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As equipas entram perfiladas em campo. O Bruno Fernandes vem acompanhado dos esperados três Reis Vagos: Bruno Gaspar, Gudelj e Diaby. A cara do árbitro não me é estranha. Associo-a a um ex-membro da Juve Leo. Mas não pode ser possível, não é possível com toda a certeza. Nunca um membro das nossas claques arbitrou qualquer jogo dos nossos e não lembraria a ninguém colocar um membro de claque a arbitrar um jogo da sua equipa. Olhando com mais atenção, verifico que se trata do árbitro que dá ralhetes aos miúdos do Sporting. Um árbitro disciplinador e isento, portanto.
O Sporting não começa mal, passando os primeiros minutos a pressionar o Porto. O Mathieu esquece-se por momentos do principal ponto forte do Marega, o ressalto com a canela, e permite-lhe um passe para o Bruno Gaspar que é meio-golo, valendo-nos o Renan Ribeiro. Responde o Bruno Fernandes com um remate de fora da área para aquecer as mãos do guarda-redes. Entretanto, o Diaby entorta o Filipe, safando o Pepe quando o Luiz Phellype aparecia para empurrar a bola. O Diaby não desarma e vai à linha centrar atrasado para o Bruno Fernandes, de primeira, acertar nas orelhas da bola. Na sequência de um livre e de um ressalto para a entrada da área, o Raphinha parece fazer melhor mas a bola passa rente ao poste.
Mas a pressão do Sporting não pode durar sempre e o jogo comprido do Porto permite-lhe sair sem sobressaltos para o ataque. O jogo equilibra-se e, pouco a pouco, o campo inclina-se. O fiscal de linha passou a levar muito a sério a possibilidade de deixar de assinalar foras-de-jogo e a nossa defesa teve de recuar para evitar que os avançados do Porto começassem os ataques com um metro de avanço. O Marega, acampado na área, marca um golo e foi necessário recorrer ao VAR para verificar que, depois da barraca, tinha instalado também o “barbecue” antes de rematar. Nova investida, bola a sobrar para o Herrera que a domina com o braço e centra para o Soares cabecear para o primeiro golo. Os jogadores do Porto aproveitam para fazer uma sentida homenagem ao Casilllas, à qual se associam o árbitro, o VAR e os comentadores da RTP. Foi um momento bonito, embora se recomende que uma homenagem justa como esta possa ser efetuada no Estádio do Dragão num jogo particular. A equipa do Sporting pode participar na mesma, mas quem se desloca ao estádio ou assiste pela televisão sabe que o jogo não passa de um pretexto.
O Sporting responde de imediato iniciando-se a jogada pelo improvável Gudelj, que se desloca lateralmente com a bola a passo de caracol até ficar encurralado junto à linha e sofrer uma entrada a pé juntos do Militão. A bola sobra para o Acuña que avança, levanta a cabeça e a coloca à entrada da área onde se encontra o Bruno Fernandes para a receber e rematar, fazendo o golo do empate. Quando esperávamos o correspondente amarelo ao Militão, acabámos, afinal, por ficar à espera que o árbitro consultasse o VAR durante longos minutos como se o golo do Sporting e do Porto se equivalessem e, na dúvida, tivesse apitado coerentemente. O tempo de espera foi tão longo que os comentadores da RTP foram preparando o melhor ou o pior, conforme as perspetivas, embrulhando um fora-de-jogo posicional do Raphinha na difícil deliberação e decisão do árbitro. Fomos para o intervalo a empatar em golos, mas a perder por dois amarelos a zero. O árbitro ralhou aos jogadores do Porto e mostrou amarelos aos nossos, o que se agradece, porque não há nada de mais constrangedor e humilhante do que umas reprimendas em público e com a família e os amigos a escutá-las.
