segunda-feira, 1 de outubro de 2018

Amuo com amuo se paga

Nani, o capitão de equipa, saiu amuado do jogo contra o Braga por ter sido substituído pelo Jovane Cabral, tendo vociferado uns tantos impropérios (que se imaginam dirigidos ao treinador). O Peseiro ficou amuado também com esta situação e não o convocou para este jogo contra o Marítimo. Até aqui, tudo bem: amuo com amuo se paga. Na prática, a teoria é outra ou, na teoria, a prática é outra (nem eu percebo exatamente o que estou a dizer). Se não tivéssemos ganhado, o amuo do Peseiro seria pior do que o amuo do Nani. Assim, como ganhámos, o amuo do Peseiro foi melhor do que o amuo do Nani. 

Depois da derrota em Braga só a vitória contra o Marítimo se admitia. Se não ganhássemos, não havia amuos que nos valessem. Não tenho dúvidas sobre o discurso do Peseiro no balneário: “Este jogo é para ganhar. Para isso reservei-vos uma agradável surpresa, vai jogar o Petrovic!”. Os gritos de contentamento devem ter sido mais do que muitos. Terão sido de tal forma que o Peseiro pediu calma para anunciar mais outra novidade. “Não me fico por aqui. É para ganhar e para ganhar é preciso não empatar ou, pior ainda, perder. Quando nos virmos a ganhar, entra o Misic!”. Deve ter sido o júbilo, os jogadores terão ficado ao rubro. 

Nos primeiros trinta minutos, a equipa demonstrou que tinha interiorizado esta convicção e com sentido de urgência (admito que estavam desejosos de ver jogar o Misic tanto como nós). A equipa estava empolgada e mais empolgada ficou quando o Petrovic fez uma roleta, passando entre vários adversários até encontrar uma brecha para atrasar a bola. Ficaram empolgados os colegas de equipa e mais ficaram os espectadores que desataram a aplaudir este Zidane dos Balcãs, para seu próprio espanto (digo eu). 

O empolgamento resultante desta jogada teve efeitos retroativos e deu origem a um golo logo aos dez minutos. O Jovane Cabral ganhou uma bola a meio do meio-campo e fez um passe em profundidade entre o central e o defesa do lado esquerdo para a desmarcação do Raphinha que, isolado, fintou o guarda-redes e foi derrubado por ele. Um senhor de bigode que estava há minha frente no café gritou logo: “Nem lhe tocou!”. O árbitro não ouviu o senhor de bigode e marcou o correspondente “penalty”. O Bruno Fernandes repetiu a paradinha do costume e deixou como de costume também o guarda-redes de cócoras inclinado para um lado e a ver a bola entrar pelo outro. O Bruno Fernandes está a fazer uma época abaixo de miserável e por isso ainda não conseguiu mais do que a bagatela de quatro golos marcados em seis jogos. 

O Marítimo não acusou o golpe e continuou como se nada fosse. Nós também não ou também assim-assim e, em particular, o Jovane Cabral continuou a jogar sozinho contra o resto do mundo. Numa dessas jogadas, fintou todos os adversários que lhe apareceram pela frente procurando ganhar ângulo para o remate. Não conseguiu encontrar a melhor situação para esse remate e foi andando até se encontrar perdido junto à linha lateral do lado direito e sem saber bem o que fazer à bola. Um jogador do Marítimo fez o favor de o abalroar. Na marcação do livre, o Raphinha meteu a bola tensa na área que, depois de uma carambola nuns tantos jogadores do Marítimo, acabou na bota direita do Montero e, a seguir, dentro da baliza. O senhor de bigode voltou a gritar: “Foi mão do Coates!”. Um outro senhor de bigode, que estava ao seu lado, procurou explicar-lhe que os jogadores equipados de vermelho eram os do Marítimo, demonstrando uma tese que que tenho vindo a aprofundar há tempos: a existência de qualquer excrescência capilar situada sobre o lábio superior não perturba por si só a visão a não ser que se trate de um adepto do Benfica. 

Sofrido o segundo golo, os jogadores do Marítimo procuraram sacudir a modorra que se tinha apoderado do hipotálamo e das pernas. Avançaram mais, trocaram mais a bola no nosso meio-campo e chegaram mesmo a criar uma oportunidade de golo, que não foi concretizada porque o Acuna resolveu armar-se em desmancha-prazeres. Na segunda parte, estranhamente, dedicaram-se a fazer jogo passivo sem que o árbitros nada assinalasse. Os jogadores do Sporting recuaram até próximo da sua área e foi um fartar de passes para o lado, da esquerda para a direita e da direita para a esquerda, umas vezes mais para a frente, outras mais para trás, sem nenhuma intenção de rematar à baliza do Salin. Quando um jogador do Marítimo franziu o sobrolho, ameaçando quebrar o armistício negociado ao intervalo, o Peseiro não esperou nem mais um segundo e substituiu o Jovane Cabral pelo Misic, cumprindo o prometido. 

