Vorskla Poltava não me fazia lembrar nada (até rima), até que um colega meu, homem culto, me falou da Batalha de Poltava e da sua importância no desfecho da Grande Guerra do Norte, no século XVIII, com os russos a barrarem os suecos. Íamos enfrentar gente rija, e não daquela que à primeira ameaça se mete nas caravelas e vai para o Brasil, como se viu durante o jogo. O Marcel Keizer não se intimidou e fez o que tinha a fazer com o desassombro do costume: mandou grande parte dos titulares para a bancada e fez uma mistura de titulares, suplentes e miúdos da equipa de sub-23. É o equivalente a uma invasão marítima em que se queimam os barcos à chegada. Era com aqueles que se tinha de chegar ao fim do jogo, não havendo volta atrás.
Começou o jogo e começou o massacre. Praticamente, durante toda a primeira parte, os do Vorskla Poltava mal cheiraram a bola. Quando a recuperavam, eram cercados por uma praga de gafanhotos até a perderem ou se desfazerem dela a toda a sela. O Miguel Luís isola-se e acerta nas pernas do guarda-redes. O Jovane Cabral trabalha bem a bola do lado esquerdo, entorta dois adversários, mete-a no meio para o Montero a tentar dominar com o pé direito e a deixar sair pela linha de fundo, em vez de rematar de primeira. O Bruno Fernandes descai para o lado esquerdo, mete a bola de calcanhar para o Acuña, que a centra para o Mané a dominar mal, permitindo um corte com o joelho de um adversário que a leva direitinha para a cabeça do Montero a desviar para dentro da baliza. O Montero recua para receber uma bola que vinha aos trambolhões, domina-a e passa-a para o Coates avançar com ela até desmarcar o Mané do lado direito que a passa de primeira ao Bruno Fernandes, respeitando a sua desmarcação, que também de primeira a mete no meio para o Miguel Luís a empurrar para o segundo golo. O Ristovski sofre uma falta do lado esquerdo, marca-a rapidamente com um passe para o Bruno Fernandes, tabela com o Mané, receção da bola mais à frente e passe para a entrada do Montero, que, a meias com um central, faz o terceiro golo. “Game, set and match” ainda na primeira parte.
A segunda parte foi um passeio. Os do Vorskla Poltava continuaram a jogar forte e feio até lesionarem o Montero, levando à sua substituição pelo miúdo Pedro Marques. O Sporting começou a gerir o jogo. O Marcel Keizer tirou o Ristovski e o Bruno Fernandes para meter os miúdos Thierry Correia e Bruno Paz. Os miúdos entraram com vontade de mostrar serviço, mas o resto da equipa já estava em modo deixa andar, apesar de uma ou outra exceção, como o Acuña, que mostrava vontade de brincar com os miúdos. O Thierry Correia isola-se depois de uma boa jogada do Bruno Paz, mas à frente do guarda-redes enfia uma trivela com efeito ao contrário e a bola sai ao lado. O Jovane Cabral, depois de um bom passe do Mané, acerta no guarda-redes. O árbitro faz vista grossa a um “penalty” sobre o Pedro Marques, quando se isolava pelo lado esquerdo.
Quinta vitória consecutiva e vinte golos marcados depois, o Marcel Keizer continua sob escrutínio. O Lusitano de Vildemoinhos era da terceira divisão e contra o Qarabag é que se ia ver. O Qarabag não joga nada e contra o Rio Ave é que seria o grande teste. O Rio Ave joga o jogo pelo jogo e contra o autocarro de Aves é que seria o bom e o bonito. O Aves ganhou na tática de nada valendo os quatro que enfardou. O Wendel lesionou-se e ai Jesus, Nossa Senhora que agora é que vão ser elas. Entrou o Miguel Luís e não foram. Mas o que impressionou foi ver o Petrovic a jogar à bola. Sem a emulação do William Carvalho, não precisa de inventar, jogando ao primeiro e ao segundo toques, com passes curtos, e movimentando-se sistematicamente no apoio a quem tem a bola. Fez bem as coberturas, recuperando bolas e não deixando os centrais sozinhos contra o resto do Mundo. De repente, os espectadores renderam-se, com aplausos após um corte rapidíssimo (nada que se imaginasse ainda há bem pouco tempo).
O Sporting não se preparou devidamente para lutar por qualquer título. Não tem plantel para isso. O que Marcel Keizer está a fazer é um milagre, mas é um milagre que nos está a fazer muito bem, não só a nós como ao futebol português também. O futebol é um desporto simples e não precisa de uns palavrosos para ser explicado. Como todas as atividades, o que verdadeiramente conta são as pessoas, neste caso os jogadores. Quando estão bem, quando estão confiantes, a tática aparece sem necessidade de berrarias de treinadores de risco ao meio com egos que não cabem num Antonov. Nem sempre se vai ganhar, nem sempre se vai jogar bem. É assim, é sempre assim. Não há mal que sempre dure, nem bem que se não acabe, como diz o provérbio, que corresponde estatisticamente à convergência para a média (embora o jogo do Sporting não tenha nada de aleatório). Vamos ver como é que a equipa reage quando as coisas correrem mal. Sobretudo vamos ver como os adeptos reagem quando assim acontecer. Os do costume estão preparados e a afiar a faca: “bem dizia, eu sabia!”
Não vale a pena antecipar cenários. O futebol é o momento. A vida bem vivida é no momento, no agora, sem angústia por tempos que foram ou virão. E o agora do jogo jogado por este Sporting de Keizer é bom, muito bom de presenciar e saborear.
ResponderEliminarSpoooorting
Meu caro,
EliminarTem toda a razão. O seu comentário inspirou-me para o "post" seguinte sobre o jogo contra o Nacional.
SL
Os do costume ? os do camarote?
ResponderEliminarMeu caro,
EliminarOs do costume são os do costume. São os que preferem ter razão a apreciar um belo jogo de futebol com uma vitória do Sporting.
SL
"eram cercados por uma praga de gafanhotos" desta vez trocava os gafanhotos por lagartos, não tem o mesmo impacto, mas ficava mais condizente. Pronto, era só. :)
ResponderEliminarObrigado Francis. Fica a sugestão. Era giro que uma praga de lagarto invadisse o Marquês este ano.
EliminarRui isso é que era !
EliminarHá aí um cenário giro que se esqueceu.
ResponderEliminar"Os do costume" nem precisam de esperar que percamos. O Tiago Fernandes fazer boa figura no Chaves é mais que suficiente para termos que levar novamente com a ladainha do treinador português...
PS: Não aplicável a treinadores de Vila Franca. Nao me lembro de ninguem ficar particularmente preocupado quando o RV ia ser despachado para porem lá uma troika (que incluia Luisão e Julio César!!) a mandar naquilo.
Meu caro,
EliminarAcho que não vem grande perigo do Tiago Fernandes. É um "feeling". Maior perigo virá se substituírem o Rui Vitória. Têm ganhado sem treinador. Imagine com treinador.
SL
É isso, estamos todos muito felizes mas já a pensar no Day After: cuidado que pode vir borrasca!
ResponderEliminarNão fossemos todos Sporting......
Meu caros,
EliminarIsto de ser sportinguista são muito anos a virar frangos.
SL