domingo, 19 de setembro de 2010

O Professor: Último Acto: Plus Ultra, adaptado de “O Alienista”, de Machado de Assis

Um belo dia, contudo, para surpresa geral, o Professor anunciou que todos os pacientes internados na Casa do Futebol se encontravam curados e poderiam, portanto, ser libertados.

Se imaginais que o Professor ficou radiante ao ver sair o último hóspede da Casa, mostrais que com isso não conheceis o nosso homem. Plus Ultra! Era a sua divisa. Não ficou alegre, ficou preocupado, cognitivo: alguma coisa lhe dizia que a teoria nova que tinha vindo a desenvolver tinha, em si mesma, outra e novíssima teoria.

Vejamos – pensava ele: - vejamos se chego enfim à última verdade. Sim, há-de ser isso! I've gotta feeling – Woohoo!

O Professor encontrou, então, em si as características do perfeito equilíbrio mental e moral; pareceu-lhe que possuía a sagacidade, a paciência, a perseverança, a tolerância, a veracidade, o vigor moral, a lealdade, todas as qualidades, enfim, que podem formar um acabado mentecapto. Duvidou logo, é certo, e chegou mesmo a concluir que era uma ilusão; mas, sendo homem prudente, resolveu convocar um painel de amigos, integrado por Rui Santos, Pinto da Costa, Dias Ferreira, Seara e ainda pelo seu habitual séquito de 50 adjuntos, a quem interrogou com franqueza. A opinião foi afirmativa.

- Nenhum defeito?

- Nenhum – disse em coro o painel.

- Nenhum vício?

- Nada.

- Tudo perfeito?

- Tudo.

- Não, impossível – bradou o Professor – digo que não sinto em mim esta superioridade que acabo de ver definir com tanta magnificência. A simpatia é que vos faz falar. A verdade é que ainda hoje me persigo por aquelas substituições do Paulo Torres no 3-6 contra o Benfica e do Hugo Almeida no Mundial contra Espanha. Não percebo ainda hoje porque convoquei dois defesas direitos de raiz para o Mundial e, depois, coloquei a jogar como titular naquela posição um… mau central. Penalizo-me ainda hoje por não ter levado o Moutinho ao Mundial, quando o rapaz era o único totalista das minhas convocatórias até essa altura. Pergunto-me ainda hoje se, enquanto Treinador de Selecções jovens ou Adjunto de Equipas Profissionais, não terei atingido o limiar de incompetência do princípio de Peter? Aaah, sim, e há também aquela sentença em forma de questão que ainda hoje atormenta as minhas noites de insónia: “Porque perdemos? Perguntem ao Professor”. Não, meus amigos, estudo-me e nada acho que justifique os excessos da vossa bondade.

O painel insistiu; o Professor resistiu; finalmente, Seara, com ar de sacristão, explicou tudo com este conceito digno de um observador: Sabe a razão por que não vê as suas elevadas qualidades, que aliás todos admiramos? É porque tem ainda uma qualidade que realça as outras: a modéstia.

Era decisivo. O Professor, curvou a cabeça juntamente alegre e triste, e ainda mais alegre do que triste. Acto contínuo, recolheu-se à Casa do Futebol. Em vão os amigos insistiram que ficasse, que estava perfeitamente são e equilibrado; nem rogos, nem sugestões, nem lágrimas o detiveram um só instante. - A questão é científica – dizia ele; - trata-se de uma doutrina nova, cujo primeiro exemplo sou eu. Reúno em mim mesmo a teoria e a prática. Fechada a porta da Casa, o Professor entregou-se, então, até ao fim dos seus dias, ao estudo e à cura de si mesmo.

2 comentários:

  1. Sim, ao longe parece que ouço o Professor trautear “I'm a rich lonesome cowboy, I'm stucked in my home all day long”… Entretanto, o arqui-inimigo do Professor, “Bento”, The Kid, has back in town… Prevejo que isto venha a ser o princípio de uma bela amizade entre Bento e o Professor. Agora, sim, pode ser que isto venha a ter um final feliz!

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