Com o decorrer do jogo, o campo transformou-se numa pastagem. Os do Porto, com mais cabedal e força nas canetas, adaptaram-se melhor. O “pack” avançado progredia em “rucks” sucessivos que muito dificilmente o Mathieu e o Coates conseguiam parar. Com introdução da bola de um lado ou do outro, as “touches” e as “melés” eram dominadas por eles. O árbitro também adotou as regras do “rugby”, tendo acabado os noventa minutos sem um único amarelo para a equipa adversária. A nossa sorte foi os do Porto levarem tão a sério esta modalidade que nem por um momento admitiram a possibilidade de ganhar o jogo enfiando a bola na baliza. O Marcel Keizer ainda tentou mudar o jogo. Para permitir que o Acuña esticasse o jogo na esquerda, ensaiou a defesa a três, com a entrada do Ilori e a saída do Bruno Gaspar. Esta tática permite que o Gudelj jogue mais à frente e, com ele, o meio campo no seu conjunto também se adiante. No entanto, sem o Borja e, sobretudo, o Ristovski a equipa não se reequilibra tão bem quando perde a bola, não permitindo que o Raphinha e o Acuña se adiantem tanto. Continuando o meio campo sem dar conta do recado, meteu o Bas Dost e tirou o Diaby para procurar jogar mais comprido e dispor de outro matulão para defender as bolas paradas do Porto. Sobrevivemos na segunda parte, apesar dos comentadores da RTP nos irem fazendo o funeral, sentindo que estava num “pub” em Glasgow a ver jogar o Celtic contra o Porto.
Na transição para o prolongamento, pedi mais uma cerveja e percebi que lhes tinha perdido a conta. O jogo reinicia-se e os do Sporting ganham nova alma. O Acuña avança e, ao ver o trapalhão do Felipe à entrada da área, faz-lhe tabelar a bola na coxa para a desviar de forma a permitir a entrada silenciosa do Bas Dost ao segundo poste que a mete na baliza. Infelizmente, o Sérgio Conceição percebe que talvez não seja má ideia deixar o Brahimi organizar o jogo. O cerco aperta-se. O coração é quem mais ordena e o coração do Mathieu e do Coates parecem do tamanho do mundo. O Wendell soçobra como antes tinha soçobrado o Gudelj. Entra o Jéfferson para jogar a médio à frente do Doumbia. Ninguém consegue estar sentado no Café Beirão. Venho uma e outra vez cá fora respirar e fumar mais um cigarro. Veterano destas andanças, sei que estes jogos nunca acabam com normalidade. Desejava e não desejava o golo do Porto. Não o desejava por razões óbvias. Desejava-o para acabar com aquele sofrimento, porque sabia o que acabaria por acontecer, com a frustração de termos estado a um pelinho da vitória.
Os “penalties” iniciam-se connosco na mó de baixo, emocionalmente e no resultado, quando o Bas Dost falha o primeiro. Estamos prestes a ser engolidos pelo fundo do poço onde nos metemos, mas o Bruno Fernandes, de raiva, mantém-nos suspensos. O Pepe tenta repetir o mesmo remate por alto do Danilo e acerta na barra. O Mathieu marca com a frieza habitual e reinicia-se o “turnover” emocional. Não há sportinguista que não acredite que o Renan Ribeiro não defenda pelo menos uma. Mas os do Porto encontram-se mais bem preparados do que na final da Taça da Liga. Quando o Coates avança para a marcação do último “penalty”, esboça-se um sorriso irónico de resignação na cara dos sportinguistas que se veem na transmissão televisiva. Mas o Coates não repete a bojarda do costume e coloca com precisão e técnica a bola no lado esquerdo do guarda-redes, que entretanto se lança para o lado contrário. Passa-se definitivamente ao mata-mata. O jogador do Porto avança rapidamente e ao aproximar-se da bola tenta desacelerar para olhar uma última vez para o Renan Ribeiro que mantém a sua dança e só a desfaz quando o remate sai para o seu lado mais forte (finalmente!), estirando-se para defender com a ponta dos dedos. Acreditei no Luiz Phellype como se nunca tivesse feito outra coisa na vida que não fosse vê-lo a marcar “penalties” e ele comportou-se como um veterano dos grandes momentos.
Retenho imagens parcelares e confusas do que se passou a seguir. Não sei se foi das cervejas ou da alegria. A empregada desatou a dançar com uma criança. Um velhote, com ar muito doente, levanta-se de um salto. Abraço o meu colega do lado e com ele e os restantes sportinguistas do Café Beirão cantamos “O mundo sabe que”. Ouvem-se foguetes e carros a apitar. Recebo e mando mensagens. A minha irmã diz-me que o meu sobrinho viu pela primeira vez o Sporting ganhar (espero que tenha vestido a camisola que lhe ofereci). Há uma e uma só razão para haver este ou aquele jogador, este ou aquele treinador, este ou aquele presidente: nós, os da Lousã, os do Jamor, os de qualquer canto do país ou do mundo. Nós somos o Sporting! Isto ou, como diria o Miguel Esteves Cardoso, “O Amor é Fodido”.
