segunda-feira, 9 de novembro de 2020

Make Sporting Great Again

Guimarães constitui um “swing state”. Nada está decidido à partida, tanto se ganha como se perde e perder ou ganhar decide campeonatos. Quando se perde, perde-se o campeonato. Quando se ganha, não é certo que se ganhe o campeonato. Mas sem se ganhar, não se ganha o campeonato, como demonstram os últimos ganhados pelo Sporting. Para se ganhar um “swing state” não se pode facilitar à Hillary Clinton. É ir para cima deles desde o início, interessando pouco se são hispânicos, afroamericanos ou "white anglo-saxon protestants" (WASP). 

Era para ir e fomos. Ainda estavam os de Guimarães a ajeitar as meias e os calções, quando o Sporar se deixa antecipar pelo guarda-redes e o João Mário enfia uma bojarda à barra. Logo a seguir, o Sporar fica isolado do lado direito do ataque e volta a fazer-nos lembrar o Krpan, embora, talvez, com um pouco menos de velocidade. Bola recuperada pelo Pedro Gonçalves, tabela com o Sporar, corrida desenfreada até à área, passe para o Nuno Santos, que fica à procura do pé que tinha mais à mão até o descobrir e enfiar um remate rasteiro com o pé esquerdo, fazendo o primeiro golo. 

A ganhar por um a zero, o Sporting acalma e o Guimarães passa a trocar a bola de trás para a frente, de frente para trás e vice-versa [não é indiferente a ordem, mas não sei bem como explicar: começa-se atrás e só se pode passar para a frente e só chegada a bola à frente é que se pode passá-la para trás; também se pode passar para o lado, mas acho que dá para perceber a ideia, a dinâmica da coisa]. Aparece o Quaresma e foi enternecedor o seu duelo com o Neto. Dois homens entradotes, mostrando boa disposição e fazendo-nos lembrar que o envelhecimento ativo e saudável deve ser prioridade das políticas públicas. Ainda esperei vê-los a jogar uma bela partida de dominó, mas não foi possível, porque, entretanto, o Neto ia fazendo de Otamendi, não fosse o Adán estar atento [passada a pandemia, lembrar de voltar a levar o Neto ao lar]. 

Os de Guimarães começaram a ficar empolgados, liderados pelo Quaresma montado num alazão branco, gritando: “Bora, bora que já estão cagados!”. Ou porque não estavam ou porque estavam e precisavam de ir mais descansados para o intervalo fazer o que tinha de ser feito, os do Sporting encheram-se de brios. O João Mário ganha a bola à entrada da área, enfia uma cueca num adversário e vai pelo campo fora até desmarcar o Sporar, no lado direito, que volta para trás, passa para o Pedro Porro, tabela entre os dois, passe atrasado e balázio do Pedro Gonçalves para o dois a zero. Este rapaz talvez ainda não seja um Darwin, mas não deixa de corresponder a uma boa evolução da espécie. 

Os de Guimarães entram na segunda parte com a faca na liga. O André André não leva o segundo amarelo por agarrar o Pedro Gonçalves, ficando evidente que se está em presença de dinastia protegida pelo “establishment”, um género de mistura de “Clynton's family” e de Wall Street. Não levou e fez-nos perder tempo com o VAR e as suas habituais mariquices do fora-de-jogo. O Adán molha o dedo para ver de onde vem o vento, calcula o movimento na vertical, uniformemente (des)acelerado em função do pontapé e da gravidade, e na horizontal, uniforme na ausência de atrito, e coloca a bola no Pedro Gonçalves que a domina e faz o três a zero. O rapaz talvez seja mesmo a evolução final da espécie, sendo necessário uns milénios ainda para o Darwin descer da árvore e se transformar num primata assim. O resto, bem, o resto interessa pouco. O Rúben Amorim fez as substituições que se impunham e o Matheus Nunes parte o resto da loiça que estava por partir e os do Guimarães passam a ter medo de sair do seu meio campo, tal o receio de o verem à desfilada. 

