sexta-feira, 14 de maio de 2021

Entre o acontecer e o não acontecer

Na terça-feira, jogava-se o jogo pelo qual esperava há dezanove anos. Em bom rigor, só no final sabia [e soube] que era o que esperava. Durante estes anos, outros jogos houve que podiam ser como este, o jogo por que tanto esperava. Não eram ou acabaram por não ser porque acontecia Sporting. Sporting também é nome próprio de qualquer acontecimento natural ou sobrenatural desde que disponha de duas características relacionáveis: elevada improbabilidade e impacto profundamente negativo no Sporting como equipa ou clube de futebol. Há vários exemplos: o falhanço a um par de metros da linha de baliza do Bryan Ruiz na época de 2015/16, a falta do Luisão sobre o Ricardo na época de 2004/05 ou o golo marcado com a mão pelo Ronny – jogador do Paços de Ferreira – na época de 2006/07. 

Um sportinguista experimentado pressente quando pode acontecer Sporting e na terça-feira os sinais não deixavam margem para grandes dúvidas. Os sinais começaram cedo, logo na primeira parte. Pressão alta, Feddal a antecipar e a ganhar a bola, Nuno Santos a partir à desfilada com ela até a chutar, de longe, contra o poste. Canto do lado esquerdo, centro do Nuno Mendes e cabeceamento ao lado do Paulinho. Pedro Porro a respeitar a desmarcação do Pedro Gonçalves e a meter-lhe a bola para ele pressionado rematar fraco, fraquinho, acabando a passar ao guarda-redes. Jogada do lado esquerdo do Pedro Porro que vai metendo para dentro, à procura do melhor momento para rematar, até o conseguir e a bola embater num defesa e deixar o João Mário completamente isolado que remata ao lado. Nuno Santos e Nuno Mendes engendram um ataque pelo lado esquerdo com o segundo a rematar à barra. Outro canto do lado esquerdo, novo centro do Nuno Mendes e Gonçalo Inácio a entrar ao primeiro poste e a cabecear ao lado. 

Subitamente um sinal contraditório: Feddal a lançar comprido para o João Mário que avança, flete para o meio, dá de caras com dois adversários, rodopia para o lado contrário e mete a bola no Nuno Santos que, isolado do lado esquerdo, a centra para o meio onde estava o Paulinho a encostá-la com a canela para a baliza. Um pouco mais tarde, novo sinal: jogada do Boavista pelo lado esquerdo do ataque, centro rasteiro para a entrada da pequena área, remate de primeira de um avançado para o lado direito do Adán quando este se deslocava para o seu lado esquerdo e defesa instintiva com a mão. Talvez não fosse acontecer Sporting, talvez!

No início da segunda parte, os sinais de que ia acontecer Sporting voltaram com maior intensidade ainda. Excelente tabelinha entre o Nuno Mendes e o Paulinho com este a acertar com a bola no guarda-redes na marcação de uma “penalty” em corrida. Bola metida pelo Pedro Gonçalves para magnífica desmarcação do Paulinho que demora tanto, mas tanto a tentar dominar a bola com o pé direito para a passar para o pé esquerdo que acaba por a rematar contra as pernas de um defesa. Nova jogada do Pedro Gonçalves pelo lado esquerdo, centro para a pequena área e o Paulinho a meio metro da baliza a acertar de raspão com a cabeça na bola e a fazê-la passar ao lado. Desmarcação do Pedro Gonçalves para as costas da defesa, passe perfeito do João Mário e remate ao poste. Nova desmarcação e novo “penalty” em corrida marcado pelo Paulinho, agora por cima da baliza. Paulinho, sempre o Paulinho a procurar que acontecesse Sporting. Tão pouco tempo no clube e já uma elevada compreensão do destino, do seu destino. 

A equipa estava a jogar bem e o Rúben Amorim hesitava e não fazia substituições, quando havia jogadores que não podiam com uma gata pelo rabo. Faltava que os jogadores do Boavista fizessem o que era suposto fazer para que acontecesse Sporting. Os minutos foram passando e nada, não havia maneira de acontecer Sporting. Pela minha cabeça ia passando o pior: o golo do Boavista, a derrota contra o Benfica e um último jogo contra o Marítimo a fazer reviver velhos fantasmas. O jogo acabou e não aconteceu Sporting. Será que não aconteceu Sporting ou não aconteceu de todo? Somos campeões? 

13 comentários:

  1. Caro Rui,
    parabéns por escrever a crónica que esperava há 19 anos!

    Todos nós, Sportinguistas, sabíamos que podia acontecer Sporting... foi por isso que não vi o jogo na televisão, mas sim no portátil, com o cursor do rato na baliza adversária, como quem indica o caminho do golo...e fui tentando várias combinações de cruzamento de pernas para ver qual daria resultado para a obtenção do tal resultado...

    Sabia que eu, na mesma maneira que estes jogadores sempre acreditaram, teria que acreditar que seria possível não acontecer Sporting...e por isso fui acreditando e vendo os segundos darem lugar aos minutos... e estes se irem acumulando ao bater do coração...para no fim me perguntar: Somos Campeões?

    PS: o Paulinho é um verdadeiro matador, penso que na terça deve ter matado muita gente do coração.

    Saudações Leoninas caro Campeão Rui!
    Sérgio

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    1. Caro Sérgio,

      O Paulinho ia-nos matando, é um facto. Depois de ver tanta oportunidade falhada, estava mesmo à espera que acontecesse Sporting. Deve ser da estrelinha do Rúben Amorim.

