segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

Coletes e apitos: mais do(s) mesmo(s)

O jogo de ontem contra o Estoril constituiu uma lição para o Rúben Amorim, outra para o Pepe Guardiola e outra ainda para nós, sportinguistas, dados a elucubrações técnico-táticas sobre o futebol. O Rúben Amorim ficou a saber que não tem mal nenhum defender com os onze atrás da linha do meio-campo, com cinco na defesa, quatro no meio campo e um no ataque [mas a defender e a correr atrás dos adversários como se não houvesse amanhã], sempre que o inimigo é superior em número e armamento. O Pepe Guardiola ficou a saber que, depois de se estar a ganhar por três a zero, fazem-se substituições aos magotes e deixa-se o jogo andar, conforme estabelecido na Convenção de Genebra. Nós, bem, nós definitivamente ficámos a saber que, no final, ganha a melhor equipa, a que tem os melhores jogadores, e pouco interessa se joga este ou aquele ou se se joga com mais ou menos autocarro, com este ou aquele sistema tático [a melhor é a mais cara e a mais cara é a melhor porque uma coisa é a outra e vice-versa, de acordo com teoria da eficiência dos mercados]. 

O campeonato continua mais do mesmo. Continuam os coletes nos jogos do Porto. Mudam-se as cores mas não se muda a moda [dos coletes]. O futebol transformou-se em “paintball” sem armas de brincar mas com bofetadas, pontapés e jogadores aos pinotes e essa é a razão para os coletes, as cores dos coletes [no azul, não confundir coletes com capacetes]. Também continuam as notícias sobre empresas de informáticas e as suas relações comerciais com clubes de futebol [é a isto que se chama digitalização ou transformação digital]. A este propósito, tem sido inestimável o jornalismo de investigação do Porto Canal, havendo quem afirme que um dia destes também irá descobrir o Apito Dourado [ou descobrir que não é possível descobri-lo porque nunca existiu], o verdadeiro Santo Graal do jornalismo desportivo.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Há coisas que não se pedem a ninguém

Não se envia uma equipa na sexta-feira para a fronteira entre a Ucrânia e a Rússia para a mandar regressar a casa passado um par de dias para jogar à apanhada com umas borboletas de Manchester. Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa: o teatro de operações e as tropas de camuflado da Organização do Tratado do Atlântico Norte não se confundem com o recreio e os meninos de bibe e chapéu de palhinha do Jardim Escola João de Deus. 

Vão-se os anéis, ficam os dedos ou, por outras palavras, vão-se os resultados e as eliminatórias, fica o pilim, o graveto, o carcanhol. Se bem percebi as notícias dos últimos dias, os clubes portugueses de futebol precisam de cada vez mais dinheiro para contratar empresas de informática. Quando se trata de cibersegurança, não se brinca, não se olha a meios. Fica a dica para as empresas de telecomunicações e de media e os laboratórios de análises clínicas.

sábado, 12 de fevereiro de 2022

Não há nada melhor que uma boa tradição

 

Vou começar pelo fim: já tinha saudades de um espetáculo como aquele a que ontem assistimos no final do jogo entre o Porto e o Sporting. Um espetáculo verdadeiramente envolvente, com a participação de vários elementos erradamente (para alguns) considerados estranhos a um jogo de futebol.  Li algures que parecia termos voltado aos saudosos anos oitenta e noventa, como se a tradição não se tivesse mantido incólume todos estes anos naquela arena. Sucede que o Sporting nos últimos tempos tinha deixado de contar na lida daquela brava raça autóctone, e por isso mesmo a tradição ter-se-á suavizado, num sentido paternalista, condescendente, adaptado à realidade.

Na arena em causa e, desde tempos imemoriais, não se distingue a direção do clube dos grupos mais ou menos desorganizados de adeptos, ou de outros elementos inerentes à tradição. Toda a gente pode participar, seja de que maneira for. Essa tradição já terá alargado as suas fronteiras a clubes como o Canelas, cujo nome nos transporta para o âmago da sua imagem de marca.

Posto isto, voltemos ao início, onde forçosamente teria de haver um jogo de futebol. O árbitro, parte integrante da tradição, terá entrado em campo com algumas limitações, principalmente em determinado local dado a evacuações, onde não lhe caberia um feijão. Não é fácil arbitrar nessas condições. O orifício constrangido torna praticamente impossível qualquer discernimento que ponha em causa o cicerone responsável pela chave capaz de voltar a reabrir o dito cujo. Não é fácil respirar com aquilo apertado, ficando a visão toldada, incapaz de qualquer acção contrária ao pré estabelecido.

Não sendo o Sporting devidamente informado destas condições respeitantes à tradição (nem os seus adeptos, que ingenuamente compareceram em grande número), o jogo inicialmente até parecia semelhante a um jogo de futebol. Até o Porto, sem o Paulinho Santos e o Jorge Costa em campo, aparentava querer jogar à bola, embora a presença de Vítor Baía nas imediações indicasse o contrário. Neste impasse, com o árbitro ainda a respirar por uma palhinha de plástico, o Sporting marcou dois golos, o segundo verdadeiramente sublime, o que me forçou a dar uma volta inteira ao sofá em plena e desvairada corrida. O jogo de futebol, na sua aparência de jogo de futebol, terá continuado, já não me lembro bem, mas terá continuado, até deixar de continuar a ser um jogo e ser apenas algo que era parte de uma tradição.

Felizmente, a tradição trouxe-nos à terra. Não há nada mais belo que uma tradição.

Por mim era já património imaterial da animalidade. Obrigado.