A “flash interview” começa bem com o Neto, parecia um senador do Minnesota ou assim. Piora com o nosso treinador principal Ferro. Ainda não lhe deram outra cassete e ele continua a debitar a anterior. Quando se ganha por um, faz sentido dizer que se deviam ter marcado mais uns tantos e que se criaram oportunidades para tal. Quando se ganha por quatro e se diz o mesmo, é falta de respeito pelo adversário. Na conferência de imprensa, o Rúben Amorim comporta-se como um verdadeiro Joe Biden. O Sporting é candidato ao título? Cada jogo são três pontos e é preciso contar até ao fim. O Sporting é a equipa que pratica o melhor futebol? Cada jogo são três pontos e é preciso contar até ao fim. O Sporting é beneficiado por não jogar as competições europeias? Cada jogo são três pontos e é preciso contar até ao fim. Quem não suporta este discurso é um ressabiado benfiquista, que, a propósito da pandemia, só nos quer deixar festejar no Marquês pela manhã com uma meia de leite e umas tostas no bucho. 

16 comentários:

  1. Muito, muito muito bom! Já não me ria assim há uns tempos! Espero que saibamos, acertadamente, separar as alegrias que o futebol nos dá, nos dias de hoje, das tristezas com que a direcção de agora nos tem vindo a brindar. Esperemos que a primeira pancada não venha já, desapercebidamente, na próxima abertura do mercado futebolístico em Janeiro! Esperemos!
    José Manuel David

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    1. Caro José Manuel David,

      Obrigado, estamos cá para isso.

      Desta Direcção não se espera muito (se não estragar está bem). Dos jogadores e treinador tudo. Vai haver tristezas mas estas alegrias já não os tiram.

      SL

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  2. Caro Rui,

    Percebi quase tudo até porque vi o jogo na GOL TV (em Inglês de luso) e foi mesmo assim!
    Já percebi menos a parte do ressabiado benfiquista mas se me enganei não me corrija! Foi esse o que não quer a Ana Gomes como candidata à presidência?
    Bucho quererá dizer estômago?
    Abraço grande ("again", como o Sporting)

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    1. Caro Aboím Serôdio,

      É esse exactamente. Falo dele na qualidade de benfiquistas e ex-membro da Comissão de Honra do LFV. Bucho quer dizer estômago, é isso mesmo.

      Abraço

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  3. Absolutamente brilhante de imaginação e descrição.
    Andam de facto por ai uma linguagens estranhas que o comum dos mortais não entende. Por exemplo, alguém dizia ontem que "os números mostram que não somos uma equipa má a defender”. E no mesmo dia da declaração foram 9 golos em 3 jogos... o homem tinha razão. Nao é "má" ...

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    1. Caro Sol Carvalho,

      A narrativa anda aí. Não há bem mérito nem trabalho. Hoje ganhámos por uma coisa, amanhã por outra. Quando nos fizerem a folha, fica demonstrado que eles, os da narrativa, sempre tinham razão.

      SL

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  4. Se eu fosse presidente da nossa agremiação, o Sr.Rui Monteiro, seria o meu director de comunicação
    Desculpe o abuso
    SL

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    1. Obrigado meu caro.

      Escrever estas coisas dá-me alguma prazer, prazer que não teria se fizesse disto profissão. Não, não estou a pensar mudar de profissão, pelo menos por enquanto.

      Está desculpado e mais do que desculpado.

      SL

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  5. Diretor de comunicação não direi, mas devia, e merecia, ter lugar cativo como colunista no jornal do Sporting :)
    Brilhante! Sporting sempre.

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    1. Obrigado.

      Escrever umas coisas no nosso jornal enche a qualquer um de orgulho. Aliás, a Presidência não fazia mal nenhum de convidasse muitos dos que escrevem em blogues sobre o Sporting. Há cabeça convidava o Pedro Azevedo do Castigo Máximo.

      SL

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  6. À minha maneira vi-me 'obrigado' a deixar o meu 'extasiamento' lá pelo meu canto. Obrigado Rui.
    Grande abraço e SL

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    1. Obrigado Álamo.

      Honram-me sempre muito as suas distinções. Cá vamos nós ao fim destes anos todos a manter vivo o sportinguista. Somos dos últimos dos moicanos.

      Abraço

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  7. Muito bem! Make Sporting great again, é o que todos nós ambicionamos... SL

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  8. Espero que o Rubem Amorim recomende a leitura destas crónicas aos jogadores.São autênticas fontes de motivação.
    Saudações leoninas

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    1. Caro S. Almeida,

      Nunca tinha pensado nas minhas crónicas nesses termos. às tantas resulta. Convém lembrar que, como adeptos, também temos as nossas embirrações de estimação. A minha é o Neto, mas estou disponível para o Neto e o Rúben Amorim me convencerem do contrário.

      SL

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