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ResponderEliminarCaro Aboím Serôdio,
EliminarTem toda a razão. A minha filha, que vive fora do país, estava na dúvida se via o jogo mas depois de uma ameaça de insolvência, lá tece de ser. Está corrigido e bem corrigido.
Um abraço e obrigado
É mesmo "O amor é fodido"!...principalmente o amor pelo Sporting!! Parabéns!
ResponderEliminarSou praticante de caminhadas gosto muito da serra da Lousã ,que visito com frequência. Café Beirão não vou esquecer SL
Caro Zé Baleiras,
EliminarObrigado. Não se percebe este sofrimento de quem tem idade para ter juízo. O Café Beirão fica na minha memória para sempre. O futebol proporciona-nos momentos inesquecíveis.
SL
Por outro lado é esse raio dessa inesquecibilidade (inventei uma...) que nos lixa ... é que só a cerveja e caracóis raramente trazem dissabores. E um tremocito ou outro, vá.
EliminarNa cerveja não há batota.
Caro Rui Monteiro,
ResponderEliminarNão tem por que agradecer! Se a sua filha for sportinguista também e se estiver a ver o Golo RTP deverá estar tão enojada quanto eu! A melhor e única maneira de me justificar é convidá-lo a assistir a esse programa de propaganda que, suponho, é acessível no vosso cantinho- que já foi meu- via RTP Play a partir de amanhã! Depois duma final de Taça só se fala do Benfica! Arre que é demais.
Um abraço do tamanho do Mundo (como diz o Paulo Sérgio)
SL
Continuo a escrever do smartphone e, por essa ou por outra razão qualquer, esqueci-me de referir um lance importante do tal jogo. Revi hoje umas 4 vezes o "ombro" do Herrera. Sei que o homem se submeteu a uma cirurgia plástica mas não creio que a medicina tenha chegado a tamanho avanço! Se o super-dragão não foi rever é porque tinha visto bem logo à primeira.
EliminarMais algumas SL
Caro Aboím Serôdio,
EliminarO que irrita mais ainda são os comentários da RTP. A forma definitiva como disseram que não foi com o braço quando a imagem não permitia tirar qualquer conclusão. Não seria melhor, pelo menos, estarem calados? A malta agradece.
SL
Excelente crónica mais uma. O jogo foi mesmo isto. Emoção a rodos mas vimos uma equipa guerreira com um unico resultado no Horizonte: ganhar.
ResponderEliminarComo se costuma dizer, virou-se uma pagina, o Sporting dos 5 violinos, do Morais do Cantinho, de Yazalde e tantos outros esta de volta, a casa começa a ficar organizada, teremos todas as possibilidades de ganhar a próxima Liga. A PAZ na família Sportinguista esta de volta.
SL
joão Balaia
Caro João,
EliminarAs boas finais são assim: emocionantes e no fim ganha-se. Foi mais a capacidade de sofrimento e a lucidez de um ou outro jogador, como o Mathieu, que nos levou a esta vitória. O Sérgio Conceição também ajudou.
Não estou tão esperançoso na vitória no próximo ano. Há condições para melhorar, do ponto de vista organizativo e da estabilidade dirigente e do treinador. Agora, a equipa do Sporting tem de melhorar muito. Isso e ter um campeonato em que as regras sejam iguais para todos.
SL
Excelente texto. Fez-me reviver tudo aquilo. Parabéns!!!
ResponderEliminarF.
Obrigado. Escrever este texto também foi uma forma de reviver esses momentos. O futebol proporciona-nos momentos incríveis no locais e contextos mais improváveis.
EliminarSL
Uma excelente crónica Rui Monteiro. Felizmente, existem "café Beirão" nos mais inóspitos recantos deste nosso Portugal. Por isso, também, é tão grande o nosso Sporting. Da rtp, não espero nada de bom, e pago, infelizmente.
ResponderEliminarJ. Oliveira. SL
Caro J. Oliveira,
EliminarA nossa força é essa: estamos em todo o lado nos cantos mais improváveis. Quando os árbitros não respeitam a equipa do Sporting não respeitam os mais e menos velhos ou novos que estavam no Café Beirão. Esses merecem respeito, o respeito que faltou à RTP também.
SL
Grande posta caro Rui. Abc
ResponderEliminarMeu caro.
EliminarObrigado!
grande abraço
Foi um Grande Final. Viva o Sporting!
ResponderEliminarMeu caro,
EliminarDiria mais: Grande Final! Somos grandes. Não porque ganhámos. Não porque somos melhores. Mas porque somos muitos e estamos em todo o lado.
SL