Com a entrada do Misic, nenhum jogador do Marítimo se atreveu mais a franzir o sobrolho, tendo continuado o jogo passivo até ao fim (o árbitro foi misericordioso com quem estava a ver o jogo e só deu dois minutos de descontos). Os espectadores é que não estavam para aquilo e desataram a assobiar. Com o Jorge Jesus, baldávamo-nos durante uma hora e procurávamos ganhar na última meia hora de jogo com o Coates no ataque. Com o Peseiro, procuramos ganhar na primeira meia hora, baldando-nos na restante hora de jogo. Conclui-se, assim, que os adeptos do Sporting não se importam de chegar atrasados aos jogos, mas não estão dispostos a sair mais cedo. Compreendo-os muito bem. Sem querer parecer sexista, quando chego a casa mais cedo do que o previsto, também acabo pelo menos por ter de ir despejar o lixo e meter a louça na máquina de lavar.

8 comentários:

  1. O Peseiro nem tem margem de tolerância nem se sabe vender.

    A verdade é que jogamos a mesma coisa que com o Madeixas, com um plantel significativamente mais barato, a diferença é que este não tem a lata de vir dizer que jogamos à italiana.

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    1. Caro Ajorge73,

      Tem toda a razão e isso é que e irrita. Depois de toda a tolerância com o JJ, não se tem tolerância com o Peseiro em situação bem mais adversa. Eu tenho procurado ser tolerante, apesar de odiar o Peseiro. Não odeio propriamente o Peseiro. O odeio a oportunidade que ele me negou na final da Taça UEFA, em Alvalade, de ser verdadeiramente feliz, por não ter mão nos jogadores e não substituir vacas sagradas como o Pedro Barbosa, apesar de se andar a arrastar dentro do campo.

      SL

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    2. Meu caro,

      Esse é um trauma que todos temos, Peseiro incluido.

      Aliás, o Peseiro actual está tão preocupado em não ser esse Peseiro que se transformou no anti-Peseiro, um disciplinador cuja equipa é a melhor defesa do campeonato (excepto o Feirense, salvo erro).
      A parte do disciplinador ainda lhe custa, nota-se que não lhe sai naturalmente. :-D

      SL

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  2. Petrovic... coxo? sim! ... mas o futebol não se faz só de artistas e a verdade é que o Bataglia muito melhor com bola muito mais rápido e com mais pulmão ... Foi ... UM CAOS TÁCTICO no jogo com o Braga, o meio campo era descoordenado um jogo de roleta russa, o gudejl é muito móvel e não funciona com um trinco muito móvel como ele, não há coordenação possivel. O petrovic é pouco móvel mas sabe estar sempre onde é preciso defender ou dar pancada... futebol é complicado . agora cascar no petrovic e não perceber que o meio campo foi muito mais eficaz com ele é ser utópico. há melhor que o Petrovic? CLAROOO mas por agora é o que há.

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    1. Caro Tiago Freitas,

      Não leia de forma literal tudo o que escrevo. O Petrovic presta-se mais às ironias. É mais difícil fazê-las com o Raphinha ou com o Bruno Fernandes.

      A conversa do duplo-pivô tem que se lhe diga. Ele existe se os dois jogadores forem móveis, o que implica um grande entendimento entre eles para se saber quem vai e quem fica em cada momento.

      Com o Petrovic, esse dilema deixa de existir, porque fica sempre, podendo o Gudelj jogar mais solto a oito. Jogar com um trinco mais fixo ordena melhor a equipa e o Petrovic é o mais disciplinado para esse efeito. É disciplinado mas não é grande jogador, infelizmente. Infelizmente também, o Gudelj ainda não tem pernas para chegar mais à frente.

      Isto tudo serve para dizer que estou de acordo consigo. Aliás, considero que este foi o jogo em que o meio-campo esteve melhor esta época.

      SL

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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  3. enho cá para mim que o Petro está a soltar o bicho que tem dentro de si - pena que ainda não o tenha domesticado... e acabe a acertar forte e feio onde e quando não deve.
    No lugar do Peseiro, faria assim: titular, o Petro, com o bicho ainda controlado; logo que o bicho se soltasse a toda a força e antes que houvesse azar, metia o Bataglia - como diria o Tiririca, "com a troca, pior não fica".
    Acho que ganhava a equipa, ganhava o Peseiro e até -imagine-se - ganhava os pulmões dos adeptos, que finalmente passariam a ter motivos para soltar uns valentes palavrões.

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    1. Meu caro,

      Que se solte definitivamente o bicho e que venha o Battaglia sempre que o bicho não esteja dominado. Solto e dominado é que vão ver o bicho.

      SL

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