quinta-feira, 24 de janeiro de 2019

O Poema das Coisas Belas

“Estou a ver o jogo na SPORTTV. Parece que estou a ver o jogo do Sporting contra o CSKA transmitido por um canal russo”; foi a mensagem que recebi de um amigo mal o jogo se tinha iniciado, quando ia a meio da A1 de regresso a casa. O Sporting tinha perdido o jogo antes de se iniciar e o primeiro golo serviu para cumprir a profecia de que “seríamos goleados” do Joaquim Rita. A narrativa, como agora se diz, tinha sido preparada com antecedência e o jogo servia para a densificar com pseudo-pormenores técnico-táticos até ao corolário dos comentadores atuais: “estão a ver que não precisamos de jogadores e de bola e que nos bastamos a nós próprios!”. 

O futebol e, muito menos, o futebol português não merece o Poema das Coisas Belas, do António Gedeão, mas não me ocorre muito mais. O poema é muito melhor do que vou dizer. As coisas só são belas quando as atendemos como tal. Não são os olhos mas a cabeça que vê o que se vê e, por isso, não gostamos do que não entendemos, por preguiça ou preconceito. Por ter praticado algum desporto e por gostar de desporto, não percebo as pessoas que veem um jogo de futebol para ter razão. O jogo vê-se para ser apreciado. Nem os treinadores nem os jogadores veem o que vemos. Para nós, o Douro é uma excelente paisagem, enquanto para um agricultor são vinhas. É preciso distanciamento para ver a paisagem onde estão vinhas e tão só. 

Pelo resumo, o jogo de ontem foi uma chatice. Aparentemente, o Braga teve mais bola, mas as oportunidades de golo não se viram. O Braga tem o golo, uma oportunidade logo a seguir e um cabeceamento à barra, na segunda parte. O Sporting tem o golo e duas oportunidades do Raphinha que o antecederam. Para noventa minutos de duas das melhores equipas portuguesas é pouco, muito pouco. Salvaram-se os “penalties” e os anti-heróis, o Renan, o Ristovski e o Jéfferson. 

O que faltou em futebol sobrou em berraria. Sempre conhecemos esta competição como a Taça Lucílio Baptista. Sem VAR, assistiu-se a um dos maiores esbulhos do futebol português. Com VAR, os erros pagam-se mais caro. Ontem, o erro, o maior erro, foi o do árbitro não ter assinalado de imediato a falta sobre o Acuña. O erro seguinte em dimensão foi o do “penalty” não assinalado por agarrão ao Coates. Estes erros seguem um padrão: na primeira instância, o árbitro, por ação ou omissão, decide sempre contra o Sporting, sendo obrigado, em parte, a corrigir o erro por intervenção do VAR. Este padrão também existiu na “final four” da época passada (lembrem-se do “penalty” marcado contra o Setúbal na final e do “penalty” não marcado depois de falta do Danilo sobre o Bas Dost na meia-final). O que nos disseram ontem o treinador do Braga e o seu presidente, como no dia anterior o treinador do Benfica e o seu presidente, é que devemos voltar ao tempo do Lucílio Baptista. O que nos dizem os comentadores do costume é que fomos gamados mas ainda devemos ficar agradecidos, porque nesses tempos, quando as profecias se realizavam, é que era bom e teria sido bem pior ainda.

13 comentários:

  1. Caro Rui Monteiro, sublime escritor!Estou solenemente tramado... Sendo cego não tenho o enorme privilégio de ver o jogo e tirar o som! Ouvindo o relato na pública Antena 1, teria o guião perfeito (emcarnado), para ficar com a impressão de que o Sporting foi massacrado e muitíssimo beneficiado pela arbitragem. Contudo, isto de um gajo ter deixado de ver aos vinte e tal anos, tem as suas vantagens, lembro-me do sistema azul, também joguei futebol federado e sei como as coisas se fazem... Ou seja, estribando-me na filosofia kantiana... Sei que as imagens, mesmo as sonoras, não passam de cópias das ideias, que são as verdadeiras, as essências... O pesar dos jornalistas que acompanharam o jogo de ontem era indisfarçável. E o pior é que eles já nem o querem disfarçar. Parecia que o Sporting tinha que pedir desculpa por ir à final! Haja decoro!...

