos. As identidades complementam-se. Têm um tempo e um espaço e, por isso, no seu tempo e no seu espaço uma não sobreleva outra. Quando uma se sobrepõe a todas as outras estamos mais próximos da barbárie, como nos explica Amartya Sen em “Identidade e Violência”. 

O benfiquista Registo dispõe de uma página de Facebook. O benfiquista Registo expõe publicamente o seu benfiquismo e, como benfiquista fanático, escreve e partilha umas alarvidades sobre futebol, julgando adversários, árbitros e Rui Pinto. Calhando-lhe em sorteio julgar o processo "Football Leaks", o juiz Registo apagou das redes sociais o benfiquista Registo, como se dessa forma deixasse de ser também o benfiquista Registo. O juiz Registo pediu escusa do processo ao Tribunal da Relação de Lisboa. O juiz Registo entende que deve ser um tribunal superior a decidir se tem ou não condições para julgar o caso de Rui Pinto, “tendo em conta o que saiu na comunicação social”. O juiz Registo não desmentiu nada do que “saiu na comunicação social”. 

Em teoria, nada impede que o juiz Registo julgue este caso. O juiz Registo é uma das suas identidades e o benfiquista Registo outra. Quem considera que está impedido de o julgar é o juiz Registo. Se considerasse que o benfiquista Registo é independente do juiz Registo, o juiz Registo não teria apagado o benfiquista Registo das redes sociais. Não, não precisa de ser um tribunal superior a decidir quando ele já decidiu. Não, não precisa de se justificar com o que “saiu na comunicação social”, quando justificou a si próprio a sua renúncia ao renunciar ao benfiquista Registo. 

Pode um juiz benfiquista julgar um caso que envolva o Benfica? Pode, como pode um juiz sportinguista ou portista julgar casos que envolvam o Sporting ou o Porto. Ser de um clube é uma parte do que se é e essa parte não necessita de interferir com o resto do que se é também. O caso particular do juiz Registo é diferente. É o próprio juiz Registo que considera que o benfiquista Registo interfere com a sua função de fazer justiça. Mas o problema não é o juiz Registo; o problema são os assintomáticos.

terça-feira, 21 de abril de 2020

A normalidade (im)possível


Dito de cor, não precisamos de olhar lá para fora para percebermos que a cidade está vazia (já esteve mais). A “normalidade” é agora uma noção anómala sujeita a variadíssimas oscilações. Como era? Como vai ser? A normalidade nunca é igual para todos, em dado momento. O futebol não é um mundo à parte mas comporta-se como tal. Vivendo muito acima das suas reais possibilidades (não apenas em Portugal, mas em todo o lado), assemelha-se a um balão inchado, extremamente dependente de quem lhe sopra as golfadas necessárias à sobrevivência (publicidade, televisão, mecenas bem e mal intencionados, maquinaria de lavagem de dinheiro, apostas), devidamente municiado pelas instâncias internacionais a seguir os bons exemplos: UEFA e FIFA. Alguém acredita nisso?

Também o futebol vai precisar de ventiladores e de passar algum tempo nos cuidados intensivos. Também o futebol será alvo de incontáveis metáforas. A sua indústria, como alguns gostam de lhe chamar, é um artifício meramente especulativo. Onde se encaixam os adeptos, os associados, nestas andanças? Perguntem aos ansiosos comentadores dos intermináveis programas da normalidade passada, uma lateralidade história (e histérica) que gravita, hoje em dia, algures, entre o FIFA 20 e o canal história. O programa mais transferências, apenas terá mudado de nome para menos (ou nenhumas) transferências. A vida não pára. 

A competição vai voltar, anuncia o jornal A Bola. Não se sabe (apenas) em que moldes. O Record mostra os jogadores do Sporting trajados de vida caseira, separados por não sei quantos metros ou campos, o bastante para umas fotografias. A normalidade (im)possível. Quando era puto havia o jogo da bola invisível, nunca pensei ser possível o jogo com jogadores invisíveis e adeptos inexistentes. Fica só a bola. Dá para matar o bicho, para quem tem fé.

