A vergonha tem ou deve ter limites. Há ou deve haver limites para se escreverem crónicas de jogos que não se vêem. Em [grande] parte, este jogo [do Sporting] contra o Porto foi mais um deles. Passei o fim-de-semana com uns amigos e amigas do tempo da universidade e do Instituto Superior de Agronomia em Ermidas do Sado. Regressei no domingo à tarde, ainda assim a tempo de ver os últimos vinte minutos do jogo.
O jogo jogado não parecia concordar com o resultado [estávamos a perder por dois a zero]. Tínhamos a bola enquanto o Porto apenas corria atrás dela, nada de mais frustrante [e cansativo, para o corpo e para a mente]. Quando a perdíamos, rapidamente a recuperávamos. Atacávamos uma e outra vez, ininterruptamente. Não se criavam oportunidades, é um facto, mas havia insistência, persistência no ataque. Um golo podia baralhar o jogo, mudar tudo, era o que pensava ou desejava, o que os sportinguistas também pensavam ou desejavam. O pensamento, o pensamento analítico e a fé andam a par no futebol, no Sporting ou noutro clube qualquer.
“Deus quer, o homem sonha, a obra nasce”, disse-nos Fernando Pessoa. Não foi muito específico, convenhamos. Não parece razoável seguir uma lógica sequencial tão exigente em todas as circunstâncias, nem andar a incomodar Deus por tudo e por nada [muito menos com o futebol]. Há lógicas e sequências mais simples: no Sporting, o Gyökeres quer e a obra nasce, ponto final. Quis uma, quis duas e não pôde querer mais porque o Edwards não queria [de todo] e foi-se embora mais cedo. De uma derrota humilhante passou-se a um empate honroso em menos de um fósforo e o campeonato ficou ao virar da esquina.
[Esta semana vou voltar a não ver o jogo, mas a escrever a habitual crónica desse jogo que não verei. É preciso continuar até ao fim, a não ver jogo atrás de jogo, mas a escrever crónica atrás de crónica de jogos que não vejo. Em equipa que ganha não se mexe e não, não estamos em tempos de arrependimentos]