segunda-feira, 3 de fevereiro de 2025

Rui Borges, o autêntico

Ando há semanas para escrever qualquer coisa sobre o Sporting nesta nova configuração que lhe é dada pelo Rui Borges e os jogos [entretanto] realizados. O Rui Borges é um treinador português certificado, um treinador com esta Denominação de Origem Protegida [DOP]. Como treinador português, é sobretudo alguém que desenrasca o que for preciso com o que tiver mais à mão [ou ao pé, para ser mais rigoroso]. A tática, o sistema de jogo, seja o que for que se chama à disposição dos jogadores em campo a correr para a frente e para trás, é resultado de circunstâncias, de contingências. Sem essas circunstâncias e, assim, sem necessidade de desenrascar, o Rui Borges não expressaria as suas virtudes [que são muitas], seguramente. 

É assim um género de senhor Manuel que tanto chamo para arranjar as persianas, instalar o fogão, pintar a casa ou dar um jeito na canalização [o vizinho de baixo está-se sempre a queixar e resta-me recorrer a uma sonda da NASA, daquelas que usam para explorar Marte e outros sítios como este, onde há muitos vizinhos de baixo]. Imaginem um treinador alemão, um Roger Schmidt desta vida, a lidar com o permanente rebuliço sanitário e organizativo que vem caracterizando o Sporting dos últimos dois meses. Querer contratar um lateral direito espanhol para substituir o Esgaio e descobrir que (já) o tinham comprado há ano e meio; dar com metade da equipa em lista de espera no Serviço Nacional de Saúde; querer contratar um extremo do Bahia que joga no União de Leiria e acabar a contratar um extremo do Bahia que joga no Bahia; ter um diretor desportivo do Manchester City que faz um gancho no Sporting e que contrata jogadores do Bahia estejam onde estiverem, joguem onde jogarem. 

O Rui Borges tudo aguenta, a tudo resiste, nunca se resignando, nunca se queixando. Dêem-lhe um canivete suíço e uma chave inglesa e ele monta uma equipa. Transforma trios de centrais em duos que parecem trios e às vezes até são trios; avança um central para o meio-campo e um jogador do meio-campo para o ataque; põe os laterais a jogar a extremos; percebe que o lateral direito que fala castelhano é o lateral direito espanhol que queriam contratar. Fazer implica convencer os jogadores a fazê-lo, mesmo sem o treinar. Se precisa de empatar, empata; se precisa de ganhar, ganha; se pode ganhar por poucos, não continua na fossanguice para ganhar por mais, como se não houvesse amanhã. 

O [eventual] problema dele será a normalidade, a monotonia do dia a dia de uma organização, os jogadores certos para os lugares [certos], o diretor desportivo sem estar de malas aviadas, o centro de treinos sem parecer as urgências do Santa Maria ou do Curry Cabral. O problema será essa normalidade e também o futuro do Bruno Lage [e, antes, do Vítor Bruno]. Com seis pontos de atraso, os treinadores do Benfica e do Porto têm feito o que podem para a criação de um mito [sportinguista]. Sem eles, [provavelmente] as circunstâncias fariam o seu [inexorável] caminho.  

[O objetivo era dizer umas coisas sobre os jogos realizados em janeiro, do Campeonato, da Taça da Liga ou da Liga dos Campeões. Esta figura do Rui Borges dá-me comichões na ponta dos dedos e não, não consigo parar de escrever sobre ele e as suas circunstâncias trágico-cómicas. Os jogos ficam para outro dia mais inspirado]