sexta-feira, 27 de novembro de 2020

Tempos modernos e difíceis ou a eterna vitória do capital contra o trabalho

Ver o jogo do Sporting contra o Sacavenense para a Taça de Portugal na TVI, na televisão da Cristina Ferreira, gerava expetativa, muita expetativa. Esperei, esperei e nada. Nem o António Costa, nem o Marcelo Rebelo de Sousa, nem o Luís Filipe Vieira entraram em campo para fazer umas pataniscas de bacalhau ou uma simples entremeada na brasa. Em vez disso, parecia que estava a ouvir os Tempos Difíceis, de Charles Dickens, ou o Manifesto do Partido Comunista, de Friedrich Engels e Karl Marx. Os do Sporting representavam a burguesia, a classe dominante, os proprietários dos meios de produção, enquanto os do Sacavenense representavam o povo, os oprimidos e o proletariado. Parecia que o Sporting se encontrava a jogar contra o Fabril quando o Fabril tinha jogado contra o Porto. Segundo os comentadores, os do Sacavenense tinham acabado de deixar o Charles Chaplin sozinho na linha de montagem de Tempos Modernos, sem sequer mudar o fato de macaco. 

Mal o jogo se tinha iniciado e já o Nuno Santos tinha molhado o bico. Os comentadores tentaram transformá-lo num novo milagre mariano ao afirmar que o passe tinha sido do Borja. Por falar em Borja, gostei de o ver jogar no lado direito. Sendo canhoto, anda sempre à procura do pé esquerdo quando a bola lhe vai para o direito e essa dessintonia entre o pé que está mais à mão e o pé que está mais ao pé [da bola, entenda-se], constitui uma revienga imparável. Como centra tão mal com o pé esquerdo como com o direito, o resultado é o mesmo, mas passa por dispor de um estilo enleante e azougado. O Coates marcou o dois a zero passado um pouco. O Rui Veloso cantou uma coisa sobre voar sobre os centrais mas com o Coates não é bem assim, é voar contra os centrais, contra a bola, contra o guarda-redes, contra a baliza. O Jovane marcou o terceiro, apesar dos comentadores jurarem a pé juntos que não, não havia “penalty” nenhum. Como todos sabemos, quem mais jura mais mente, acabando por pedir desculpa.

Mal se iniciou a segunda parte e já estava outra vez o Nuno Santos a fazer das suas, das dele, salvo seja, e o Coates só teve de empurrar para o quarto golo. O Jovane ainda foi a tempo de fazer de central, tornando a jogada mais real, mais próxima de um jogo contra o Fabril ou o Paredes, essas grandes equipas de jogadores profissionais, treinados e bem treinados. Sem o efeito surpresa do Borja do lado direito, os do Sacavenense perceberam que o Borja era o Borja e ala que se faz tarde pelo lado esquerdo da nossa defesa. Um operário marcou um golo e, subitamente, um operário era um jogador de futebol, com chuteira, calções e camisola. Estava tudo em modos de assim, até que entrou mais um puto, o Pedro Marques. O puto queria marcar golos à viva força. Atacava a bola de cabeça, não dava uma bola por perdida, tentava e marcava, e voltava a pedir a bola, queria mais, sempre mais. Tudo acabou com o último golo de outro puto, Gonçalo Inácio, impedindo o Coates de fazer “hat-trick” [se fosse comigo, tinha-lhe enfiado uma galheta]. 

Começo a suspeitar que não esteja a ver jogar o Sporting ou que o esteja a ver mas na RTP Memória. Onde anda aquela equipa que transformou o Alverca e o Loures em colossos do futebol nacional? O que tem a dizer o Ministério da Coesão Territorial sobre isto? Foi para isto que se criou o Ministério da Coesão Territorial? Ao menos que mandem entrar em campo alguém do ministério para fazer umas pataniscas de bacalhau ou uma entremeada na brasa.  

8 comentários:

  1. Respostas
    1. Obrigado Pedro.

      Ficamos a aguardar pelas pataniscas de bacalhau ou pela entremeada.

      Abraço

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  2. Genial com sempre!

    Só lhe posso pedir, e passe o descaramento, que publique as suas crónicas mais rapidamente. Já é difícil aguentar ver o Sporting jogar tão mal, mas ter de aguardar uma semana pelas suas crónicas é demais.....

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    1. Caro Frederico Fernandes,

      Antes de mais, obrigado! Estive para escrever no dia, mas não foi possível. Entretanto meteu-se o Maradona e não achei conveniente. Vamos ver se para a próxima tenho tempo para escrever no dia.

      SL

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  3. realmente, os comentários estavam a irritar sobremaneira

    parecia que o Sporting ganhou 7-1 sem saber ler nem escrever

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    1. Caro Calheiros,

      Nós jogámos contra uma equipa da terceira divisão e enfiámos 7 a 1. O Porto e o Benfica jogaram com equipas da terceira divisão e ganharam por dois a zero e um a zero, respetivamente.

      Ouvindo os comentários, nós jogámos contra uma equipa da terceira divisão e, por comparação, o Porto e o Benfica com equipas da Liga dos Campeões. É preciso ter lata!

      SL

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  4. Rui Monteiro
    Ninguém mais do que Pedro Marques merece este post mas também Gonçalo Inácio por ter colocado o placard nos numeros que são tão queridos à família leonina.
    SL

    João Balaia

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    1. Caro João,

      Mas esta equipa do Sacavenense era de operários exatamente igual à outra que também levou 7 a 1.

      SL

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