segunda-feira, 11 de novembro de 2019

Quem (não) faz um filho fá-lo por gosto

Comecei a perceber este jogo ainda antes de se iniciar. O nosso treinador tanto afirma que ainda não teve tempo para treinar como pretende ao mesmo tempo justificar as suas mudanças táticas de jogo para jogo pelo facto de treinar diferentes sistemas, encontrando-se a equipa em condições de optar por qualquer um como forma de surpreender o adversário. Nunca levei muito a sério aquela coisa do nível IV, mas desconfio que talvez não fosse má ideia ele fazer um curso desses nem que fosse por correspondência. 

Não fiquei, assim, surpreendido quando vi a equipa entrar com o Neto, o Coates, o Ilori, o Rosier, o Borja, o Eduardo e o Ricardo Fernandes. O Silas preparou a equipa para jogar como se se tratasse do Belenenses e o adversário o Sporting e não o próprio Belenenses. O original, por muito mau que possa ser, é sempre melhor do que a cópia. Enredámo-nos num emaranhado de sete ou oito jogadores para conseguir fazer sair a bola do nosso meio-campo. Invariavelmente, acabávamos a perdê-la ou com o Renan Ribeiro a enfiar-lhe uma biqueirada para a frente onde os dois ou três que sobravam enfrentavam opositores superiores em número e em armamento, como se estivessem em Candaar, no Afeganistão. O Bolasie e o Vietto não revelaram medo, revelariam aqui e ali alguma melancolia por não poderem conviver com os seus colegas e amigos, ensarilhando-se também com eles e com a bola, como fazem os soldados para ocuparem os poucos tempos livres entre as emboscadas. 

Os jogadores do Belenenses ficaram surpreendidos, pois pensavam que vinham jogar contra o Sporting, não estando preparados para jogar contra si próprios. Estavam preparados para montar o seu autocarro e não para enfrentar o autocarro adversário. Esta contradição não os deixou nada confortáveis. Procuraram queimar tempo passando a bola entre si, permitindo ao treinador no final dizer que tinham assumido o jogo, seja isso o que for, desde que não envolva a baliza do adversário. Os adeptos não gostaram da transmutação, do transgénero operado pelo Silas e começaram a assobiar. Depois, bem, depois uns começaram a cantar uma coisa qualquer e outros a assobiar. No estádio percebe-se bem. Na televisão não se percebe grande coisa. Só mais tarde é que percebi que enquanto uns vaiavam o Varandas os outros vaiavam os que vaiavam os Varandas. No próximo jogo, a transmissão deve ser legendada para melhor podermos acompanhar estar peripécias. 

A meio da primeira parte o Silas tirou o Neto para meter o Camacho e ao intervalo trocou o Ricardo Fernandes pelo Doumbia. Os sinais de retoma do final da primeira parte confirmaram-se no início da segunda. Mas a retoma só ficou completa quando saiu o Eduardo e entrou o Luiz Phellype. O que faltava em febra sobrava em coirato e entremeada mas era a carne que havia e foi toda para o assador. O Doumbia ficou com o meio-campo defensivo e o Bruno Fernandes e o Vietto passaram a ter mais bola. No primeiro golo, destaca-se a forma precisa como o Luiz Phellype fez embater a bola nas canelas de um adversário, fazendo-a ressaltar para o sítio exato onde apareceu o Vietto a rematar depois de um mortal à retaguarda. No segundo, a desmarcação milimétrica do Bolasie proporcionada pelo passe do Doumbia e a saída à Renan Ribeiro do guarda-redes adversário, colocando a bola à disposição do Vietto. 

Pior do que errar é insistir no erro. O Silas aprende depressa, o problema parece ser o de só aprender durante os jogos. Ao intervalo deve ter transmitido aos seus jogadores que ou as coisas mudavam ou estava disposto a fazer um filho a cada um deles. Os jogadores não acreditaram naturalmente, mas ficaram na dúvida se não estava disposto a tentar. Não foi por acaso que, por via das dúvidas, resolveram festejar os golos junto à bandeirola de canto, longe do banco.

4 comentários:

  1. A primeira parte do Sporting, ontem, é indescritível. Isto é, só tendo visto é que se tem noção da pobreza futebolística a que o Sporting chegou. Também é verdade, que na segunda parte o Sporting melhorou substancialmente e mereceu vencer o jogo. Mas fica-se sem perceber estas experiências do Silas e também a insistência em dar titularidade a alguns jogadores que já demonstraram não ter qualidade. Aceita-se a aposta (para já falhada) em Ricardo Fernandes mas já não se percebe a insistência no seu colega de meio campo que, sempre que joga, põe em perigo a própria baliza, com os seus passes disparatados ou perdas de bola sucessivas para os adversários. Battaglia não está disponível e assim, apenas Doumbia, malgrado as suas limitações, pode fazer o lugar de médio defensivo. O jogador ex-Belenenses é para ir para a equipa B, ah, não temos, então despachem-no já em Janeiro antes que faça (mais) estragos. Ah e já agora, juntem mais um ou dois cepos que por lá andam e façam um pacote promocional de paga um e lve dois ou mesmo três. É que tácticas à parte, sem bons, ou razoáveis, jogadores não há sistema que funcione.

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    1. Meu caro,

      A simples ideia de que aquele trio dá para jogar com três centrais não lembra ao careca, embora o nosso treinador o seja (talvez por isso!). O Coates não tem quaisquer condições para jogar no meio, na saída da bola. O Keizer tentou esta solução algum sucesso com o Mathieu no meio. Quem joga naquela posição tem de ter condições para sair com a bola a jogar ou variar com velocidade o flanco de jogo. Assim fica o triste trio a passar a bola entre si, tendo que recuar mais um ou dois para ver se se consegue sair dali com a bola. Os laterais ficam inseguros e também não sobem o que devem.

      Depois, bem, depois há jogadores que não se compreendem. O Eduardo é um deles ou o Ilori. Como é que o contratámos e ao mesmo tempo vendemos o Domingos Duarte. E há sempre o caso clínico do Borja, então naquele sistema em que é preciso dispor de laterais mais atacantes, é de fugir.

      SL

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  2. Mais um belo texto, Rui.

    Continue.

    Um abraço

    Pedro Azevedo

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