quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Momentos Únicos: Oliveira 3 – Dínamo de Zagreb 0



O Sporting na época 1982-83 resolveu suicidar-se. Depois de Malcolm Allison ter ganho tudo o que havia para ganhar na época anterior, decidiram despedi-lo. Descobriram com espanto, digo eu, que o homem, para além de se encharcar em whisky e de fumar uns charutos, organizava umas orgias, ainda para mais nos estágios. Substituíram-no, então, por um treinador cheio de virtudes: o Oliveira (virtudes que veio a confirmar amplamente mais tarde, quando treinador da selecção). Não satisfeitos, resolveram tentar uma originalidade, isto é, deram-lhe o estatuto de treinador-jogador (solução que Penafiel tinha encontrado dois anos antes, no regresso do Oliveira da experiência frustrante no Bétis de Sevilha).

Neste jogo da Taça dos Campeões Europeus, cuja primeira-mão tínhamos perdido por um a zero, o treinador Oliveira terá dito ao jogador Oliveira que era preciso resolver a eliminatória e depressa, e ele assim fez.

No primeiro golo, imaginamo-lo com facilidade a falar com os seus botões depois de receber a bola: “Vou chutar. Não, não, espera lá… está aqui um jugoslavo a implicar. Acho que lhe vou fazer aquela coisa com que o Liedson costuma irritar o Luisão. Eh pá, acho que vou rematar para o primeiro poste que se está a fazer tarde”.

No segundo, começa a correr muito devagar com a bola ainda no meio-campo do Sporting. Depois, acelera, passa a bola a um colega e parece que lhe diz: “Passa-me isso outra vez que vou ali à frente marcar um golo e venho já”.

O terceiro é mais controverso. Há quem diga que ele queria centrar para o Jordão e que escorregou. Há quem diga que ele queria fazer o que fez, do tipo: “Vou centrar para o Jordão que já merece. Olha … parece que o guarda-redes está a pedi-las. Este tipo assim, com este jeito, ainda acaba no Sporting. Prontos, desculpa. Não te queria enganar mas isto é mais forte do que eu”. Eu não sei. O que sei é que só um jogador absolutamente espectacular é que consegue escorregar de forma também tão espectacular. Escorregar assim não é para todos.

É dele a frase a famosa frase” por cada leão que cair, outro se levantará”. Neste caso não foi bem assim. Foi mais, “por cada jugoslavo que cair, outro se preparará para fazer o mesmo”.

Qualquer um destes golos, ainda por cima na Taça dos Campeões Europeus, seria para a maioria dos jogadores o golo da sua vida. O Oliveira fez os três no mesmo jogo. Foi um dos mais admiráveis jogadores portugueses. Nunca percebi se jogava no meio-campo ou no ataque. Jogava, imagino eu, onde lhe dava na real gana e fazia em cada momento o que lhe passava pela cabeça. Era o tempo em que não havia o Freitas Lobo a explicar os “princípios do jogo”, as “transições”, o “bloco” e por aí fora. Tenho saudades desse tempo. Do tempo em que um jogador ou tinha jeito para a bola ou não tinha e isso qualquer cego via.

5 comentários:

  1. Vi esse jogo!
    Julgo que o pai tinha falecido nessa noite.
    Grande jogador!
    Quanto aos seus méritos como treinador já tenho sérias dúvidas...

    Um abraço e continuação para vocês.

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  2. Convite aceite.
    Li vários posts e, embora não comentando, devo dizer que adorei este tipo de humor e prometo que vou voltar.
    É bom recordar os tempos em que não havia tantas filosofias de jogo nem comentadores que de tanto falarem empiricamente nos baralham o gosto por ver jogar futebol.

    Felicidades para o blog e vou já ali ligá-lo ao meu.

    SL

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  3. Caro António Boronha,

    Estou de acordo consigo. Tenho as mais sinceras dúvidas sobre a qualidade do Oliveira como treinador. Era um treindaor de uma certa escola portuguesa. Cheio de truques e manhas e com a mania que em certos jogos tirava uns coelhos da cartola. Foi um treinador do seu tempo.

    Agora, naquele dia foi enorme.

    Um abraço.

    Rui Monteiro

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  4. Cara Tite,

    É um gosto tê-la como leitora. Isto começou por ser uma brincadeira de férias. Vamos ver se continua.

    Só se fala, muitas vezes em tom crítico, de quem se gosta. Aliás, nós, os sportinguistas, somos os que fazemos mais graças com o nosso clube. É uma certa cultura de "fair play", penso eu.

    Um abraço.

    Rui Monteiro

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  5. Caro Rui Monteiro,

    Adorei saber que fazemos crítica devido à nossa tradicional cultura de fair play.

    Tinha essa convicção mas nunca me tinha lembrado de colocar as coisas desse modo.

    Há quem diga que sou má Sportinguista por dizer o que penso.

    Obrigada

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