Nota: A aragem financeira para os lados de Alvalade não corre de feição. Até aí, a normalidade não descamba. Todavia, o lay-off imposto à generalidade dos funcionários mostra, à evidência, que as notícias da negociação recente de um treinador por valores que rondavam os dez milhões de euros, só poderiam ser manifestamente exageradas. Caso contrário, lá teríamos que ferrar o cão.

sexta-feira, 17 de abril de 2020

Ferrar o cão

Há notícias de que não pagámos os 10 milhões de euros pelo Rúben Amorim ao Braga. Estranhamente, muitos dos que criticaram por pagarmos 10 milhões de euros pelo Rúben Amorim ao Braga são os mesmos que agora criticam por não pagarmos 10 milhões de euros pelo Rúben Amorim ao Braga. A única coisa que se sabe de ciência certa é que não há evidência empírica de que pagámos 10 milhões de euros pelo Rúben Amorim ao Braga. Concluindo, as notícias de que pagámos 10 milhões de euros pelo Rúben Amorim ao Braga eram manifestamente exageradas.

quarta-feira, 15 de abril de 2020

Futebol faz de conta

O futebol como organização constitui um imenso faz de conta. Faz de conta que tem leis e justiça própria. Faz de conta que as regras se cumprem e não há concorrência desleal. Faz de conta que se trata de um Estado dentro de cada Estado. Este faz de conta é de tal forma convincente que os seus protagonistas acreditam que assim é e fazem acreditar os outros também. A convicção é de tal forma que nem a pandemia do Covid-19 os demove de continuarem essa representação. 

Sem espanto, assiste-se a uma discussão entre a FIFA, a UEFA, as federações e as ligas sobre a conclusão dos campeonatos, como se essa decisão lhes coubesse. Aparentemente, não lhes passa pela cabeça que só haverá jogos à porta aberta ou fechada quando os governos dos diferentes países assim o decidirem (e ponto final) e que essa decisão não se encontra propriamente no topo das suas prioridades. 

Em Portugal, a Federação, a Liga e o Sindicato vão se entretendo a discutir redução de salários e eventual “layoff”. A discussão anda entre os trinta e os cinquenta por cento de redução dos salários e os clubes acordaram não efetuar qualquer contratação de um jogador que rescinda o seu contrato com justa causa. Pelo caminho, jogadores do Aves vão rescindindo, alegando o não pagamento (de todo) dos salários. Será que eles são completamente estúpidos para não perceberem que é preferível receber setenta ou cinquenta por cento de nada do que nada mesmo?

sexta-feira, 10 de abril de 2020

Inconsolavelmente fiel


Estive a rever (uma grande parte) o AZ Alkmaar– Sporting no canal 11. O isolamento social dá para tudo, inclusive para isso. Durante o prolongamento (isto é verdade), o de hoje claro, não revivi os momentos em que vi na altura o jogo, perto de uma taquicardia arrítmica (não sei se isso existe, mas lá que parecia, parecia), segundo consta, mas vivi-o estranhamente, como se fosse a primeira vez, e eu fosse uma espécie de vidente, ou tivesse consultado um oráculo e soubesse que ia correr tudo bem. Deve ser por ver isso escrito hoje em dia nas janelas e elevadores: vai correr tudo bem ou vamos todos ficar bem, eu sabia, eu sabia. E depois no final do final de tudo o Tello marca o canto, uf, estava a ver que não, o Garcia marca golo e toda a equipa marca golo, toda a equipa festeja, cada um a correr desvairadamente para o seu lado (como quando se corta a cabeça a uma galinha e esta desata a correr), até que alguns jogadores se encontram, incrédulos, como nós nos encontramos até hoje. Foi a última vez que o Peseiro teve uns gramas de sorte. A última. A partir daí não reza a história. Obrigado na mesma.