      SL

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  2. Pois, é mesmo, mas mesmo isto...
    Faltou-lhe falar num outro sinal que claramente indicava que ia ser mais um daqueles momentos "Sporting": a lesão do Pedro Porro...
    Vi nas lágrimas do nosso lateral a antecipação do choro de todos os sportinguistas por mais um daqueles momentos que tudo indicava que ia de novo suceder.
    Felizmente não aconteceu e posso agora ver com serenidade os dois próximos jogos do SCP, do principio ao fim, sem que a minha frequência cardíaca atinja os 100 bpm sem me mexer do sofá...

    José Carlos

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    1. Caro José Carlos,

      É verdade. Faltou a referência à lesão do Pedro Porro. Parecia que estava tudo alinhado para a desgraça-

      SL

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  3. Caro Rui Monteiro
    Ainda tenho esperança que se faça justiça ( o processo ainda está a decorrer ), mas ganhamos o campeonato de 2015/2016. As falcatruas do benfica fora muitas nesse campeonato. Basta ler os emails e o caso da " Mala Chao "
    No Campeonato da mão do Rony, se não estou enganado, perdemos no último jogo. O Sporting estava já ao intervalo a ganhar 3/0 à Académica e a um ponto do Porto. O Porto estava ao intervalo empatado com o Aves 1/1 e precisava de ganhar. Mais, se o Aves perdesse descia de divisão. Era o jogo de vida e de morte para ambos. Foi neste jogo que o Pinto da Costa se achou mal ao intervalo e desceu ao balneário ( do Porto ou do Aves, nunca se soube ). Na 2.ª parte, o Porto marcou mais 2 golos e muito facilitados pelo guarda-redes do Aves, ganhando o campeonato e o Aves foi para a 2.ª Divisão. Já agora, sabe quem era o guarda redes do Aves nesse jogo? NUNO ESPIRITO SANTO. Sabe para onde ele foi na época seguinte? Para o Porto. Sabe quanto jogos fez na época seguinte pelo Porto? Nenhum.
    Tudo normal, não é verdade Sr. Pinto da Costa.
    Um abraço

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    1. Meu caro,

      Vamos festejar este e logo pensamos nesses que ficaram lá atrás. O que se passou e se tem passado é uma vergonha, que nos envergonha a todos como portugueses. Quem sabe se com este vitória do Sporting os ares do futebol português não mudam?!

      Um abraço

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  4. Caro Rui Monteiro,

    Quem esperou 19 anos para ser campeão, podia esperar 19 anos e dias por esta crónica tão desejada!

    Por incrível que pareça e ao contrário de muitos jogos este ano (os últimos minutos de alguns deles, nomeadamente com o Porto e sobretudo Braga, não consegui ver) estava tranquilo.
    Conforme e bem descreveu nos últimos anos talvez tenha acontecido muito Sporting e esta 3ª feira tínhamos mesmo de vencer, por ELES e por NÓS!

    Viva o Sporting!

    Frederico Fernandes

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    1. Caro Frederico Fernandes,

      Não vi os últimos jogos. Neste estava confiante. Não, não era possível acontecer uma desgraça. Conforme o Paulinho ia falhando comecei a ficar em pânico e só não deixei de ver porque estava com uma pessoas amiga.

      SL

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  5. 19 anos de indiretas e picardias
    Respondidos com competência
    Mas a resposta à tua Magnífica crinica está nas palavras semanas antes do grande Pinto da Costa
    “Em condições normais o Porto é campeão “
    Viva a anormalidade de ganhar quando temos que ganhar
    Espero que esta aura de anormalidade aguente mais dois jogos
    Muitos parabéns meu amigo
    Forte Abraço

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    1. Caro António,

      O PdC mandou-nos duas arbitragens bastante normais para o padrão habitual contra o Braga e Nacional. Mesmo assim, não deu. Este ano foi ano de anormalidade.

      Grande abraço

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  6. Caro Rui,

    Este era o momento porque tanto esperámos e a sua crónica também não desiludiu. Parabéns.

    Também ainda não acredito bem no que se passou. Todos sabemos que em condições normais o Porto ganharia, o Rui aproveitou aqui para mencionar alguns exemplos dessa normalidade. Por algum motivo os astros andaram desalinhados e até conseguimos ganhar com o Godinho.

    Tudo fica bem quando acaba bem. Mas hoje volta a normalidade. Como já tinha aqui previsto, com Tiago Martins. O futebol Português continua a não enganar, mas parece-me que o Sporting conseguiu enganar o futebol Português. E isso é motivo de ainda maior orgulho.

    Saudações Leoninas e Viva o Sporting, Somos Campeões!

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    1. Caro João,

      Melhor comentário da época: "O futebol Português continua a não enganar, mas parece-me que o Sporting conseguiu enganar o futebol Português". É isto mesmo.

      SL

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  7. Caro Rui,

    só para lhe deixar um abraço (de campeão - já nem me lembrava como é que eram)!
    De Jardel a Paulinho, houve poucos Liedsons, alguns Kokes, Diabys, Purovics e Saleiros.
    Houve, também, Slimanis, Dosts e, imagine-se, Monteros (uma ligeira provocação).
    A espera foi tão longa como o foi o desejo pela festa.

    Somos Campeões! Mas, antes, durante e depois disso, seremos sempre Leões. E é isso que nos mantém por cá, quer nos Dias de Sporting, como nos Dias à Sporting (que são tantos...).

    Um grande abraço

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