Um amigo meu, historiador e analista social nas horas vagas, costuma dizer que Portugal é um país em que, por mais que se diga o contrário, perante factos há sempre argumentos. Na bola isso é elevado a uma das belas-artes, não apenas pela clubite galopante que nos consome, mas sobretudo porque em cada um de nós habita um especialista, um treinador, um génio incompreendido que gosta de se ver ao espelho. Não faltando treinadores de bancada, abundam, isso sim, treinadores de café, snack-bar e até treinadores de vendind machines, espalhados por empresas, escolas, instituições públicas, hotéis e até casas de passe.
Sucede que
esses treinadores, outrora apenas génios solitários da bola à segunda-feira,
são agora igualmente especialistas em comunicação, mind games, estruturas (não
confundir com as de betão), jogos da mala, SADs e sociedades por cota, em suma,
verdadeiros analistas debitando sapiência enriquecida nos novos cascos de
carvalho da nossa humanidade: redes sociais, programas televisivos, jornais
desportivos, blogues, entre outras formas que a (suposta) sociedade da informação
nos fornece a grandes pazadas. Estes analistas juntam-se assim aos outros
analistas que se reproduzem em grande escala pelas televisões e média em geral,
vindos não se sabe bem de onde, criando a ilusão, aliás verdadeira, que
qualquer um poderá lá chegar.
O mundo, por
vezes aborrecido, do futebol dentro das quatro linhas, coisa nada rara em
Portugal, foi simplesmente abolido e substituído por um gigantesco after-match,
encadeando-se num contínuo pre-match, onde o futebol só a espaços consegue
aparecer numa rápida transição ofensiva.
No dia
seguinte ao jogo é mais fácil fazer prognósticos. O mesmo sucede no final de um campeonato. Neste último que passou o Sporting fez 86 pontos, mais do que em
qualquer das vezes que foi campeão. Jorge Jesus fez mais pontos do que quando
foi campeão pelo nosso rival (e foram três vezes). Não chegou. Contra estes
factos teremos sempre argumentos. Um deles talvez seja aquele que nos recorda a
última das definições para futebol:
negócio.