terça-feira, 6 de abril de 2021

Por dois centímetros ou como um sportinguista é uma lealdade à espera de uma causa

O jogo caminhava para o seu final e a minha cabeça era um vazio. Jogo controlado do primeiro ao último minuto. Oportunidades de golo o quanto baste para ganhar por mais do que um. Oportunidades para o adversário poucas ou nenhumas. Aparentemente mais um jogo sem história, sem entusiasmos, mas também sem depressões. E chega o minuto noventa: cruzamento mal-amanhado de um jogador do Moreirense, corte ainda mais mal-amanhado do Feddal, bola a respigar para um avançado do lado direito do ataque, que, fora da área, remata colocado ao segundo poste e faz o empate. Há minha frente abre-se um admirável mundo novo, novo pela novidade desta época, mas tão antigo como o sportinguismo. 

O Rúben Amorim deixou de ser o Rúben Amorim e passou a mais um fantasma, como o Paulo Bento, o Leonardo Jardim, o Mirko Jozic ou o Bobby Robson. Há diferenças: se fosse com o Paulo Bento, o golo do empate também surgiria no último minuto mas seria autogolo do Polga, do saudoso Anderson Polga, ou marcado com a mão. O enredo, a trama não foi diferente, um árbitro a apitar de costas e a acertar e a errar como se estivesse a decidir por moeda ao ar. Ninguém estranhou que houvesse tantos cartões amarelos para os jogadores do Sporting quantos para os do Moreirense: com as regras do Moreirense os dois cartões amarelos foram bem mostrados e com as regras do Sporting os dois cartões foram bem mostrados também. Na falta violenta sobre Nuno Mendes, que o mandou para o estaleiro, os comentadores da Sporttv recorreram a semântica apropriada: “entrada vistosa sobre Nuno Mendes”, “entrada delicada sobre Nuno Mendes”. A síntese das duas afirmações é perfeita, descreve o lance com precisão: entrada delicada e vistosa. Sublinha a delicadeza, a cordialidade do jogador do Moreirense sem prejuízo da espetacularidade da sua ação. Delicadeza e espetáculo não rimam com cartão e assim se justifica a (não) decisão do árbitro. 

Os golos anulados ao Sporting têm história, têm sempre, não se estranha. As imagens aparecem sob um ângulo que nada esclarece. Depois, bem, depois aparecem linhas, linhas precisas, rigorosas. Passou a ser impossível um avançado encontrar-se em linha com o último defesa: com precisão ao centímetro, a probabilidade de tal acontecer é igual a zero. Dois centímetros num campo com cerca de cem metros de comprimento representam 0,02%. Talvez se perceba melhor a razão para a demorada análise do VAR: envolveu investigação do Laboratório Internacional de Nanotecnologia, sedeado em Braga. A imagem não tem cem metros de comprimento e, assim, os dois centímetros não correspondem a dois centímetros de imagem. A diferença aproxima-se de um nanómetro, qualquer coisa como dez levantado a menos sete de um centímetro, a diferença entre dois grãos de açúcar completamente iguais à vista desarmada. 

Recentemente, li “Cães maus não dançam”, de Arturo Pérez-Reverte. É uma alegoria, em que cães de luta representam uma rebelião como a de Spartacus contra a República Romana. Às páginas tantas, o narrador, um cruzado de mastim espanhol e cão-de-fila brasileiro, confessa que “um cão não é mais do que uma lealdade à espera de uma causa”. Um sportinguista não é coisa diferente. Deem uma ideia, um objetivo na vida, e irá aferrar-se com os caninos apertados. Tenaz até ao sacrifício e à morte. Com tomates. Aferra-se ao que vem remoendo. É claro que sabe que é possível que corra mal. Mas aquele é o plano e não há outro [versão adaptada]. 

8 comentários:

  1. ...tão antigo como o Sportinguismo.Já começaram a desancar no Ruben Amorim.SL

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    1. Meu caro,

      Estes foi dos jogos que o Sporting mais controlou o adversário. Estas coisas acontecem. O Moreirense nem cócegas fez. De repente, num remate impossível, empata. É a vida!