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    1. Não ouvi o relato na Antena 1 (vi o jogo no canal do Inácio), mas foi lá que ouvi a diatribe do Abel Aziado Ferreira que disparou contra tudo e contra todos. Para meu espanto, quando acabou de bramar o "jornalista" disse "muito bem!" Inacreditável.

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    2. Caro Hélder Mestre,

      Peço desculpa pelo atraso na resposta. As suas infelizes circunstâncias fazem-no compreender muito melhor o Poema das Coisas Belas, de António Gedeão, e à forma como vemos o que nos rodeia e, em especial, o futebol.

      Um abraço,

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  2. infelizmente, em Portugal um sportinguista, se não quiser ter um ataque de nervos, tem de ver noticiários e jogos na TV com o som cortado. Eu agora já não me enervo vejo jogos sem som, leio jornais desportivos sem os abrir e já consigo ouvir relatos sem som... Som só em Alvalade de 15 em 15 dias. J. Rocha. SL

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    1. Caro J. Rocha,

      É um sortudo. A distância impede-me de usufruir desse prazer de 15 em 15 dias. Como vejo o futebol no café, tenho que gramar com a estupidez do costume.

      SL

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  3. Ai o Abel...

    Aquele que nos disse a representar a verde e branca enquanto jogador acerca da contestação a Paulo Bento :

    " Os cães ladram e a caravana passa "

    Como dizem os miúdos agora :" karma is a bitch "

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    1. Caro Metralha,

      Depois de tudo o que viveu como jogador do Sporting, o Abel devia ter vergonha. É uma traição aos seus colegas da altura e das circunstâncias que viveram.

      SL

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  4. Estragaram as apostas ao Jaquim Ri-te e aos amigos... não se faz...

    Aqui aplico as ideias de outro idealista racional, Platão, na sua alegoria da caverna: querem manter o povo virado para a parede, entretido com os teatros de sombras que produzem para ele.

    Os que se soltam e viram para fora, ou já perceberam o que se passa, tornam-se personas non gratas, cabeças de gado tresmalhadas...

    Aí entram mais cartilhas, já não as que contêm o guião dos teatrinhos, agora aquelas que domam os rebeldes e os transforma de novo em cordeirinhos...

    SL

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    1. Numa realidade paralela em que as meias-finais foram invertidas, mas com iguais resultados e partidas, imagine-se o que (não) seria a comunicação dos envolvidos e dos demais canais, com o Porto a eliminar o Sporting e o Abel Braga a dar o milho aos pardais.

      Quanto ao negócio de ontem, o fim do empréstimo de Sturaro (nem falo de Borja pois não há anúncio oficial), só de lembrar que vê-lo foi tão raro, que só veio a Lisboa no Verão assinar, e saiu mais do que caro.

      E a comissão, quem a embolsou e quem a vai pagar?

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    2. Sturaro veio para o Sporting para compensar o não pagamento dos direitos de formação de CR7 ao Sporting. Não tendo havido negócio pergunto onde está o guito?

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    3. Meu caro,

      É uma chatice haver jogos. Isto devia ser decidido em conversas entre o Joaquim Rita, o Vítor Serpa e outros assim. Com bola é tudo muito menos interessante.

      SL

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  5. Por falar de coisas belas...gosto de música até mais do que futebol e sempre apreciei Gilberto Gil e John Lennon! pois hoje (não fui eu, foi aquele menino...) encontrei na frente dos meus olhos referência um novo grupo denominado "Gil et John"! E esta hein? Não foi no quadro do Braxit!

    SL

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    1. Caro Aboím Serôdio,

      Hoje fui ao centro da cidade de Braga. Estava tudo muito animado. Afinal não havia coletes amarelos. Só pessoas normais, cada uma vestida como queria a passear ao sol.

      SL

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