      SL

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  2. jogadores , treinadores e presidente estão e estarão sempre sujeitos a critica ....

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    1. Meu caro,

      Claro que sim, embora este jogo não tenha sido dos mais criticáveis. O Sporting controlou sempre, teve oportunidades, marcou mais dois, teve esses golos anulados. É a vida!

      SL

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  3. Caro Rui,

    Quando a seleção jogou com a Sérvia tive a sensação de ver jogar o Sporting a que estávamos habituados: um jogo mal amanhado, um resultado magro a culminar com uma roubalheira das antigas (mas com aquela máxima que muitos defendem de que 'quem joga assim não se pode queixar das arbitragens').

    Digo isto porque me quer parecer que o jogo de Moreira de Cónegos não foi isso. O Sporting dominou, justificou o 2-0, mas por um ou outro azar, e talvez uma roubalheira das modernas, acabou por chegar ao último minuto com o 1-0 e viu o Moreirense marcar um (grande) golo. Se o nosso treinador fosse o Sérgio Conceição certamente iria para a conferência de imprensa contar as defesas do Adán. Felizmente não é, e limitou-se a dizer o que se pode dizer neste caso: estas coisas acontecem. Também assim penso, estou confiante que não nos venham a acontecer muito mais e que na verdade este azar seja um mote para arrancar para um bom final de época!

    Entretanto o próximo jogo é mais importante que nunca, na medida em que é o próximo e vale 3 pontos.

    SL

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    1. Caro João,

      Não suporto a malta do põe-se a jeito. Faz-me lembrar os juízes que confundem o violador com a vítima. Na arbitragem é o mesmo: o Sporting põe-se a jeito, é o que muitos dizem.

      Concordo consigo em absoluto com o seu remate final: o próximo jogo é o mais importante, porque é o próximo e porque vale três pontos.

      SL

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  4. Vi ontem no canal Porto, uma perseguição Ad Hominem sobre o nosso jogador Palhinha. FOI REPUGNANTE. O Francisco J Marques e seus colegas de painel deram-se ao luxo de contabilizar as faltas do Palhinha nesta época. Mais de metade não existiram, como foi o caso do amarelo no Boavista, mas aqui não se lembraram disso.
    E se estivessem de boa fé, iriam contabilizar as faltas do Palhinha em Braga e dos amarelos mostrados: iam corar de vergonha.
    Mais, encontraram um penalti conta o Sporting e uma possível expulsão do Pote. Esqueceram-se, claro da entrada sobre o Nuno Mendes que levou para fora do campo literalmente.Aqui "no pasa nada "
    Pelo que vi ontem naquele canal, começou a caça ao leão, pelo sistema do Porto que toda a gente conhece.
    Penso que a Direcção do Sporting já deveria ter tomado uma posição, sobre o que foi dito naquele programa sobre o Sporting e participar dos mesmos aos órgãos competentes, para que conste.
    Não o fazendo vamos ser " comidos " como eles dizem e também fazem.
    Um abraço

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    1. Meu caro,

      O Porto Canal já foi uma televisão com algum sentido para que, como eu, privilegia uma visão do Norte sobre o país nas mais diversas áreas, na política, na economia, ou na cultura. Por razões profissionais, cheguei a participar nuns debates há uns anos atrás.

      Depois transformou-se no Porto Tv. Neste momento é uma coisa que não interessa a ninguém. Está nos fundos da grelha de canais da NOS ou da MEO, dada a irrelevância. Há irrelevância não se deve dar relevância. Por outro lado, querem fazer com o Sporting o que fizeram com o Benfica. Não dá! As pessoas não são estúpidas. Não há emails, nem vouchers, fruta ou apitos do Sporting. É gratuito, sem nenhum propósito e diz mais de quem ataca do que de quem é atacado.

      Um abraço,

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